Igrejinha em comunidade quilombola está no caminho dos trilhos
No meio do caminho há uma igrejinha. Como ela está bem no local onde passarão os trilhos da Transnordestina, terá que sair. Um novo templo, inclusive, já foi erguido a alguns quilômetros dali. No entanto, os moradores da localidade quilombola de Fazendinha, neste município a 350 quilômetros do Recife, defendem a permanência da Igreja de São Luiz Gonzaga. Alegam que ela é uma construção do século 18 e que, debaixo dela, há restos mortais de antepassados.
“Tem antecedente da gente aí. Os arqueólogos da USP (Universidade de São Paulo) vieram há dois meses e acharam cinco ossadas atrás da igreja e duas na frente. Aí tem escravo e gente da comunidade. Membros da família Siqueira estão enterrados aí. A gente não quer saber de igreja bonita e nova. Queremos essa”, protesta a agricultora quilombola Marinês Teixeira Veras, 36 anos, nascida e criada em Fazendinha.
Na porta do templo, cartazes reforçam o protesto. “Não destruam o patrimônio histórico da nossa comunidade. Respeitem a nossa comunidade quilombola. Essa igreja é nossa e não vamos deixar vocês apagarem nossa história. Agradecemos”, diz uma das cartolinas. Marinês diz que a comunidade está articulada para fazer um cordão de isolamento humano quando tentarem por o templo abaixo.
A agricultora acusa funcionários da Odebrecht, principal empreiteira da Ferrovia Transnordestina, de imporem a saída da igreja. “Há seis meses eles chegaram aqui dizendo que ia ter que derrubar. Vieram impondo condições. Ou a gente aceitava a igreja nova ou não tinha direito a nada. Contamos toda a história. Mas eles disseram que não tem nada a ver, que o governo estava mandando”.
Procurada pela reportagem, a empreiteira afirmou que não cabe a ela o trabalho de desapropriação. No próximo domingo (22), será inaugurada a nova igreja, ignorada pelos quilombolas, que ainda nutrem esperança. “Minhas quatro filhas foram batizadas aqui e quero casar as trigêmeas aqui também. Essa ferrovia só está vindo destruir o que é nosso”, afirma Marinês.
Ao lado da igreja está a Escola José Moura Leite, que atende 110 alunos nos três turnos. O prédio já foi desapropriado e os estudantes têm agora um novo endereço para as aulas.
O Blog de Jamildo/JC Online pediu esclarecimentos à Transnordestina Logística na tarde de segunda-feira (16), mas até as 20h30 não obteve resposta.
Salgueiro – No Sítio Riacho Formiga, desapropriação também é assunto polêmico. A agricultora Francisca de Jesus Silva diz que uma área pertencente à mãe foi desapropriada, mas até agora a família não recebeu nada em troca. “A gente só recebeu a promessa de uma indenização de R$ 1.600”, reclama.
Para o irmão de Francisca, o cabeleireiro Antônio Sebastião da Silva, 38, tão ruim quanto não receber o dinheiro é ter que viver próximo à obra. “Está com muito movimento de carro e esta poeira não tem quem aguente”, afirmou. Mesmo assim, Antônio diz apostar na Transnordestina. “Acho que o crescimento vai ser muito grande. Sou a favor dessa ferrovia”.
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