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UM TERRITÓRIO: Alto da Serra

A comunidade negra de Alto da Serra vive no Distrito de Lídice, município de Rio Claro, na região sul fluminense. Ocupa área localizada na Serra de Lídice, entre Rio Claro e Angra dos Reis, conhecida como Alto da Serra do Mar. As duas famílias que compõem a comunidade – os Leite e os Antero – chegaram à região na década de 1950, para exploração de carvão, utilizado nas ferrovias e siderúrgicas que se instalaram em municípios próximos.

Os moradores mais antigos contam que suas famílias trabalhavam fabricando carvão em municípios vizinhos, deslocando-se continuamente em busca de melhores condições de trabalho e pagamento. Segundo Benedito Leite, conhecido como Seu Dito, “era assim, quando a gente tava trabalhando num lugar, quando via que o outro lugar tava pagando mais, a gente mudava, num tinha um lugar, paradeiro certo não”. As condições de moradia retratavam a precariedade que caracterizava a vida na exploração de carvão na época . Segundo Seu Dito, sua família morava em casas de palha, oferecidas pelo “empresário” que os estivesse contratando no momento. Os “empresários” de carvão eram aqueles que, proprietários da terra ou não, agenciavam o trabalho dos carvoeiros e vendiam sua produção para as grandes fábricas. Os carvoeiros vendiam o que produziam ao “empresário”, que lhes oferecia casa e uma conta em armazém próprio, o que, segundo Seu Dito, resultava geralmente em dívidas.

Em 1953, a família Antero chegou ao Sertão do Sinfrônio, região vizinha à área hoje ocupada, e em 1959 chegou a família Leite. Segundo relatos dos membros mais antigos, a região do Sinfrônio, hoje praticamente desabitada, era bastante concorrida à época da exploração do carvão. Um registro fotográfico da época sugere que a ocupação de carvoeiros no Sinfrônio era predominantemente negra.

Hoje, a população de Alto da Serra vive quase que exclusivamente da produção agrícola. Entretanto, algumas mulheres produzem doces, queijos pães e biscoitos caseiros que são vendidos no comércio local de Lídice e em Angra dos Reis, juntamente com a produção agrícola da comunidade.

As terras ocupadas pela comunidade são compostas por várias áreas das quais Seu Dito “tomava conta”. A obrigação de “tomar conta” atribuída a Seu Dito por proprietários ausentes, que com o tempo desapareceram, definiu o direito territorial da comunidade de descendentes deste patriarca às terras que hoje ocupam. Foi com base nesse direito que Seu Dito distribuiu posses aos seus filhos e parentes próximos que foram ocupando o território familiar. Os visitantes e os moradores do entorno das terras da comunidade pedem permissão a Seu Dito para utilizar as cachoeiras que existem na área quilombola. E todos se referem àquelas terras e seus moradores como “o pessoal de Dito Leite”.

A luta pela regularização territorial se iniciou em 2002, quando a comunidade procurou o Grupo de Trabalho Jurídico (GTJ) organizado por KOINONIA. Ao analisar o processo de reintegração de posse movido por um comprador de partes das terras em um leilão do Banco do Brasil, o GTJ apontou uma série de vícios e irregularidades no processo e nas decisões do juiz. Esse processo passou então a ser acompanhado pela Defensoria Pública.

Paralelo a essa ação jurídica, a comunidade iniciou um processo de capacitação em direitos e legislação quilombola através da equipe do Programa Egbé Territórios Negros de KOINONIA, que culminou com a auto-identificação do grupo como quilombola.

Atualmente a comunidade está em fase de elaboração do relatório antropológico que compõe o Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID), produzido pelo Incra.

A comunidade acredita que em breve seus problemas com grileiros estarão resolvidos e que o futuro de seus descendentes estará garantido. E continua buscando “novos conhecimentos” que, segundo Isaias Bernardo Leite, presidente da Associação Nós da Roça e filho de Seu Dito, possam ajudá-los a buscar novas formas de sustentabilidade e de acesso aos seus direitos.

Ana Gualberto Graduanda em História – UERJ

FONTE: Boletim Territórios Negros, v. 6, n. 27, jan./fev. 2007

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