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Turismo étnico já beneficia comunidades quilombolas

Turismo Étnico

Nos últimos tempos, o governo brasileiro despertou para o filão econômico proporcionado pela indústria turística, considerada limpa e rentável, sobretudo após a conscientização de que o país representa um dos mais importantes destinos de todo o mundo, em tal setor. Com o incremento do turismo, vem sendo observado, ao mesmo tempo, uma segmentação cada vez maior em tal atividade, despontando o turismo étnico como saudável novidade. A etnicidade é um fenômeno social que reflete vertentes de identificação e inclusão de determinadas pessoas em um grupo étnico, definido a partir de pressupostos ligados à sua origem, cultura e história. Duas tendências históricas surgiram para estabelecer a definição de tais grupos. A primeira, conhecida como essencialista, buscou estudar as populações sob o ponto de vista histórico e cultural. A segunda, de viés construtivista, estudou os impactos provocados pelas relações sociais entre os grupos, observando suas fronteiras étnicas, o que nos remete à idéia de território, espaço no qual ocorrem os fenômenos estudados pela corrente essencialista. A existência dessa fronteira étnica cria, por si mesma, a atração turística

O Brasil é uma nação ainda jovem, que possui colonização diversificada, apresentando profundas e ainda bem conservadas raízes culturais originárias das diversas etnias que compõem a sua população. Alicerçados em tal constatação, algumas entidades começaram a se movimentar no sentido de estruturar, desenvolver e explorar esse potencial. Dessa forma, o turismo étnico apresenta como característica principal a oferta, ao visitante, de uma rara e rica possibilidade de contato com lugares onde se evidencia a presença de comunidades que contribuíram para a formação do povo brasileiro, onde se percebe uma cultura preservada, evidenciada por hábitos, folclore e costumes, dentre outros modos de se relacionar com o espaço no qual se encontram. Comunidades quilombolas rurais e territórios indígenas são os exemplos mais evidentes a serem citados quando tal assunto é abordado.

Várias Unidades de Conservação espalhadas pelo país, representadas por áreas demarcadas e legalmente reservadas para a preservação ambiental são habitadas por comunidades tradicionais, que estabelecem secularmente uma relação de equilíbrio com o ecossistema no qual se encontram, explorando os recursos naturais por meio de uma agricultura de subsistência e do extrativismo manejado de forma naturalmente racional. Atualmente, discute-se a utilização do turismo ecológico como nova alternativa de sobrevivência dessas populações, embora existam questionamentos acerca de tal procedimento. De qualquer forma, cabe informar que o turismo ecológico possui relação íntima com o turismo étnico. Estudos recentes indicam que o Brasil possui a maior biodiversidade da Terra, ao lado de países como a Colômbia, o México, a Indonésia e o Peru, detendo ao mesmo tempo 28% das matas tropicais e a maior bacia hidrográfica do planeta. Esses dados são atrativos poderosos oferecidos pelo turismo de cunho ecológico.

Segundo definição formulada pela EMBRATUR – Empresa Brasileira de Turismo, o turismo ecológico deve contemplar “atividades desenvolvidas em localidades com potencial ecológico, de forma conservacionista, procurando conciliar a exploração turística com o meio ambiente, harmonizando as ações com a natureza e oferecendo aos turistas um contato íntimo com os recursos naturais e culturais da região, buscando a formação de uma consciência nacional” (EMBRATUR, 1991). Ampliando tal raciocínio, deve-se entender ainda que não deve existir separação entre a exploração turística e o meio ambiente por meio de qualquer intervenção de ordem arquitetônica, por exemplo. As construções das casas de moradores de comunidades tradicionais geralmente são adaptadas ao local, sobretudo às condições climáticas, ocorrendo a utilização de recursos naturais à disposição, tais como folhas de palmeiras usadas para a cobertura das moradias, o que revela uma das nuances da tradição. A extração da palha acontece de acordo com a lua, aumentando a durabilidade do material, e somente uma determinada quantidade é retirada de uma mesma planta, sem prejuízo para a sobrevivência e regeneração da árvore. Esse procedimento revela uma cultura que finca suas raízes na ancestralidade. Mostrar essa prática ao visitante de uma comunidade revela uma das vertentes do turismo étnico. Em tais locais, deve-se evitar ainda grandes concentrações de pessoas, o que vem sendo feito por intermédio da conscientização, tanto dos moradores quanto dos turistas, respeitando-se a necessidade de preservação e a valorização do patrimônio cultural e natural.

