Quilombolas e pequenos agricultores avisam: não vamos recuar ante violência do governo Hartung
Depois de serem violentamente reprimidos durante uma manifestação pela conclusão do asfaltamento da rodovia ES-315, que liga Boa Esperança a São Mateus, no norte do Estado, os movimentos sociais e lideranças comunitárias se reuniram para avaliar a repressão das forças policiais enviadas para acabar com o protesto pacífico dos moradores.
Os três líderes comunitários detidos logo no início do protesto, identificados como Jucilene, da comunidade quilombola Nova Vista; Ronaldo; e Carlos Alberto, da comunidade de Morro da Arara, foram soltos ainda nessa segunda-feira. As lideranças ficaram estarrecidas com a violência empregada contra os moradores e avaliaram que essa ação covarde é própria do governador Paulo Hartung (PMDB).
Em reunião para avaliar o movimento, as lideranças lembraram do caso de violência sofrida pelo quilombola Berto Florentino em 2009. Berto reside na comunidade quilombola de São Domingos, em Conceição da Barra (norte do Estado) e foi vítima de violência por parte da polícia do Espírito Santo e da Bahia. Dentre tantas violências sofridas por Berto, em uma delas a polícia foi à casa dele, jogou seus móveis no chão e levou a família inteira à delegacia, inclusive um filho cego, Sabino Cardoso Florentino.
A violência sofrida por Berto e pela família dele foi praticada no segundo mandato deHartung e demonstra a intolerância do governador com os movimentos sociais.
A operação, realizada em novembro de 2009, culminou com a prisão arbitrária de pelo menos 32 quilombolas. Para a operação, o Estado disponibilizou um verdadeiro aparato de guerra para prender os quilombolas, com cerca de 100 policiais do Batalhão de Missões Especiais (BME), da 3ª Companhia do Batalhão Militar do Meio Ambiente (BPMA) e de três grupos da 5ª Companhia Independente, além do apoio de milicianos da Garra – segurança armada da Aracruz Celulose (Fibria).
Contra os quilombolas, havia uma acusação de roubo de eucalipto, mas sequer houve apreensão de madeira. Os policiais também não tinham mandado de prisão ou estado de flagrante delito o que, por si só, já é ilegal. Como agravante, não ocorreu a comunicação imediata das prisões ao juiz competente, ao Ministério Público e às famílias dos presos ou pessoa por eles indicada. Em 2013, quatro anos depois da operação, a Justiça Federal determinou o pagamento, pelo Estado, de R$ 100 mil às famílias da comunidade de São Domingos.
A rodovia reivindicada pelos movimentos sociais do norte do Estado fica em área quilombola e de pequenos agricultores, ou seja, atende a uma população que tem mais dificuldade de locomoção, seja para escoar a produção ou mesmo para ter acesso a um município-polo, que é o caso de São Mateus.
A tentativa de intimidar o grupo que foi formado para cobrar o asfaltamento da via foi frustrada, já que as lideranças comunitárias avaliaram que, apesar de toda a violência empregada, o movimento foi fortalecido. As lideranças comunitárias vão promover reuniões para mostrar aos moradores da região que a repressão está estabelecida pelo governo contra os movimentos sociais, que pretendem não recuar diante da violência.
Violência
O protesto dos moradores estava previsto desde a última semana e pleiteava a conclusão das obras iniciadas ainda no governo Renato Casagrande (PSB). O projeto prevê o asfaltamento de 65 km da rodovia mas, quando restavam apenas 25 km para a conclusão da obra, já no governo Paulo Hartung, o asfaltamento foi interrompido.
A manifestação já havia sido programada com antecedência, por isso, o governador enviou dois emissários – o secretário-chefe da Casa Civil, Paulo Roberto, e o líder do governo na Assembleia Legislativa, o deputado Gildevan Fernandes (PMDB), ambos da região norte – para tentar convencer os moradores a não realizarem o protesto na manhã desta segunda-feira.
As comunidades, no entanto, foram irredutíveis em relação ao protesto. A desconfiança dos moradores é que o governador Paulo Hartung, ao mandar os emissários, já alertou as forças de segurança caso houvesse o protesto.
A concentração para a manifestação foi a partir das 5 horas e, tão logo o protesto foi iniciado, em uma marginal da BR-101, na altura do Centro Universitário Norte do Espírito Santo (Ceunes), da Universidade Federal do Estado (Ufes), foi violentamente repreendido pela PRF e pela PM.
Os moradores, dentre eles idosos e mulheres, relataram que nunca viram tantos policiais deslocados para a repressão de um protesto na região. Assim que o protesto iniciou, os policiais atiraram bombas de efeito moral, gás lacrimogêneo e balas de borracha contra os moradores.
O relato geral era que a ação da polícia havia sido desproporcional, porque não houve violência por parte dos manifestantes. A prisão sumária de lideres comunitários foi outra evidência que comprovou que a ação da polícia foi premeditada com o intuito de desarticular rapidamente o protesto.