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Incra dificulta processo de titulação dos territórios quilombolas e sucumbe às pressões do Agronegócio

Hoje o Instituto Nacional de Colonização de Reforma Agrária (INCRA), assim como o Governo Federal, sucumbiram às pressões e interesses do agronegócio, da bancada ruralista, das empresas transnacionais, modificando as normas para titulação dos territórios de remanescentes de quilombos. A Instrução Normativa n° 49, que substitui a de número 20, injustificavelmente dificulta o já penoso processo de titulação dos territórios quilombolas, o qual, por sua vez, dá cumprimento ao direito humano constitucional de que trata o art. 68 do ADCT.

A Instrução Normativa que regulamenta o procedimento de titulação já foi modificada em 2005, quando foi publicada IN n° 20. As dificuldades atualmente encontradas nos procedimentos de titulação não se referem às deficiências de normatização, mas, principalmente, à falta de estrutura adequada dos órgãos competentes. É fato notório que a maioria das superintendências do INCRA até hoje não dispõem de pessoal capacitado para promover o procedimento de titulação e a elaboração de Relatórios Técnicos. Na maioria dos casos a própria autarquia comete erros que levam constantemente à necessidade de refazer atos administrativos do procedimento de titulação.  Sobre esta questão, ressalte-se que as iniciativas do Governo Federal têm sido extremamente tímidas e incapazes de atender à demanda de titulação. Durante o Governo Lula apenas 8 comunidades, de um universo de três mil, foram tituladas.

O Poder Judiciário tem confirmado a constitucionalidade do Decreto 4.887, assim como vinha fazendo com relação à Instrução Normativa n° 20 e como vem fazendo com aplicabilidade da Convenção 169 da OIT às comunidades quilombolas. A mudança da instrução normativa em nada contribuirá com o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade proposta pelo DEM contra o Decreto Presidencial 4887/03 que determina a realização da titulação pelo INCRA, como justificou a AGU.

A norma publicada hoje no Diário Oficial teve sua modificação realizada através de um conturbado e não democrático processo conduzido pela Advocacia Geral da União. A AGU, sob as alegações de que fazia cumprir a convenção 169 da OIT, realizou uma pseudo consulta pública para outorgar suas deliberações pré-constituídas perante o movimento quilombola. Na pseudo consulta a AGU, assim como o Governo Federal, não cederam em qualquer ponto relevante de seus entendimentos, assim como não deram tempo e nem condições materiais para que o movimento quilombola pudesse refletir sobre o documento que se pretendia debater. A grande parte das propostas do Governo foi rejeitada pelo movimento quilombola

Agora as comunidades quilombolas não têm mais respeitado o seu direito de auto-identificação, conforme preconiza a Convenção 169 da OIT e o Decreto 4887/03. Até para requerer a abertura do processo de titulação de seu território precisam que a Fundação Cultural Palmares lhes diga se são ou não remanescentes de quilombos.

A mudança no procedimento administrativo do INCRA chegou mesmo a violar a liberdade de profissão do antropólogo, quando a este pré-dermina a elaboração de um relatório antropológico demasiada e injustificadamente complexo e burocrático. A Associação Brasileira de Antropologia também já havia se manifestado tecnicamente contra a publicação da nova norma pelo INCRA.

A publicação do novo procedimento administrativo vem consolidar um entendimento que já está explicito na forma com que o Governo Federal, assim como o INCRA, vem tratando a questão da regularização fundiária de territórios tradicionais, em especial os das comunidades remanescentes de quilombo. Muitos recursos, atenção e dedicação ao agronegócio, ao agrocombustível, à monocultural que concentra renda e gera desigualdade social. Para os povos tradicionais do Brasil algumas migalhas, nenhuma terra, ou no máximo a que sobrar, recursos públicos inacessíveis e a sorte de continuar a sobreviver como estão acostumados: às custas de suor, sangue e lágrimas.

INFORME-SE:

Governo refaz Instrução Normativa sobre território quilombola

Para a organização de direitos humanos Terra de Direitos, o texto da Instrução Normativa veio para burocratizar ainda mais o processo de titulação de territórios quilombolas.

Em tempos de questionamento e revisão da Instrução Normativa sobre a titulação de territórios quilombolas, vale a pena procurar pelos arquivos alguns dados que façam reviver a longa trajetória pela titulação de terras quilombolas no Brasil. 

