• (21) 3042-6445
  • comunica@koinonia.org.br
  • Rua Santo Amaro, 129 - RJ

Servidores do Incra acusados de montar falso quilombo’

Por Toni Rodrigues

O advogado e pecuarista José Santana Mauriz apresentou queixa na Superintendência da Polícia Federal do Piauí contra Eduardo Campos e Paulo Gustavo de Alencar, ambos servidores do Incra (Instituto de Colonização e Reforma Agrária) no Piauí, contra um vereador do município de Isaías Coelho (407 km de Teresina), além de vários moradores de localidades rurais daquele município.

Ele afirma que os servidores teriam identificado e delimitado de forma irregular comunidade remanescente de quilombo no município de Isaías Coelho, mais especificamente na localidade Sabonete. O denunciante informa que os acusados realizaram perícia denominada Relatório técnico de identificação e delimitação do território da comunidade negra remanescente de quilombo Sabonete, naquele município, concluída em 8 de abril de 2008.

Mauriz ingressou, ainda, com ação popular e pedido de liminar contra o então superintendente do Incra, padre Ladislau João da Silva, servidores Eduardo Campos Rocha e Áureo João de Sousa, além de moradores e agricultores Edmilson Rodrigues Moreira, Euilson Rodrigues Moreira, Bruna Mendes da Silva, Casimiro Pereira da Silva, Genivaldo Pereira da Silva, Francisco Damasceno, Edvaldo Mendes Araújo (que preside entidade de proteção ao patrimônio negro), Fundação Cultural Palmares, sediada em Brasília, Incra, Interpi (Instituto de Terras do Piauí), estado do Piauí e Associação Quilombola da comunidade Sabonete, sediada no município de Isaías Coelho.

O laudo pericial apresentado pelos servidores do Incra garante que a área possui 1,9 milhão de hectares e um perímetro de 25,7 mil metros, limitando-se ao norte com fazendas estaduais de Campo Grande e Data Poções, estradas municipais e terras de Maria Natal do Nascimento, Admilson Rodrigues Santana, Gilberto José de Moura, Geislane Santana e do próprio denunciante, José Santana Mauriz.

Ao sul os limites são os seguintes: fazendas estaduais Campo Grande e Data Poções, enquanto a leste limita-se com fazendas estaduais. Mauriz afirma em sua denúncia que o território quilombola descrito pelos servidores do Incra não passa de uma peça de ficção e que contaria com a participação, ao menos indireta, de Edmilson Rodrigues Moreira, Euilson Rodrigues Moreira, Bruna Mendes da Silva, Francisco Damasceno, Casimiro Pereira da Silva e Genivaldo Pereira da Silva.

A HISTÓRIA DO FALSO QUILOMBO

“Estas pessoas afirmam que a localidade Sabonete foi sede de um quilombo, sendo eles os remanescentes dos escravos que ali formaram o quilombo”, comenta Mauriz, questionando os mencionados e dizendo que eles têm procedência completamente diferente da alegada.

Segundo ele, Edmilso Rodrigues Moreira e Euilson Rodrigues Moreira são irmãos, filhos de Maria de Lourdes Sobrinho e José Moreira Sobrinho, tendo nascido no município de Campinas do Piauí, na localidade Lagoa da Chapada, local em que até hoje existe propriedade em nome da mãe deles. Seus avós maternos são Bento Rodrigues da Costa, procedente de Conceição do Canindé, e Joaquina Rodrigues da Costa, natural de Moreira, em Simplício Mendes, sendo esta filha de “Prencesa”, que era de tez branca e de olhos azuis.

Bento Rodrigues da Costa não era sequer descendente de escravo e, conforme o denunciante, passou a residir na localidade Catuaba, em Isaías Coelho, através de “Chiquim” Mauriz e Emília, bisavós do noticiante. Joaquina Rodrigues da Costa, avó materna de Edmilson, passou a residir no município em função do casamento com Bento.

ASCENDÊNCIA COMUM

Registra ainda Mauriz que “Prencesa”, bisavó de Edmilson e Euilson, é irmã de sua bisavó, sendo que possuem ascendentes comuns. José Moreira Sobrinho, pai de Edmilson, é filho de Paula, morena clara de cabelo liso e que procede de Itainópolis. Paula mudou-se para Isaías Coelho já no século XX, na década de 1930, na localidade Lagoa da Chapada.

“Isso torna fácil concluir que Edmilson e Euilson não são descendentes e escravos e mesmo que tenham sido o suposto ‘quilombo’ de onde eles vieram nunca foi a localidade Lagoa da Chapada, também conhecida como Lagoa do Barro e Barrocão”, hoje chamada por eles de “Sabonete”.

A localidade se encontra titulada no registro de imóveis desde 1983 em nome de Maria de Lourdes Sobrinho, mãe dos citados, por doação do estado do Piauí. “Também não é sede de quilombo a localidade Catuaba, a mim pertencente, mas apenas eles são descendentes de Bento e Joaquina, cujo imóvel deixado pelo casal, também denominado Catuaba, se encontra hoje sob a administração de (???) Agnaldo.”