No Rio de Janeiro, no município de Paraty, localiza-se o quilombo Campinho da Independência. Ali, o turismo étnico vem sendo explorado de forma experimental, e já apresenta alguns resultados positivos. A identificação da comunidade aconteceu a partir de uma dissertação de mestrado feita pela socióloga Neusa Gusmão, da USP – Universidade de São Paulo, trabalho que se transformou no livro “Terra de Preto, Terra de Mulheres”, editado pela Fundação Palmares em 1988. A tituilação do quilombo, em 1999, forneceu visibilidade ao local e ao município. Desde então, visitas ao quilombo começaram a ser agendadas por escolas e por pequenos grupos de interessados. Em 2002, a indicação de Paraty para ser reconhecida como patrimônio da humanidade aumentou o interesse agregado pela comunidade. Há dois anos, os quilombolas, que já se aproveitavam do turismo, apresentaram e aprovaram um projeto junto à Petrobras, intitulado “Projeto de Desenvolvimento Sustentável da Comunidade de Campinho da Independência”, que vem permitindo a capacitação em diversas frentes.No projeto, estão sendo realizados módulos de História da África e de História do Negro no Brasil, História do Quilombo de Campinho, História de Paraty, além de capacitação em agroecologia, artesanato (com utilização de sementes nativas) e percussão. No momento, um restaurante adaptado está sendo construído, visando atender ao crescimento da demanda. Conforme declarações de Ronaldo dos Santos, quilombola de Campinho, presidente da ACQUILERJ – Associação das Comunidades Quilombolas do Estado do Rio de Janeiro e coordenador da CONAQ – Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas, “no momento já temos parcerias até com agências de turismo, e as visitas são agendadas previamente; nós recebemos o visitante e oferecemos um café da roça, sendo que o café é plantado por nós mesmos e torrado na hora, acompanhado por milho, aipim, beiju ou cará. Temos ainda o café de cana, no qual coamos o caldo de cana fervido com café. Oferecemos ainda o almoço, à base de galinha caipira, peixe com banana, feijoada, palmito de pupunha e juçara, dentre outros pratos”. A maior parte dos alimentos oferecidos é produzido pela própria comunidade.Em Campinho, também acontecem passeios à agrofloresta, às trilhas ecológicas, à Casa de Farinha e aos núcleos familiares. A organização social de Campinho é familiar. Ali todos são parentes, descendentes de três mulheres, Vovó Antonica, Tia Marcelina e Tia Luísa. Numa dessas visitas, as pessoas se defrontam com os griôs, geralmente senhores de idade que são exímios contadores de histórias e que deliciam os turistas com seus conhecimentos ancestrais. Em Campinho, o visitante ainda pode desfrutar do contato com manifestações culturais locais, tais como o Jongo, dança da qual participam homens e mulheres. Ao som dos tambores Tambu e Candongueiro o Jongo pode ser visto na festa de São Benedito, que acontece em abril, na festa de Bom Jesus, em agosto, ou no Encontro de Cultura Negra, que se realiza nos dias 17, 18 e 19 de novembro. Com agendamento prévio de grupos de turistas, a dança pode ser vista em qualquer outra ocasião. Ocorrem ainda apresentações de blocos de percussão,sendo usados o timbau, o repinique, a caixa e o surdão, além de um tambor grande de madeira e couro de boi que é confeccionado por lá. Maiores informações sobre o quilombo podem ser obtidas por meio do site quilombocampinho.org

< O Observatório Quilombola publica todas as informações que recebe, sem descartar ou privilegiar nenhuma fonte, e as reproduz na íntegra, não se responsabilizando pelo seu conteúdo.>

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