Não precisa ir muito longe. Basta voltar para abril deste ano, nos dias 15 e 17, quando uma consulta pública foi realizada em Luziânia (GO) pela Advocacia Geral da União para analisar as mudanças governamentais na IN 20 do INCRA. A proposta de alteração passou rapidamente pelos olhos de alguns representantes quilombolas durante a consulta, que não tiveram suas principais propostas acatadas pelo governo.

Apenas uma pergunta fica no ar: está o governo buscando aperfeiçoar a garantia dos direitos dos quilombolas ou reforçar os interesses dos grupos econômicos e de alguns parlamentares e suas bancadas conservadoras?

Consulta pública demonstrou a má-fé do governo

A consulta foi realizada em apenas três dias, sem que o texto fosse anteriormente disponibilizado às comunidades, não permitindo aos quilombolas a possibilidade de analisar a proposta de mudança feita através da Instrução Normativa. Além disso, as proposições das comunidades quilombolas não tiveram caráter deliberativo. Os próprios quilombolas rechaçaram praticamente todas as alterações feitas pelo governo e as contra propostas apresentadas, via de regra, não foram aceitas pelo Governo Federal.

A convenção 169 da OIT garante que as consultas públicas “realizadas na aplicação desta Convenção deverão ser efetuadas com boa fé e de maneira apropriada às circunstâncias, com o objetivo de se chegar a um acordo e conseguir o consentimento acerca das medidas propostas”.

Diante da plenária os representantes do Estado diziam que as mudanças propostas iriam agilizar o andamento dos processos e facilitar a titulação dos territórios. Por outro lado pode-se verificar que as mudanças burocratizam o processo administrativo e servem apenas àqueles que se opõe à titulação dos territórios quilombolas.      

Acompanhe quais foram as propostas dos quilombolas pelo site www.terradedireitos.org.br.

Falta de consenso marca a atuação do Legislativo e do Judiciário

O direito das comunidades quilombolas à titulação de suas terras é assegurado pelo artigo 68 do ADCT da Constituição Federal, a norma garantidora de direitos fundamentais, portanto com aplicação imediata. O conteúdo normativo é por si suficiente, havendo apenas a necessidade de regulamentação para uma atuação administrativa adequada. Daí surge a necessidade do decreto presidencial, uma vez que estão suficientemente indicados no plano normativo: o objeto de direito (a propriedade definitiva das comunidades dos quilombos), seu sujeito ou beneficiário (os remanescentes das comunidades dos quilombos), a condição (a ocupação tradicional das terras), o dever correlato (reconhecimento da propriedade e emissão dos títulos respectivos) e o sujeito passivo ou devedor (o Estado, Poder Público). 

No entanto os setores conservadores se mobilizam para tornar a regularização um procedimento o mais burocrático possível. O decreto, por exemplo, é tema de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade de autoria do Partido da Frente Liberal (PFL), atual Democratas (DEM), no STF. A Adin foi proposta em 2004 e ainda não foi julgada.

Na Câmara dos Deputados, o deputado Valdir Colatto (PMDB-SC) é o autor do Projeto de Decreto Legislativo 44/2007, que suspenderia a aplicação do Decreto 4.887 e todos os atos administrativos decorrentes. O projeto foi rejeitado pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias e aprovado, com modificações, na Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural.

Já no poder judiciário as decisões têm sido muito favoráveis a legislação que trata da regularização do território quilombola, incluindo a Instrução Normativa n° 20, que acaba de ser revogada. A Desembargadora Federal Maria Lúcia Luz proferiu voto, acolhido à unanimidade pela 3ª turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, reconhecendo a aplicabilidade imediata do art. 68 do ADCT, seu caráter de norma garantidora de direito fundamental, a constitucionalidade do decreto 4887/2003 e da IN n° 20 do INCRA. Salientou ainda que caso o decreto 4887/03 fosse declarado inconstitucional, ou mesmo se a IN n° 20 deixasse de ser aplicada, o estado brasileiro poderia sofrer sanções internacionais por descumprimento de tratados internacionais que garantem direitos às comunidades quilombolas.

Terra de Direitos

Assessoria de Comunicação Social

Laura Bregenski Schühli

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