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Salvador inicia ações nos quilombos urbanos

Governo federal e prefeitura prometem R$ 480 mil para Engenho Velho da Federação

Cleidiana Ramos

O bairro do Engenho Velho da Federação, que possui aproximadamente 80 mil habitantes, passa a ser reconhecido como comunidade de resistência negra na cidade. Este é o conceito dos chamados quilombos urbanos. No local, serão investidos recursos de pouco mais de R$ 480 mil por meio de uma parceria entre governo federal e Prefeitura Municipal de Salvador.

A aplicação acontecerá em duas ações: requalificação urbana, como iluminação e melhorias de acesso, nas quais será aplicada a maior parte das verbas, e R$ 62 mil para a regularização fundiária, ou seja, legalização de propriedade, dos 19 terreiros de candomblé existentes na localidade.

O anúncio e a assinatura dos convênios foram realizados, ontem, durante o seminário “Quilombos urbanos, políticas públicas de inclusão social em territórios negros das cidades brasileiras”, organizado pela Secretaria Municipal da Reparação (Semur).

A expectativa agora é pela liberação de R$ 180 mil já assegurados por uma emenda do deputado federal Zezéu Ribeiro (PT-BA) e que serão destinados à regularização fundiária de terreiros de candomblé em outras áreas de Salvador.

FLEXIBILIZAÇÃO – O conceito de quilombos urbanos vem da interpretação do Decreto nº 4.887, de 20 de novembro de 2003, assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. No documento, há o entendimento de que a resistência cultural concentrada em um determinado espaço, mesmo que a sua população tenha tido mobilidade ao longo do tempo, é uma característica quilombola.

“Nós entendemos como quilombos também as áreas que têm as características próprias de reagrupamento, mas que mantêm sua identidade negra do ponto de vista cultural”, definiu o doutor em história e presidente da Fundação Palmares, Ubiratan Castro.

O Engenho Velho da Federação foi escolhido como ponto de partida por reunir um número considerável de terreiros de candomblé e também representar um dos espaços da cidade onde a concentração da população negra é significativa.

Participantes visitam comunidade hoje

A ministra Matilde Ribeiro, titular da Secretaria Especial para as Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), que veio a Salvador por causa do evento, falou sobre a importância de se fortalecer as relações entre o poder público e a sociedade civil.

“O papel de organismos como a Seppir é exatamente levar o governo a desenvolver as políticas públicas a partir da percepção de que as desigualdades no Brasil também envolvem a questão racial”, destacou.

Os terreiros de candomblé são definidos como marcas dessas organizações, pois mantêm laços familiares, mas também os de solidariedade com a comunidade do entorno, daí por que a sua inclusão nesse tipo de projeto.

O secretário da Reparação, Gilmar Santiago, destacou que, além do Engenho Velho, locais como Boca do Rio, Calabar, Curuzu, Mata Escura, dentre outros, guardam histórias de resistência da população negra e, portanto, podem ser definidas como quilombos urbanos.

“São locais onde a população negra é maioria e que se caracterizam pela presença ineficiente do poder público, e é isso que estamos tentando corrigir”, resumiu o secretário.

Hoje, a partir das 16 horas, os participantes do seminário vão fazer uma visita ao Engenho Velho da Federação. Na oportunidade, será feita uma homenagem a Maria Valentina dos Anjos Costa, Doné Runhó, termo equivalente ao cargo de alta sacerdotisa, do Zogodô Bogum Malê Rondó, nome sagrado do Terreiro do Bogum, um dos mais tradicionais da cidade.

Mãe Runhó dá nome a uma praça na localidade, onde foi implantada uma escultura em sua memória, única homenagem pública a uma sacerdotisa da religião de matriz africana na cidade. “Uma das ações do projeto é a reforma dessa praça”, informou a secretária municipal de Habitação, Ângela Gordilho.

De acordo com a secretária da Habitação, as obras relacionadas aos convênios estarão começando em três meses, com término previsto para mais seis meses.

“Esse projeto tem uma particularidade, que é a construção conjunta de um projeto envolvendo vários órgãos”, completou.

Saiba mais

Quilombo urbano é um conceito que reconhece também a história de resistência cultural e de afirmação da identidade afro-brasileira em grandes centros urbanos.

Historicamente, os quilombos funcionaram como áreas onde a liberdade era uma conquista possível para os africanos escravizados e seus descendentes, num desafio ao poder político vigente. Sua herança até 2003 era então entendida como exclusiva dos espaços rurais.

O Decreto-lei nº 4.887, de 20 de novembro de 2003, assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, flexibilizou as regras para reconhecimento dos quilombos. Até então, era necessário um laudo antropológico que demandava tempo e custos para uma comunidade carente.

Desse ponto de vista, áreas como Boca do Rio, Calabar, Curuzu, Engenho Velho da Federação, dentre outras, podem ser consideradas quilombos urbanos.

O reconhecimento das áreas chamadas de remanescentes de quilombo é direito garantido pela Constituição de 1988.

O mais famoso dos quilombos é o de Palmares, comandado por Zumbi. As primeiras notícias sobre ele são de 1595. Em 1694, travou-se a última batalha que o desestabilizou.

< O Observatório Quilombola publica todas as informações que recebe, sem descartar ou privilegiar nenhuma fonte, e as reproduz na íntegra, não se responsabilizando pelo seu conteúdo.>

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