Remédios caseiros produzidos por quilombolas em exposição na V Ferapi
Quilombolas do Piauí fabricam remédios caseiros
Os moradores de comunidades quilombolas e assentamentos rurais no Piauí extraem substâncias na própria natureza para ampliar a renda e reduzir os gastos com remédios de farmácias. Eles aprenderam que, aproveitando o potencial de árvores e ervas da mata, é possível fabricar medicamentos caseiros que ajudam a curar diversos tipos de doenças como inflamações, gripe, bronquite e asma. A experiência está sendo mostrada na Feira Piauiense de Produtos da Reforma Agrária e Comunidades Quilombolas (Ferapi), no centro de Teresina.
Sem estudos e perspectivas, a solução foi valorizar as crenças e saberes de cada um dos moradores das comunidades quilombolas. Aliado a cursos de capacitação, a receita do remédio caseiro estava pronta para garantir o sustento de várias famílias. “Não sou uma pessoa estudada, que teve acesso à escola e à educação. A nossa saída era trabalhar com roça mesmo, com plantação de arroz e feijão, para não passar fome”, diz Alexandrina Maria da Conceição, que produz remédios de ervas no Assentamento Lisboa, no município de São João do Piauí.
Ela afirmou que as condições de vida da família começaram a mudar há três anos, depois de um curso de capacitação realizado pelo Emater com os moradores da comunidade. Com isso, foram incentivados a apostar na produção de medicamentos homeopáticos. “Eles nos mostraram que era possível a gente fabricar remédios caseiros, de uma maneira barata e simples. Aprendemos a lição direitinho e hoje já fabricamos os remédios para usar e vender. Com o que eu consigo vender, estou conseguindo sustentar meus netos”, explica Alexandrina.
A mesma opinião é compartilhada pela trabalhadora rural Marlene Assis, moradora da comunidade quilombola Sumidoro, no município de Queimada Nova, no semi-árido piauiense. Ela, que também aprendeu a fabricar remédios caseiros, explica que o processo é simples, mas precisa ser feito com todo cuidado. “Fazemos os remédios com grande responsabilidade. Temos todo o cuidado para colocar as medidas certas de todas as substâncias”, ressalta.
Marlene acrescentou que as vantagens dos remédios caseiros já são de conhecimento de muitas pessoas. “Quando agente adoece, as pessoas já têm a sabedoria de indicar remédios caseiros. Eles dão mais resultados do que os fabricados nas indústrias farmacêuticas. Eu mesma já tive muitos problemas respiratórios e nos ossos. Isso melhorou depois que usei os remédios caseiros”, disse.
A fabricação do produto ocorre nas próprias comunidades. Os moradores fazem a junção de várias ervas e cascas de árvores para curar doenças como diarréia, reumatismo, problemas inflamatórios e outros. As ervas são encontradas na mata e são de fácil acesso e a receita é muito simples. “Agente faz o Elixir de Imburana, que cura a dor de cabeça, diarréia, febre e vômito. Fazemos também o xarope de mel com hortelã, que é bom pra quem está com gripe, bronquite e asma”, diz Alexandrina.
As comunidades rurais onde os remédios caseiros são fabricados estão em vários municípios do Estado, como Paulistana, São João do Piauí, Acauã, Pedro II, Barras, Batalha e outros. Em algumas comunidades delas, a produção dos remédios é apenas para consumo próprio, já que na maioria delas, para adquirir remédios, os moradores precisam se deslocar até a cidade, que fica muito distante.
Evaneide Brito, extensionista social da Emater, explica que a idéia para a realização dos cursos foi feita com base no diagnóstico e no plano de desenvolvimento de cada uma das comunidades. “Agente percebeu que as comunidades tinham muito potencial para produzir os medicamentos. E que a maioria dos produtos necessários podem ser encontrados na própria comunidade”, acrescentou.
Para a produção dos remédios são utilizadas várias ervas, como extrato de hortelã, folha de vick, melaço, aroeira, angico, imburana, unha de gato, canjaíba. A solução aparece para várias doenças como inflamações, pequenas dores e doenças respiratórias. Por mais que a medicina evolua, as pessoas ainda acreditam nos remédios naturais para a solução de alguns incômodos na vida. “Em alguns casos, eu prefiro comprar remédios caseiros. São mais baratos e mais saudáveis e, muitas vezes, mais eficazes. Alguns médicos recomendam esses remédios, porque já sabem que os resultados deles já são comprovados na prática”, analisa Conceição de Maria, que vende remédios caseiros na Ferapi.
Produção é vendida em Recife e São Paulo
A história do Grupo de Mulheres Quilombolas do Sumidoro, na região do semi-árido do Piauí, começou a mudar com o curso de fabricação de remédios caseiros. Elas vislumbraram na fabricação de remédios uma alternativa para as famílias conseguirem recursos para ajudar no desenvolvimento da comunidade que é muito carente de recursos e de oportunidades de emprego. A produção dos remédios deu tão certo que elas já exportam parte dos produtos para os estados de Recife, São Paulo e para todo o Piauí.
A iniciativa vem funcionando. Apesar da produção não ser regular, o valor obtido com a venda dos remédios traz resultados satisfatórios. Há três anos, oito mulheres resolveram se dedicar para aprender a fazer remédios caseiros e destinar os recursos para ampliar projetos desenvolvidos na comunidade.
“O dinheiro, apesar de ser pouco, nós utilizamos para custeio de algumas despesas, como viagens para participação em feiras e exposições de produtos quilombolas na Ferapi. A gente usamos também para participar de cursos que nos dêem alguma orientação sobre como podemos melhorar a nossa renda”, explica Marlene Assis. No grupo, todas as oito mulheres se dividem para executar as tarefas na linha de produção dos remédios caseiros.
“A gente coloca a mão na massa mesmo, ou melhor, nas ervas”, brinca Marlene. “A gente não tem um local para ser sede do Grupo. Então, a alternativa que a gente encontrou foi deixar os remédios guardados na casa da minha mãe, na cidade. As pessoas em Queimada Nova já conhecem a qualidade e os resultados dos remédios que já fazem encomendas e procuram a gente para comprar”, comemora.
Noni: promessa de cura para vários males
Noni é o nome comum de Morinda Citrifolia, uma planta tropical que já foi encontrada em vários países, como China, Índia e Polinésia. Descoberto há mais de 2000 anos, o suco da planta vem trazendo resultados impressionantes para vários problemas de saúde. No Piauí a erva já despertou o interesse das famílias que fazem remédios caseiros.
A moradora do assentamento Vale da Esperança, em Teresina, Geroni Reis, relata que teve a oportunidade de conhecer a planta em 2007 em uma edição da Feira Piauiense de Produtos da Reforma Agrária e Comunidades Quilombolas (Ferapi). A curiosidade para conhecer os milagres da planta fez com que ela adquirisse as sementes de Noni e plantasse numa área de seu assentamento.
Já Dona Anunciação Ferreira conheceu o Noni através de um amigo. “O suco do Noni é um remédio preciosíssimo”, garante. “Ele é bom até para amenizar problemas com TPM e também para aqueles homens que têm problemas com desempenho sexual”, brinca.
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