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Remanescentes quilombolas na Bahia temem novo presidente

Os moradores da comunidade remanescente do Quilombo Rio dos Macacos, em Simões Filho (Grande Salvador), estão apreensivos com as recentes alterações ministeriais feitas em Brasília (DF), pelo governo interino, que envolvem as políticas de demarcação de territórios quilombolas.

Por meio da Medida Provisória (MP) 726/2016, um dos primeiros atos do presidente interino Michel Temer foi tirar das mãos do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) a responsabilidade sobre a demarcação das terras quilombolas.

Com a MP, o atual governo federal chegou a fundir os ministérios da Educação e da Cultura (MEC) e transferiu para a nova pasta a atribuição de decidir sobre as políticas de delimitação e demarcação de territórios das comunidades, em prejuízo do Incra. No entanto, em razão da pressão social, a fusão foi desfeita.

O novo ministério havia sido assumido pelo deputado federal Mendonça Filho, do Democratas de Pernambuco, partido autor da Ação Direta de Inconstitucionalidade 3.239/2004, que questiona a legalidade do Decreto Federal 4.887/03, que dispõe sobre a titulação dos territórios quilombolas.

A Medida Provisória 726 também promoveu a extinção de outra pasta ministerial relacionada à questão da reforma agrária, promovendo a fusão dos ministérios do desenvolvimento agrário, social e combate à fome, convertidos no novo Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário.

Diário Oficial

Entre os mais de 600 territórios remanescentes dos quilombos na Bahia, o Rio dos Macacos se destaca por já estar na área antes de a Marinha construir a Vila Naval da Barragem, nos anos 1970, depois que a prefeitura desapropriou as terras das fazendas Aratu e Meireles.

Mesmo com a publicação no Diário Oficial da União da Portaria 623, que declarou como terras da comunidade uma área de 301 hectares, em 18 de novembro último, até hoje, os moradores não receberam do governo federal o documento da titulação de posse referente a 104 hectares.

Desde o início da relação conflituosa entre moradores e militares, entrar ou sair da comunidade é uma tarefa que passa pelo crivo do comando do 2º Distrito Naval, porque, conforme a Marinha, a região representa "interesse estratégico à defesa nacional".

Segundo informações da assessoria de comunicação da Marinha, com a transição do governo federal, o órgão precisaria de autorização da Secretaria de Governo para liberar o acesso, o que não ocorreu até o fechamento desta edição, sexta-feira passada.

'Alforria'

Para a marisqueira e trabalhadora rural Rosimeire Silva, 38 anos, que mora em Rio dos Macacos, a carta de alforria dos remanescentes quilombolas é o documento de titulação, que possibilitará a construção de uma via de acesso alternativa à área onde vivem 67 famílias.

"O clima está pesado com a saída do Incra, o que deixa transparecer que não vai haver a titulação da terra", lamentou. "O Ministério da Educação não está dando conta de seus problemas, imagine a situação dos quilombolas, que não têm nada a ver com a pasta", completou.

Os descendentes dos habitantes originais do remanescente quilombola, ainda hoje, vivem como no passado, alguns em casas de barro com telhas de amianto, sem saneamento básico, água encanada, energia elétrica, acesso à educação e a serviços de saúde.

Desde 2014, continua Rosimeire, a comunidade aguarda o cumprimento das promessas governamentais, no que tange à melhoria da infraestrutura. "Nossa carta de alforria depende dessa titulação, para que possamos construir acesso à comunidade sem passar pela Vila Naval", clamou.

O pescador, trabalhador rural e extrativista José Rosalvo, 51 anos, disse que a transferência das políticas quilombolas do Incra para o MEC foi "impactante". "Porque a gente vinha numa luta que, mesmo com toda demora, estava progredindo", ele avaliou.

Com a troca de poderes, prossegue Rosalvo, a comunidade está com medo de ser despejada, "a qualquer momento", uma vez que a Advocacia Geral da União (AGU) ajuizou, em 2009, uma ação de reintegração de posse contra o moradores de Rio dos Macacos.

"A gente estava apenas esperando uma 'canetada' da presidenta Dilma (Rousseff), que tinha dificuldades para emitir a titulação", afirmou. "Depois que ela tomou essa rasteira, se, antes ela não conseguiu, não vai ser esse governo que vai fazer. Estamos muito inseguros", revelou.

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