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Os territórios quilombolas em Mato Grosso

Desde o período colonial, os quilombos se constituíram em territórios que abrigavam os excluídos do sistema colonial e imperial – negros, índios e homens brancos pobres e pardos, que fugiam dos maus tratos sofridos. 

O empenho dos proprietários de terra foi grande no combate aos quilombos, ocasião em que investiam na montagem de expedições que objetivavam destruir os quilombos, capturando suas “peças”, valiosas, à época. Um dos redutos de quilombo mais resistentes, em Mato Grosso, foi o Quilombo do Quariterê, comandado por um rei e pela rainha Tereza de Benguela. 

Quando não se conseguia destruir os quilombos, a população marginalizada que o habitava se mantinha e resistia no território conquistado. Quando se pensa em quilombos, tem-se a errônea ideia de que os mesmos se localizavam apenas muito distantes das cidades, porém, alguns se instalaram em locais que, hoje, se constituem territórios urbanos. Isso se deve ao fato de que, mesmo tendo tido como localização inicial as zonas distantes das antigas Vilas e Cidades coloniais e imperiais, com o avanço populacional e urbano acabaram sendo incorporados ao perímetro urbano. Por esse motivo, as terras dos antigos quilombos, e que hoje abrigam as populações quilombolas, podem estar situadas tanto nas áreas urbanas quanto nas rurais. 

Pela Lei n. 601, de 18 de setembro de 1850, conhecida como a Lei de Terras, as antigas Cartas de Sesmarias, demarcadoras dos territórios coloniais e parte do imperial, deveriam, em cartório, ser escrituradas em nome daqueles que receberam o título e reivindicavam, mais uma vez, sua posse. As populações dos quilombos, desprovidas, muitas vezes, do documento sesmarial, se conservaram, provisoriamente, nos espaços dos quilombos, uma vez que, caso aparecesse alguém munido de documentação escriturada em mãos, seriam obrigadas a deixar as terras, ocasião em que resistiam no âmbito judicial, buscando permanecer no território. Com o passar do tempo, os quilombolas adquiriram o direito à terra, especialmente pelo princípio do usucapião, que dispensa a apresentação de qualquer título de sesmariam, mas leva em conta o tempo de permanência da população naquele solo. 

O processo de regularização das ter¬ras quilombolas teve início no ano de 1995, sob a coordenação do Instituto Nacional de Reforma Agrária – INCRA, porém, por força do Decreto 3.912/2001, essa atribuição foi repassada à Fundação Cultural Palmares – FCP. Em 2003, o INCRA retomou, ao lado da Fundação Cultural Palmares, suas antigas funções, […] identi¬ficando as comunidades quilombolas, seja elaborando relatórios antropológicos, pe¬ças-chave na delimitação das terras e no seu reconhecimento, seja realizando a de¬sintrusão, demarcação, titulação e regis¬tro das terras ocupadas pelos quilombos”. (INCRA, Relatório 2012, p. 11) 

A titulação dos Territórios Quilombolas tem como princípio ser indiviso, ou seja, não pode ser vendido ou cedido separadamente ou na sua totalidade, o que garante às futuras gerações a posse de um solo para habitar. Nessa medida, constitui uma terra inalienável, ou seja, diferentemente das terras comerciais, está reservada ao usufruto exclusivo das comunidades quilombolas ao longo do tempo. De acordo com o INCRA: “Esse fato, por vezes, é o que está no cerne de indis¬posições à política de regularização fun¬diária de territórios quilombolas. Trata-se de uma política que desagrada a terceiros, pois retira terras do mercado imobiliário e da exploração particular de recursos na¬turais”. (INCRA, Relatório, 2012, p. 15) 

Quando os quilombolas reivindicam o título das terras que habitam há séculos, o documento definitivo de posse, atualmente, é emitido pela Fundação Cultural Palmares, órgão vinculado ao Ministério da Cultura e voltado para a preservação da cultura afro-brasileira, constituindo em organismo máximo da representatividade quilombola e responsável pela concessão da certificação da posse. Esse é o primeiro passo para titularização da terra, que é feita pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). Esse organismo já titularizou 190 dessas comunidades, abrangendo 233 delas, favorecendo, em 1.033.426,8975 hectares, a 15.171 famílias quilombolas (INCRA: Relatório 2012, p. 22) 

Em Mato Grosso, segundo dados da Fundação Cultural Palmares, existem 69 comunidades “certificadas”, pois todas receberam a “certificação” até 2010, estando as mesmas situadas no perímetro dos municípios de Acorizal, Cuiabá, Chapada dos Guimarães, Barra do Bugres, Porto Estrela, Poconé, Cáceres, Vila Bela da Santíssima Trindade, Nossa Senhora do Livramento, Santo Antônio do Leverger, Várzea Grande. 

A toponímia de Mato Grosso guarda a memória existencial de regiões onde foram instalados os quilombos, a exemplo de Rio Quilombo, no município de Chapada dos Guimarães, e Capão do Negro, hoje Distrito do Cristo Rei, em Várzea Grande, tão bem estudado por Ubaldo Monteiro da Silva e sua filha Suíse Monteiro Leon Bordest. 

No plano econômico, a produção das comunidades quilombolas é significativa, uma vez que suas plantações e criações servem de base para abastecer a própria comunidade, visto que o excedente comercializado nas circunvizinhanças, ou enviados para outras localidades. 

Nos territórios quilombolas, os recursos hídricos e vegetação são de usufruto de toda comunidade quilombola. No tocante ao patrimônio cultural, é sabido que os quilombolas têm gran¬de contribuição na construção da nação, visto seu relevante e centenário legado cultural, cumprindo, nessa medida o que prescreve a Constituição de 1988 (artigos 215 e 216): zelar pela preservação da cultura material e imaterial de um segmento que tanta contribuição deu e ainda dá ao Brasil. 

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