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Matéria sobre KOINONIA na Revista do Terceiro Setor

Apoio à sociedade e ao seu lugar

Como resposta às desigualdades que a população negra enfrenta no Brasil, em 1995 foi criado o Programa Egbé, pela ONG carioca Koinonia. Egbé vem do iorubá e significa “sociedade e o lugar onde ela se reproduz”. O programa trabalha com comunidades negras tradicionalmente estabelecidas nos chamados territórios negros.
Quem conta essa história é o atual coordenador do programa, Rafael Soares de Oliveira. “No começo, o programa volta-se mais para os terreiros de candomblé de Salvador [BA]. Nosso objetivo era assistir e assessorar essas comunidades na área de regularização fundiária, recuperação etnobotânica e diálogo inter-religioso”, conta.

Com o crescimento da temática quilombola e as semelhanças das experiências territoriais das suas comunidades, a entidade ampliou o escopo do programa original. Para essas pessoas, a posse da terra é um fator fundamental para sua sobrevivência, reprodução e melhoria da qualidade de vida. “Os territórios de candomblé ainda têm um caráter simbólico de valorização da religião de origem africana na sociedade”, acrescenta o coordenador.

Calcula-se que cerca de três mil terreiros funcionem na capital baiana e em seu entorno, representando uma ocupação especifica do solo urbano. Outras características do espaço são o tipo de organização, a ajuda mútua entre os membros e, principalmente, a proteção ambiental, tendo em vista que a natureza é decisiva para o pensamento religioso do candomblé e para seus ritos. Os principais desafios enfrentados são o ataque da especulação imobiliária e o preconceito religioso, especialmente das novas igrejas evangélicas.

Os problemas enfrentados pelos quilombos, além das “tremendas dificuldades para manter a terra onde vivem e trabalham”, como relata Rafael Soares, estão ligados à extrema pobreza e a deficiências em educação, saúde, habitação e saneamento. O coordenador do Egbé lamenta a falta de organização interna para “buscar a concretização em seu favor e trabalhar no sentido de melhorar suas vidas”.

Atualmente, na capital baiana, o Egbé atende cerca de 150 territórios de candomblé. Nesses mais de dez anos de trabalho, foram elaborados laudos antropológicos e etnoecológicos que documentam a localização, a delimitação do território, a história, a botânica e os fármacos de cada terreiro. “Esses conhecimentos são essenciais para a luta pelo direito aos territórios”, completa Rafael Soares.

No Rio de Janeiro

As atividades em solo fluminense começaram cinco anos depois, com pesquisas e visitas às comunidades negras rurais quilombolas. O programa se dedicou a fomentar uma rede regional para esclarecimentos e apoio a essas comunidades, buscando também a regularização fundiária e os direitos culturais dispostos na Constituição de 1988, artigos 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e 215 e 216, sobre direitos culturais.

“Concentramos nossos esforços em promover iniciativas que permitissem a manutenção dos territórios em seus aspectos econômicos, sociais, culturais e ambientais. Mas sempre tendo em mente as concepções e prioridades dessas populações”, relembra Rafael.

A organização tem desenvolvido projetos pontuais no estado do Rio, com comunidades na Ilha de Marambaia (Mangaratiba), em Preto Forro (Cabo Frio), e no Alto da Serra (Rio Claro), além do Balcão de Direitos, em parceria com a Secretaria Especial de Direitos Humanos. No projeto Etnodesenvolvimento Quilombola, em convênio com o Ministério do Desenvolvimento Agrário, o objetivo foi consolidar e fortalecer as comunidades quilombolas envolvidas, capacitando-as para a autogestão e para o desenvolvimento social, ambiental e culturalmente sustentável.

Nova face

Em 2007, a entidade inicia um novo projeto, Capacitação e Apoio ao Desenvolvimento de Comunidades Negras Tradicionais no Brasil, contando com o apoio da União Européia. A iniciativa, que será desenvolvida no contexto do Programa Egbé, atenderá, em um primeiro momento, 15 terreiros de candomblé em Salvador e mais quatro comunidades negras litorâneas em Itacaré, Cairu e Nilo Peçanha.

Por três anos, serão promovidas ações nas linhas de capacitação comunitária para líderes e agentes de desenvolvimento local, defesa dos direitos humanos, articulação, sensibilização e advocacy. Mais de duas mil pessoas serão beneficiadas diretamente, entre elas mais de mil mulheres. Indiretamente, a entidade pretende alcançar cerca de 17.500 pessoas.

Segundo o coordenador do programa, a capacitação visa “dotar essas pessoas de informação e conhecimentos necessários para seu fortalecimento e para a defesa de seus direitos”. Rafael ainda destaca o resgate da auto-estima com a valorização de seus conhecimentos durante as capacitações.

Na área de direitos humanos, foram incluídas atividades de caráter mais técnico, como as assessorias jurídicas e os estudos. “Essas assessorias técnicas vão estimular e apoiar iniciativas comunitárias voltadas para solução de problemas, sobretudo territoriais e laborais, das comunidades negras”, explica.

Por fim, as ações voltadas para estratégias de articulação, sensibilização e advocacy junto à sociedade civil e ao Estado brasileiro, “além dos fóruns internacionais em defesa das comunidades negras tradicionais”, como destaca o coordenador. De forma geral, esta linha de ação vai estimular o protagonismo social, econômico e cultural das comunidades, dando visibilidade e legitimando o seu papel social.

Para o futuro, a esperança de dar continuidade a todos esse projetos. “O nosso papel é ampliar a capacitação e o reforço das práticas histórico-culturais de reprodução dessas comunidades. Queremos colaborar para uma boa interpretação do papel dessas comunidades num projeto de desenvolvimento democrático, sustentável e com a consolidação dos direitos humanos”, conclui Rafael.

Mariana Hansen

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