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Seminário Afro-brasileiro abre espaço para comunidades colocarem seus problemas

SEMINÁRIO AFRO-BRASILEIRO: O SERIDÓ VIVENDO E DISCUTINDO A PERSONALIDADE NEGRA EM BUSCA DE UMA EQÜIDADE SOCIAL
PROMOÇÃO: ADECAP e SEACAP
LOCAL: PARELHAS-RN
DATA: 10 DE JULHO DE 2005

RELATÓRIO FINAL DA ASSESSORIA

Foi realizado na sede do Clube Centenário, no Centro da cidade de Parelhas-RN, O I SEMINÁRIO AFRO-BRASILEIRO: O SERIDÓ VIVENDO E DISCUTINDO A PERSONALIDADE NEGRA EM BUSCA DE UMA EQÜIDADE SOCIAL, promovido pela Associação de Desenvolvimento Cultural e Artístico de Parelhas – ADECAP e o Serviço de Apoio aos Projetos Alternativos Comunitários – SEACAP, que contou com a participação das comunidades negras e quilombolas de Boa Vista dos Negros, Sítio Bom Sucesso, Negros do Riacho e Macambira; dos Negros do Rosário de Caicó, Jardim do Seridó e Boa Vista; grupos de capoeira Terra do Sol e Cordão de Ouro; grupos de teatro Baraúna e Coisa Nossa; além de representantes das Prefeituras Municipais de Parelhas, Acari e Lagoa Nova; do Sebrae e da ONG Casa da Família. Estiveram presentes ao evento também representantes do Incra e Seara.
As discussões foram iniciadas com uma rápida apresentação dos participantes, seguida de uma palestra do senhor José Procópio de Lucena, representante do SEACAP, intitulada “Políticas Públicas como Fomento de Sustentabilidade para as Comunidades Negras”. Na sua exposição, debateu o arcabouço histórico e legislativo atinente aos direitos das populações negras, destacando as conquistas dos últimos anos, que são contrabalançadas pela inação dos órgãos do Estado na garantia dos direitos dos afro-descendentes. Após esse momento, o debate foi aberto para a plenária com a explanação dos problemas vividos pelas comunidades.
COMUNIDADE DE MACAMBIRA – Municípios de Lagoa Nova e Bodó. As 150 famílias da comunidade ocupam suas terras tradicionais há mais de 100 anos, possuindo escritura registrada em cartório, ainda do tempo do Império, no nome do seu fundador. Afirmam serem descendentes de negros e caboclas “pegas a laço de cavalo”. Algumas famílias adotam uma estratégia de pagamento coletivo de impostos no nome deste antepassado, como forma de garantir a posse coletiva das terras. A situação fundiária é agravada pela pressão de latifiundiários que tomaram parte significativa de suas terras, encurralando-os em uma pequena faixa de pouco mais de 150 hectares. Há cerca de 10 anos, a comunidade ocupou uma área de 500 hectares, denominada Bonfim, onde estão organizados na forma de um asentamento que inclui moradores não quilombolas, e que não oferece condições de abastecimento de água favoráveis, apesar das terras serem excelentes para o plantio. O Incra protela a regularização desta área, alegando a escassez de água, o que é contestado pela comunidade, que afirma haver modos de ocupação viável das terras. Há conflitos com famílias de assentados que não pertencem à comunidade e com o proprietário da área. A área total reivindicada é de 4.900 hectares. Os pleitos da comunidade são encaminhados através da Associação Quilombola da Macambira – ASQUIMA e do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Lagoa Nova.
COMUNIDADE BOA VISTA DOS NEGROS – Município de Parelhas. A comunidade é a única com processo de regularização fundiária em andamento enquanto terra quilombola na região do Seridó. Enfrentam o mesmo problema de cercamento por latifúndios, que os deixam apenas com uma estreita faixa de terra, insuficiente para a garantia de sua reprodução física e cultural. A comunidade participa da tradicional Festa do Rosário, na cidade de Jardim do Seridó, junto com a Irmandade e os Negros do Rosário daquela cidade, onde dispõem de uma casa sede. Em Boa Vista há uma associação quilombola, que juntamente com a ONG Casa da Família vem desenvolvendo projetos de geração de renda e valorização cultural .
NEGROS DO RIACHO E SÍTIO BOM SUCESSO – Município de Currais Novos. São das comunidades mais carentes, apresentando alto índice de dependência dos poderes públicos municipal e estadual. A comunidade queixa-se de moradias precárias e o abastecimento de água foi regularizado apenas recentemente. Reivindicam uma creche e uma escola noturna para os adultos. A terra é dos negros e possuem 45 títulos dominiais em processo de regularização pelo Incra.
COMUNIDADES DO MUNICÍPIO DE ACARI: NEGROS DO RIACHO DO NAVIO, MALHADA DO SOBRADO, SACO DOS PEREIRA E IPUEIRA – O representante da Prefeitura de Acari falou em nome das comunidades. Segundo ele, as comunidades estão distribuídas entre a zona rural e a zona urbana, enfrentando problemas graves de falta de terras, água, moradias precárias e insuficientes, analfabetismo e desemprego. Muitas famílias negras trabalham na produção de cerâmica no município.
NEGROS DO ROSÁRIO DE JARDIM DE SERIDÓ – Grupo étnico-ritual sediado em Jardim de Seridó e Boa Vista dos Negros. Reclamam da falta de apoio e do descaso dos poderes públicos e da Igreja na manutenção dos centenários rituais da Festa de Nossa Senhora do Rosário, realizada pela Irmandade, fundada em 1863, e pelos Negros do Rosário. Estão se organizando na forma de uma associação para gerirem, sem a interferência do clero, os rituais em homenagem a sua Santa Padroeira. Reclamam que a casa da Irmandade encontra-se fechada a maior parte do ano e que eles só têm acesso a ela na época da Festa.
NEGROS DO ROSÁRIO DE CAICÓ – Grupo étnico-ritual sediado em Caicó. Reclamam da falta de apoio e do descaso dos poderes públicos e da Igreja na manutenção dos centenários rituais da Festa de Nossa Senhora do Rosário, realizada pela Irmandade e pelos Negros do Rosário. Estão se organizando na forma de uma associação para gerirem, sem a interferência do clero, os rituais em homenagem a sua Santa Padroeira. Contam com o apoio do grupo de teatro Coisa Nossa, de Caicó. A Irmandade e a Festa do Rosário de Caicó são, provavelmente, as mais antigas do sertão. Sua fundação data de 1771.
Após o debate, foram apresentadas algumas propostas de encaminhamento para a plenária:

