No Dia Internacional da Mulher Negra, comunidade quilombola recebe mesa de debate
Em 2009, as mulheres negras respondiam por cerca de um quarto da população brasileira. Eram quase 50 milhões de mulheres em uma população total que, naquele ano, alcançou 191,7 milhões de brasileiros, segundo dados do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) divulgados no documento “Dossiê Mulheres Negras”. E onde estão essas mulheres negras? Nas salas de Universidades? Nas atividades mais bem remuneradas do mercado de trabalho? Não!
Além de ser a maioria entre as brasileiras, a mulher negra é, também, maioria nos serviços menos remunerados, menos qualificados. É o grupo com maior número de analfabetos e o que mais sofre com violência doméstica. De acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia), o número de mulheres negras analfabetas é quase o dobro se comparado com o de mulheres que se declararam brancas e pardas, segundo dados de 2014.
Essa realidade, que manifesta resquícios do período de escravidão, vem se transformando única e exclusivamente por conta da organização das mulheres negras. Ainda com inúmeras dificuldades, elas lutam para transformar a realidade, superar as desigualdades e construir uma nova cultura na sociedade, de combate à opressão de gênero e ao racismo.
Nós, mulheres negras, continuamos sofrendo com a dupla discriminação – racismo e sexismo – por sermos mulheres e por sermos negras. E não estamos nos postos de destaque da sociedade brasileira. Mesmo assim, pouco a pouco, avançamos rumo aos nossos objetivos e ocupamos os lugares que nos pertencem, ou pelo menos deveriam pertencer.
O enfrentamento a essas diversas formas de violências contra a mulher negra é cotidiano e muitas vezes invisível. E para dar visibilidade a essa luta diária, em 1992, foi instituído o Dia Internacional da Mulher Negra Latino Americana e Caribenha, comemorado a cada 25 de julho.
Mais do que comemorativa, a data é um importante marco internacional de resistência da mulher negra contra a opressão e o machismo. Para Ana Luiza Cordeiro, integrante do CMNEGRAS (Coletivo de Mulheres Negras de Mato Grosso do Sul),
assim coma discriminação e o racismo, os avanços são muito grande. “Temos avanços importantes na legislação. Leis específicas que criminalizam a discriminação e injuria racial. São coisas que precisam ser comemoradas”, explica.
No entanto, para Ana Luiza ainda faltam ações mais efetivas para a aplicação prática dessas políticas públicas. “Estamos distantes do que deveria ser feito. Mas os avanços são visíveis”, diz.
Celebrações
Em Campo Grande, em alusão a data, várias agendas foram programadas. Desde o início do mês, o Coletivo em parceria com a SPPM (Subsecretaria de Políticas Públicas para as Mulheres), tem promovido várias rodas de conversa e bate-papos sobre assuntos de interesse da mulher negra.
Já na última semana, com inicio na terça-feira (21), ocorreu a Semana da Mulher Negra Latino Americana e Caribenha, que além de debates e bate-papos, promoveu oficinas de turbantes em bairros da Capital. A ideia é fortalecer a autoestima e identidade das mulheres.
Já neste sábado (25), a partir das 10 horas, ocorrerá a Mesa de Conversação “Exercendo o Protagonismo”, na Comunidade Quilombola São João Batista, no Bairro Pioneiros.
Protagonistas desta História
A mesa é uma ação do Projeto “Protagonistas desta História” que desde 2013 tem levado oficinas às comunidades negras de Mato Grosso do Sul. O projeto é desenvolvido pelo Ibiss (Instituto Brasileiro de Inovação Pró – Sociedade Saudável do Centro Oeste), pelo Coletivo de Mulheres Negras e SEDHAST (Subsecretaria de Políticas Públicas para as Mulheres) em convênio com a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República.
De acordo com a coordenadora de projetos do Ibiss, Eliane Bittencourt, o projeto é desenvolvido desde 2013. E três comunidades participaram das oficinas: Comunidade Quilombola Furnas do Dionísio, Comunidade Quilombola Dos Pretos e Comunidade Quilombola São João Batista.
A ideia é fortalecer a identidade e o empoderamento da mulher e da juventude negra. Foram 104 horas e vários temas abordados. Segundo a cientista social, Lidiane Kasiorowski, que atuou como educadora social no projeto, a mudança no discurso dos participantes foi efetivo.
“Muita gente mora nas comunidades quilombolas e não se declara negro ou negra. Isso por conta da discriminação que sofrem, muitas vezes. A partir das oficinas, elas passaram se reafirmar como negras e a olhar diferente para a própria identidade. A proposta é tornar essas mulheres e jovens agentes multiplicadores de conhecimento sobre os direitos dessas comunidades” , conta.