Quilombo Lapinha luta contra despejo de 170 famílias
Conflito sobre território envolve Instituto Estadual de Florestas. Caso judicial é marcado por impasses
Por Amélia Gomes
Território tradicional do quilombo é constituído por cinco comunidades / Foto: J.R. Ripper
Foi suspensa nesta terça-feira (30) a ordem de despejo das 170 famílias do Quilombo Lapinha, em Matias Cardoso, no norte de Minas Gerais. A ação estava prevista para acontecer no dia 13 de agosto. A decisão pela suspensão foi do desembargador Adriano de Mesquita Carneiro, do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. As famílias quilombolas vinham enfrentando um processo de pedido de reintegração de posse, movido pela empresa Fazendas Reunidas do Vale do São Francisco – Farevasf, que deu início ao requerimento em 2006. O conflito envolve a Fazenda de Casa Grande.
Entenda o caso
Em 2005, a comunidade recebeu da Fundação Palmares a declaração de reconhecimento como comunidade quilombola. No ano seguinte, decidiram retomar a Fazenda Casa Grande, que originalmente pertencia aos remanescentes do território. A partir daí começou o processo judicial que até hoje assombra o Quilombo da Lapinha.
Após a retomada do território, os proprietários da Farevasf, que detinham a posse do terreno, entraram com um pedido de reintegração de posse. Em 2010, o Instituto Estadual de Florestas comprou a Fazenda Casa Grande. À época, o órgão alegava que a aquisição do território seria para a expansão do Parque Estadual da Lagoa do Cajueiro. Esse argumento é questionado pelo advogado do Quilombo da Lapinha, André Alves de Souza.
“Na época os órgãos ambientais do estado eram dominados por quadrilhas. A Fazenda não tinha utilidade nenhuma para o IEF. (Compraram) Foi para arrecadar dinheiro com processo de desapropriação. O Instituto comprou mesmo sabendo que era área de quilombo, sabia que famílias moravam lá, mas comprou o terreno mesmo assim.” critica o advogado.
O Instituto Estadual de Florestas condicionou o pagamento total da compra do território à retirada das famílias. O que fez com que o pedido de reintegração de posse fosse retomado pela Farevasf. Em 2013 o caso foi transferido para Justiça Federal, que concedeu uma decisão liminar de manutenção de posse, garantindo que os quilombolas da Lapinha permanecessem nos 22 hectares até que se concluísse a titulação do território.
Com o vencimento da liminar da justiça federal, em 2016, o caso voltou para a Vara Agrária. Na ocasião, o IEF foi convocado para se manifestar sobre o caso, o posicionamento do órgão foi pela retirada da comunidade. O caso ficou em aberto até que, em 2018, o então governador Fernando Pimentel (PT) publicou um decreto instituindo a Fazenda Casa Grande como área de interesse social, o que beneficiou as famílias quilombolas.
A mais recente cartada contra a comunidade quilombola foi dada neste ano, quando uma decisão da Vara Agrária determinou a reintegração de posse ao Instituto, o que desencadeou na ordem de despejo da comunidade. A suspensão da ordem de despejo foi concedida de maneira provisória, até que o agravo do Quilombo contra a decisão da Vara Agrária seja julgado. No agravo, a comunidade pede a manifestação do IEF sobre o caso.
Próximos passos
Para tentar recorrer da ação de reintegração de posse, as famílias estão se articulando para que haja uma ação civil no Ministério Público Federal contra o estado. Nesta sexta-feira (5) os quilombolas recebem a visita de representantes do Instituto Estadual de Florestas para conversar sobre o caso. Para o próximo dia 6 está prevista também uma reunião na mesa de diálogo do governo para debater o caso.
O território tradicional do Quilombo Lapinha é constituído por cinco comunidades: Várzea da Manga, Lapinha, Santa Efigênia, Ilha da Ressaca e Retomada Rio São Francisco. De acordo com os moradores, o Quilombo da Lapinha tem suas origens datadas do século XVII.
Edição: Joana Tavares
FONTE: Brasil de Fato em 30/07/2019