UM TERRITÓRIO: Pimenteira
Localizada na zona da mata do Baixo Sul da Bahia, município de Camamu, a comunidade de Pimenteira ocupa suas terras há pelo menos 150 anos. Marilene Santos Silva, nascida e criada no local, diz ouvir dos mais velhos que seus ancestrais habitavam estas terras antes mesmo do fim da escravidão, isto é, antes de 1888.
A vida econômica de Pimenteira é baseada na agricultura familiar do cultivo do cacau, cravo e mandioca e, há 50 anos, também do guaraná, da seringueira, entre outras.
Em fins da década de 1970, quando apareceram alguns supostos donos das terras, a comunidade contava com 208 famílias. Neste período houve confrontos diretos entre a comunidade e estes fazendeiros, o que acarretou a expulsão de parte das famílias da comunidade. Hoje restam apenas cerca de 40 famílias, ocupando um território de aproximadamente cinco mil hectares.
O primeiro apoio para resistir e persistir na luta veio da Pastoral Rural da Diocese Católica de Camamu que, além de somar forças nos enfrentamentos locais, pressionava o governo a buscar uma solução para o conflito. O segundo apoio veio do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Camamu (STR-Camamu), mas como diz Manoel Luiz, atual presidente, a força do sindicato “não era nem de um terço do que é hoje.” A mudança de postura do STR-Camamu e seu fortalecimento só se concretizaram quando lideranças das comunidades assumiram a direção. Hoje a entidade está à frente das lutas das comunidades rurais do município, buscando soluções para os problemas locais, melhoria na qualidade de vida e articulando espaços para que os moradores sejam ouvidos.
Após dois anos de confrontos diretos entre os quilombolas e grileiros – com eventos de enfrentamento de capangas, tentativas de intimidação com documentações forjadas -, em 1981 o governo da Bahia regularizou parte das terras da comunidade de Pimenteira, dando uma trégua aos conflitos. Uma das consequências destes anos de conflitos foi a migração de parte das famílias de Pimenteira para regiões próximas. Em algumas destas regiões as famílias de Pimenteira formaram novas comunidades, como Dandara e Zumbi dos Palmares, que hoje também lutam pela garantia de seus direitos. O exemplo de Pimenteira inspirou outras comunidades em Camamu e municípios vizinhos, mas mesmo com uma associação organizada e atuante os direitos da comunidade continuam sendo desrespei tados. Atualmente a região de Camamu tem sido beneficiada com projetos de infra-estrutura, como a construção de estradas, poços artesianos e com a incidência de programas sociais do Governo Federal, como o Luz para Todos, mas a comunidade de Pimenteira não vem sendo contemplada por tais benefícios.
Em 2008 Pimenteira foi certificada pela Fundação Cultural Palmares como remanescente de quilombo, obtendo instrumentos novos para a luta por seu território e pelo acesso às políticas públicas. A expectativa da comunidade é que o reconhecimento possa levar a uma melhoria da qualidade de vida das famílias e a um novo bom exemplo para as outras comunidades da região.
Ana Gualberto, graduanda em História pela Universidade do estado do Rio de Janeiro, assessora do programa Egbé Territórios Negros de KOINONIA.
Fonte: Entrevistas com Marilene Silva dos Santos, Dona Moça (Virgínia dos Santos) e Manoel Luiz, em novembro de 2008. Na edição de nº 36 o texto “Zungus e Taguás”, da seção Um Pouco de História, foi escrito por Antônio Carvalho Costa – Historiador pela PUCSP e Assistente do Programa Egbé Territórios Negros de KOINONIA
FONTE: Boletim Territórios Negros, v. 9, n. 37, jan./ fev./ mar. 2009