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Visibilidade da luta quilombola cresce

Quilombolas ganham voz no campo

Roldão Arruda

Com força crescente e amparados pela lei, remanescentes de quilombos lutam para reaver terra dos antepassados

Depois dos sem-terra, dos povos indígenas e dos atingidos por barragens, um novo grupo ergue a voz em busca de direitos sobre a terra, aumentando os focos de tensão na zona rural. Agora são os quilombolas – nome dado aos remanescentes de antigos quilombos, constituídos por comunidades negras durante o período da escravidão e também depois que o regime escravocrata foi abolido.

O último atrito ocorreu na quarta-feira, quando 32 famílias quilombolas da comunidade de Tracoateua, no Pará, derrubaram uma torre de transmissão de energia elétrica erguida pela Companhia Vale do Rio Doce. Exigiam compensações pela construção de um mineroduto.

Em levantamento recém-concluído pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) verificou-se que estão em andamento 463 processos nos quais os quilombolas cobram o reconhecimento legal das terras que ocupam. Na maior parte dos casos também reivindicam a devolução de áreas ao redor, que teriam pertencido aos seus antepassados. Trata-se de uma quantidade expressiva de pedidos, cuja execução implica na desapropriação de terras em diversos Estados. Mas mesmo assim ela sinaliza apenas parte do problema.

Ninguém sabe ao certo quantos quilombos existem no País, mas é possível ter uma idéia a partir de um outro levantamento, da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), encarregada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva de coordenar o projeto Brasil Quilombola. “Pela nossa base de dados, são 3.250 comunidades quilombolas, com cerca de 2,5 milhões de pessoas”, diz Carlos Trindade Santos, da Subsecretaria de Políticas para as Comunidades Tradicionais.

Na maior parte dos casos são comunidades pobres, com baixo grau de instrução, pouco poder de pressão e que sobrevivem com o apoio do assistencialismo. A novidade é que estão fortalecendo as articulações entre elas e com outros movimentos, para ganhar força política.

Sem-terra

Ao participar, dias atrás, de um encontro de movimentos sociais em São Paulo, o quilombola Antônio dos Santos, da Coordenação dos Remanescentes de Quilombos, afirmou: “O Brasil tem muitas terras, guardadas por poucas pessoas. Estamos organizando os quilombolas e procurando nos juntar com os índios e os sem-terra para mudar isso. ” Santos mora no Quilombo da Caçandoca, em Ubatuba, no litoral paulista. Esse nome é bastante conhecido na comunidade por ter sido o primeiro quilombo beneficiado com um decreto de desapropriação de terras por interesse social.

Há 43 anos seus moradores disputavam com uma imobiliária os direitos sobre uma área de 210 hectares, de frente para o mar e dentro da Mata Atlântica. Em setembro, Lula pôs fim à disputa com um decreto de desapropriação da área, que acaba de ser devolvida às 53 famílias.

Ao todo, o pessoal da Caçandoca reivindica 890 hectares no litoral. Mas a outra parte da área ainda está sob disputa.

O direito dos quilombolas ao território que ocupam foi assegurado pela Constituição de 1988, no artigo 68 das Disposições Constitucionais Transitórias. Mas foi só em 2003 que Lula, cumprindo promessa de campanha, regulamentou a lei.Por meio do Decreto 4.887, ele definiu como devem ser os procedimentos para identificação, reconhecimento e titulação das terras. Coube ao Incra conceder o título de propriedade.A mudança tende a acelerar os processos de legalização das terras dos quilombos. Em 2004, foram concedidos 2 títulos de propriedade; em 2005, saíram 4; e neste ano, segundo o Incra, 14. São todos títulos de propriedade coletiva, ou seja, para a comunidade, não para as famílias, como na reforma agrária.Nestes três anos, o volume de terras tituladas já soma 28.725 hectares, para 1.947 famílias. Parece bastante, se comparado a períodos anteriores, mas, por outro lado, também parece uma parcela ínfima diante do que se reivindica. É difícil definir quanta terra será preciso para atender à demanda – depois de reconhecidos, os remanescentes ainda podem alegar que as terras vizinhas eram ocupadas por seus antepassados. Se estudos técnicos e científicos confirmarem, poderá ser requerida a retomada das terras.Em Goiás, o Quilombo do Calunga, o maior do País, com 1.200 famílias, reivindica 243 mil hectares, acendendo focos de tensão. Em Conceição da Barra, Espírito Santo, outras 1.200 famílias disputam com a Aracruz, produtora de celulose, uma área de 60 mil hectares.Há tensão em Nossa Senhora do Livramento, Goiás, onde fazendeiros contestam a concessão de 18 mil hectares ao Quilombo Mata-Cavalo. No Rio, na Restinga da Marambaia, quilombolas brigam na Justiça por uma área de preservação na qual a Marinha construiu uma base.O PFL vem contestando a constitucionalidade do Decreto 4.887. Do outro lado, os quilombolas tentam se organizar para acelerar as desapropriações.

< O Observatório Quilombola publica todas as informações que recebe, sem descartar ou privilegiar nenhuma fonte, e as reproduz na íntegra, não se responsabilizando pelo seu conteúdo.>

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