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Menos de 5% dos quilombolas têm terras legalizadas no RJ

Maria Conga, guerreira do povo quilombola. Mulher negra vinda da República do Congo, na África, dedicou sua vida à luta pela libertação dos escravos no Brasil e faleceu aos 95 anos em 1895. O quilombo que ela fundou no município de Magé e que leva seu nome hoje é a casa de mais de 300 famílias, sendo 85 famílias quilombolas. Embora histórica e reconhecida pelo poder público, a comunidade ainda luta para receber o título de posse da terra.

Essa situação não é isolada. Segundo a Associação de Comunidades Remanescentes de Quilombos do Estado do Rio (Acquilerj), dos 42 quilombos existentes no estado, 32 já foram reconhecidos. Porém, apenas duas comunidades quilombolas conseguiram o título de suas terras, o que representa míseros 5% do total. A lentidão para garantir esse direito aos quilombolas é assustadora. Se o Quilombo Campinho da Independência, em Parati, tornou-se o primeiro a ganhar o título em 2003, o segundo e último a conquistar esse direito foi o Quilombo Preto Velho, de Cabo Frio, que só recebeu o título de posse em 2012.

Dificuldades

Nascida no Quilombo de Maria Conga, Ivone Bernardo lembra que, além do enorme atraso com a burocracia, os quilombolas têm outros obstáculos que precisam ser vencidos. “Nosso principal inimigo é a especulação imobiliária. A invasão também é muito grande, de gado, de fazendeiros. A gente sabe que o território é nosso, estamos desde sua fundação”, denuncia a quilombola, que é presidenta da Acquilerj e do Conselho Estadual dos Direitos do Negro.

Os conflitos com fazendeiros também são grandes problemas para o povo quilombola. Expulsão de suas terras e ameaças de morte são artifícios utilizados para oprimir ainda mais o povo negro. “Sempre denunciamos ao Ministério Público, mas sabemos que a demora é grande. Às vezes chamamos o Incra, que, quando sai, continuamos a receber ameaças. Alguns foram mortos. Em São Fidélis [norte fluminense], os quilombolas da comunidade de São Benedito estão fora de seus territórios, mas continuam recebendo ameaças”, completa Ivone Bernardo, acrescentando que a Acquilerj está preparando um relatório sobre esses conflitos.

PEC

Povos tradicionais como os indígenas e os caiçaras têm em comum com os quilombolas uma busca essencial: o respeito. Povos e comunidades estão ameaçados de remoção de seus territórios em nome de interesses privados. Expulsão que pode vir através de ameaças, da demora para conseguir o título de terra, de decretos do poder público ou do conjunto de todos esses fatores.

Na segunda-feira (24) foi realizada uma audiência da Comissão de Direitos Humanos da Alerj, com a presença de 50 comunidades e povos tradicionais. Na ocasião, foi apresentado um Projeto de Emenda à Constituição Estadual (PEC) que poderá transformar esse cenário. De autoria da bancada do PSOL na Alerj, o projeto estabelece alguns pontos fundamentais para os povos e comunidades tradicionais: garantia de território, consulta prévia sempre que alguma ação administrativa ou legislativa afetar diretamente suas terras, o fim da violência contra esses grupos e acesso a políticas públicas, como saúde e educação.

A PEC foi fruto da articulação de diferentes povos tradicionais durante o primeiro semestre de 2015 em parceria com os parlamentares. “É um grande avanço incluir a consulta prévia aos povos e comunidades. Precisamos não apenas consultar formalmente, mas ouvir e refletir o que pensam essas culturas. Essa PEC é um pontapé inicial”, destaca o deputado estadual Flavio Serafini.

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