OUTROS INDÍCIOS DA FALSIDADE

Mauriz prossegue dizendo que Bruna Mendes da Silva é filha de Maura Mendes da Silva e ambas residem na localidade Catuaba. Quanto a Francisco Damasceno, conhecido como “Du”, é procedente da localidade Umburanas, conhecida como Pedra Miúda e Poções, em Isaías Coelho, tendo chegado à localidade Lagoa da Extrema, a que hoje atribui nome de Sabonete, em função do casamento com Francisca Mendes Damasceno.

“Nem Bruna nem Francisco Damasceno descendem de escravos. E mesmo que descendam, o suposto ‘quilombo’ de onde eles vêm nunca foi a localidade Lagoa da Extrema.”

Casimiro Pereira da Silva e Genivaldo Pereira da Silva são pai e filho, respectivamente, e procedem da localidade Umburana, e chegaram à localidade Lagoa do Barro, a que atribuem o nome de Sabonete, por compra da posse do local ao antigo proprietário, Antonio Ferreira de Sousa, conhecido “Antonio de Alexandre”, “o que se deu em época não muito distante.”

EMPRESÁRIO E SINDICALISTA

“Existe, na verdade, um ‘conluio associativo’ entre estas pessoas, que deseja fazer acreditar que sejam reconhecidos como remanescentes da comunidade de um quilombo. Além disso, Edmilson Rodrigues Moreira, que hoje se apresenta como presidente da Associação Quilombola da localidade Sabonete, residia no estado de São Paulo, sendo que de setembro de 1985 a abril de 1986 esteve empregado junto ao Bradesco S/A e de setembro de 1987 a maio de 1994 trabalhou junto à empresa Tekla Industrial Ltda. De maio de 1994 a janeiro de 2000 ele exerceu atividade de comércio naquele estado, como titular de estabelecimento sitaudo à Vila Arapuã (SP), com filial em São Caetano do Sul.”

Mauriz indigna-se com a situação. Ele afirma que além de empresário em São Paulo, Edmilson Rodrigues Moreira é também vinculado ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Isaías Coelho, onde ocupa cargo na diretoria. Quanto a Euilson, afirma que é empresário e comerciante na cidade de Isaías Coelho, conforme certidão da Junta Comercial, além de ser vereador no município eleito pelo PTB (Partido Trabalhista Brasileiro) em 3 de outubro de 2008 para período de 2009 a 2012.

O CASO DO RECÔNCAVO BAIANO

O denunciante lembra de reportagem veiculada pelo programa “Fantástico”, da Rede Globo de Televisão, no qual se noticia fraudes na região do Recôncavo Baiano destinadas a reconhecer oficialmente como remanescente de quilombo áreas que na verdade não teriam esta procedência. “Na localidade Sabonete, em Isaías Coelho, não existe comunidade remanescente de quilombo. Isso pode ser visto nos próprios depoimentos colhidos pelos servidores do Incra para fins de produzir a equivocada perícia.”

O servidor do Incra Eduardo Campos Rocha é acusado de tentar induzir depoente a uma resposta no sentido de confirmar a existência, em outros tempos, de quilombo. Cita os casos dos moradores Antonio José de Moura e sua mulher, dona Nair, que teriam sido induzidos pelo servidor a dizer que na localidade havia “samba de tocar lata, candomblé e capoeira.”

MORADORES DESCONHECEM CULTURA QUILOMBOLA

A entrevistada respondeu que não existiu, por ali, esse tipo de coisa, nem em Sabonete e Lagoa da Extrema, e muito menos em Catuaba. Iracema Maria da Anunciação, ao ser entrevistada, nega que haja diferenças culturais entre modo de viver de seus familiares, informando que seu pai “Zé Vaqueiro” trabalhou para “Chiquinho”.

Já Maria de Lourdes Sobrinho, mãe de Edmilson Rodrigues Moreira, afirma que seu pai é procedente de Conceição do Canindé, enquanto sua mãe é procedente de Moreira, localidade de Simplício Mendes, enquanto Albino França, conhecido por “Noca”, afirma que “Eduardo (servidor do Incra) insiste em dizer que havia terreiro na localidade Sabonete.

“Noca diz ainda que a localidade Catuaba será incluída no projeto do Quilombo ‘de qualquer jeito’, no entanto acentua que ali nunca houve esse tipo de cultura negra.”

Sabino Mendes da Silva, o “Sabinão”, e Benedito Rodrigues da Silva, ambos entrevistados pelos servidores do Incra, informam que a localidade Catuaba foi anteriormente ocupada por Chiquinho Mauriz, Orlando e Benedito Mauriz.

DEFINIÇÃO DE TERRITÓRIO IMAGINÁRIO

O denunciante afirma que a área do suposto quilombo foi definida de forma imaginária sem a colocação de piques. “Os trabalhos foram realizados de forma clandestina. Eles sequer sabem por onde passa o citado perímetro. No meu ponto de vista, estas pessoas estão praticando um crime, que pode ser facilmente percebido na produção de falsa perícia com objetivo único de identificar falsamente a existência de uma comunidade negra que nunca existiu na citada área.”

Eduardo Campos Rocha é acusado de parcialidade na definição do processo por ter interesse pessoal na questão.

< O Observatório Quilombola publica todas as informações que recebe, sem descartar ou privilegiar nenhuma fonte, e as reproduz na íntegra, não se responsabilizando pelo seu conteúdo.>

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Pular para o conteúdo