Nova edição do Informativo Territórios Negros já está no ar
– A seção Fala quilombola traz a carta convocatória da Coordenação Nacional de articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) para a manifestação Globo, a gente não se vê por aqui!, marcada para o dia 5 de outubro.
– A comunidade de Linharinho, no Espírito Santo, é enfocada na seção Um território.
– Santos negros: exemplos de fé e de incentivo à luta é o artigo de Ana Gualberto para a coluna Um pouco de história.
Leia o editorial na íntegra
O primeiro semestre de 2007 registra, finalmente, uma clara e articulada mobilização de parte da imprensa contra os avanços do movimento quilombola. Desde o final de 2003, diversas matérias críticas às conquistas das comunidades quilombolas vêm sendo publicadas na imprensa. Algo normal em uma democracia e que merece resposta por parte do próprio movimento quilombola e das comunidades citadas em cada caso, até mesmo para que o debate público possa educar o senso comum sobre o tema.
Em maio deste ano, porém, tais matérias ganharam um caráter sistemático. Ao longo de poucas semanas, registramos a produção e difusão de uma série de reportagens que ocuparam espaços nobres de jornais impressos, assim como o horário nobre do maior telejornal do país (e de ao menos uma de suas afiliadas regionais). Em todas elas, o caráter parcial e estrategicamente desinformado das matérias era evidente. Já não há qualquer preocupação com o velho lema da imparcialidade jornalística. O foco são os processos de regularização fundiária movidos pelo Incra e, a maior arma, a deliberada confusão entre o conceito histórico de quilombo e o conceito legal de remanescentes de quilombos.
Matérias que pretendem não documentar situações ou levantar suspeitas, mas “denunciar fraudes”, selecionando depoimentos e situações que fazem as comunidades quilombolas parecerem pura ficção. O objetivo é assustar a opinião pública e, finalmente, capturá-la em um discurso hostil às conquistas dos movimentos sociais (veja a seção Fala Quilombola desta edição). Ironicamente, nessas matérias, pequenas comunidades negras pobres, por vezes miseráveis, são transformadas em algozes de latifundiários, de empresas multinacionais (responsáveis por décadas de destruição da Mata Atlântica), da Igreja Católica (maior proprietária de terras do país) e da própria Marinha de Guerra do Brasil. Admirável façanha retórica.
A democracia precisa de uma imprensa livre, mas também de uma imprensa respeitosa, que não se transforme em folhetim barato e sensacionalista toda vez que isso interessa aos seus proprietários. Os atuais ataques à luta quilombola, sob o disfarce de “denúncias” que transformam um ponto de vista no único ponto de vista possível, lembram o que já aconteceu e continua acontecendo com as lutas indígena e dos Sem-Terra.
Não é à toa que no mesmo período tenham surgido propostas legislativas contra a regularização fundiária quilombola, tenha sido lançado um Movimento dos Com Terra no Sul do país e, cada vez mais, o tema seja pensado como assunto do Gabinete de Segurança Institucional, que substituiu, mantendo a mesma ideologia, o nada saudoso Conselho de Segurança Nacional, dos tempos da ditadura militar. Trata-se da reação das classes proprietárias ao crescimento real do movimento e à simples ameaça de avanço dos processos de regularização fundiária quilombola. Estão se antecipando, porque não querem perder nem os anéis.
José Mauricio Arruti