Ouvidoria Agrária se compromete a apurar violência contra quilombolas do norte do Espírito Santo
A Ouvidoria Agrária Nacional irá apurar as denúncias de perseguições contra os quilombolas do norte do Estado pela Aracruz Celulose (Fibria), com o apoio de policiais militares e de órgãos como o Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal do Estado (Idaf), tendo como o centro o antigo conflito existente em relação à atividade de cata dos restos de eucalipto, inutilizável pela empresa. Assunto foi tema de reunião, nessa sexta-feira (9), na sede do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), em Vila Velha.
Os relatos foram feitos por Manoel Pedro Serafim, presidente da Associação dos Pequenos Agricultores e Produtores Rurais Vizinhos aos Empreendimentos Agrícolas Florestais e Industriais de Conceição da Barra e São Mateus, ao ouvidor agrário nacional, desembargador Gercino José da Silva Filho, que preside a Comissão de Combate à Violência no Campo, do Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA).
Além da violência praticada contra quilombolas pela vigilância armada da Aracruz, a Garra, Serafim ressaltou o histórico de violações aos direitos humanos praticados no antigo território de Sapê do Norte, marcado por prisões arbitrárias, ameaças feitas por policiais e imposição de multas indevidas, sob alegação de extração ilegal de madeira e produção irregular de carvão. Também foi tema do encontro o uso ilegal de agrotóxicos pela empresa.
Como providências ao pleito das comunidades quilombolas, o ouvidor nacional se comprometeu a agendar reuniões, em separado, da Comissão de Combate à Violência no Campo com o Idaf, Aracruz Celulose – com presença do Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES), acionista de projetos poluidores da empresa – e Secretaria de Estado de Segurança (Sesp).
Até que seja agendado o encontro com representantes do Instituto Estadual de Defesa Agropecuária e Florestal, Gercino José da Silva Filho irá oficiar o órgão, para que suspenda as notificações realizadas nas comunidades quilombolas relativas à produção de carvão. Caberá ao Idaf, ainda, esclarecer sobre o registro e licenciamento para a produção de carvão e verificar o andamento do termo de cooperação assinado entre o órgão e o Incra, para identificação das terras devolutas dentro das comunidades, de acordo com a Lei Estadual 5.623/98.
Já da Aracruz Celulose o ouvidor agrário que saber da atuação ilegal de seus vigilantes, que promovem acusações falsas de extração irregular de madeira. No caso da Sesp, das ameaças praticadas por policiais. No ano passado, relatório da Ouvidoria Geral da Segurança Pública e Defesa Social (Sesp) apontou atos de muita violência contra os quilombolas, porém, sem providências.
O documento da Ouvidoria da Sesp foi elaborado após as prisões arbitrárias de quilombolas na comunidade de São Domingos do Norte, em Conceição da Barra, pela mesma acusação de roubo de eucalipto, em operação policial realizada sem determinação judicial e nenhum auto de prisão em flagrante. Para prender pelo menos 39 pessoas da comunidade, foi disponibilizado um verdadeiro aparato de guerra, com cerca de 100 policiais de tropas especiais de choque, fortemente armados, além de cavalos e cachorros, contando ainda com apoio de milicianos da Garra.
As arbitrariedades motivaram duas ações civis públicas contra o governo capixaba pelo Ministério Público Federal no Estado (MPF/ES), uma por danos morais coletivos e outra por danos morais individuais, que requerem indenização aos presos e algemados ilegalmente pela Polícia Militar.
Os restos de eucalipto são usados pelos negros para produção de carvão, única atividade que restou às comunidades negras do antigo território do Sapê do Norte, após a chegada da Aracruz, no período da ditadura militar. Sem alternativas de subsistência, resultado dos impactos ambientais, sociais e econômicos promovidos pela transnacional, é de onde tiram alguma fonte de renda para sobreviver, em meio aos eucaliptais.
Outras demandas
Também foi tema da reunião com o ouvidor nacional o gasoduto Sul-Norte, da Petrobras, que corta as comunidades quilombolas de Divino Espírito Santo e São Jorge, em São Mateus, e São Domingos, em Conceição da Barra. A gestora da Coordenação Estadual de Comunidades Tradicionais São Mateus, Olindina Serafim Nascimento, reivindicou reunião sobre a questão, que tenha participação da Fundação Palmares.
O gasoduto engloba o projeto de demais gasodutos da estatal no Estado, como o Cacimbas-Vitória, que também gerou conflito em comunidades quilombolas após o não cumprimento de condicionantes estabelecidas para a construção do empreendimento.
Em pauta ainda a ausências de políticas públicas para as comunidades quilombolas, motivo pelo qual Olindina solicitou reunião com a Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), quilombolas e prefeituras de São Mateus e Conceição da Barra, para efetivar ações do programa Brasil Quilombola. Bem como providências em relação ao acordo de cooperação do Estado e Seppir, para a promoção do Plano de Políticas Públicas para as Comunidades Quilombolas.