– Criação da “Fundação Negra do Rosário do Seridó”, uma instituição destinada à manutenção, promoção e aprimoramento histórico-cultural das comunidades negras ritualísticas e quilombolas do Seridó-RN. Uma fundação consorciada reconhecida como patrimônio histórico-cultural da humanidade mantida por parcerias do governo federal (prédio e instalações-tombamento); pelo governo estadual (pessoal e manutenção lojística da fundação) e com repasse de 1% do orçamento dos municípios envolvidos, visando a manutenção de custos, em apresentações e encontros sócios-culturais e políticos envolvendo as comunidades quilombolas seridoenses do RN (proposta da representante da Casa da Família);
– Solicitação de tombamento das Festas, Irmandades e grupos de Negros do Rosário como patrimônio imaterial artístico, histórico e cultural nacional pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN;
– Criação de Fóruns Regionais anuais visando a deliberação de políticas públicas voltadas para a inclusão social e garantia de direitos para as comunidades quilombolas do Seridó-RN;
– Criação de uma organização para articular as associaçöes de comunidades negras do Seridó, no sentido de potencializar sua capacidade de luta e reivindicação dos seus direitos;
– Estreitar os laços com instituições públicas de defesa e promoção dos direitos humanos e quilombolas como Ministério Público Federal, Conselho Estadual de Direitos Humanos e as universidadades públicas do estado.

Estas propostas foram acatadas pela plenária, que reconhece a necessidade de uma maior articulação e troca de experiências entre as comunidades negras do Seridó. Salientamos com preocupação o desconhecimento das comunidades do aparato legal e institucional que garante os seus direitos enquanto populações etnicamente diferenciadas. Nesse sentido, durante a sessão foram apresentados alguns mecanismos legais, tais como a Constituição Federal de 1988, a Convenção 169/OIT e decretos presidenciais, como o 4.887/2003, que reconhecem direitos das comunidades quilombolas. Infelizmente, os representantes do Incra e Seara retiraram-se do evento antes do seu término e sem terem se dirigido à plenária.
Antes de finalizarmos, gostaríamos de ressaltar a força e a vitalidade com as quais a cultura negra está presente nos municípios do Seridó potiguar, constituindo uma rede de relações de sociabilidade manifestadas através das Festas do Rosário, dos grupos de capoeira e das companhias de teatro de toda a região que estiveram presentes a este seminário e possuem um intenso calendário de atividades durante o ano.

“Viva Nossa Senhora do Rosário! Viva as Comunidades Negras do Seridó!”

Parelhas, Rio Grande do Norte, 10 de julho de 2005.

Estêvão Martins Palitot
Antropólogo
(GT Indígena e Comissão de Direitos Humanos da UFPB)

Fernando de Souza Barbosa Júnior
Especialista em Direitos Humanos
(GT Indígena e Comissão de Direitos Humanos da UFPB)

Contatos das comunidades e das agências que as auxiliam:

Edvan Bonifácio (grupo de teatro Coisa Nossa): (84) 3421-2003
meji35@uol.com.br , coisa_nossa@uol.com.br

SEAPAC (Diocese de Caicó): (84) 3421-2125

ADECAP (Parelhas): falar com Wildma (84) 34712369

Associação Boa Vista dos Negros: (84) 9926-7699 (Graça – presidente)

STR de Lagoa Nova: (84) 3437-2217

” Valoriza, herói, o sangue derramado Afro-Tupi!”

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