22 de setembro de 2006
Aracruz e governo discutirão a titulação de Linharinho
Presidência da República manda grupo ao ES para discutir terra quilombola
Ubervalter Coimbra
Representantes da Presidência da República, do Senado Federal, da Câmara dos Deputados, dos Ministérios da Defesa, da Justiça, do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) discutirão com a Aracruz Celulose S.A. a titulação de Linharinho, em Conceição da Barra, norte do Estado, como território quilombola. Só no dia seguinte, o grupo do governo se reunirá com os quilombolas.
A informação sobre a reunião do grupo do governo federal foi divulgada pelo coordenador do Fórum Estadual de Entidades Negras, Isaías Santana.
Um dos ofícios sobre o assunto é da Presidência da República por seu Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e datado do dia 18 deste mês. Dá ciência que nos dias 25 a 27 de setembro próximos, representantes dos membros do Conselho de Defesa Nacional (CDN) e integrantes deste Gabinete, na condição de Secretaria – Executiva do CDN, estarão na cidade de Vitória e Conceição da Barra – ES, visando a realizar estudo de campo sobre a delimitação do território da Comunidade Linharinho, haja vista a necessidade de opinar no referido caso, em razão do disposto no artigo 8º do Decreto nº 4.8887/2003.
Em um outro documento a que Isaías Santana teve acesso é informado que o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República comunicava que o grupo do governo federal se reunirá na próxima segunda-feira (25), às 14h, no prédio no auditório do Ministério da Fazenda com a Aracruz Celulose, em razão da necessidade institucional de se manifestar a respeito do Laudo Técnico de Reconhecimento da Comunidade de Linharinho.
À Superintendência do Instituto Nacional de Reforma Agrária (Incra) no Espírito Santo, que está convocada para a reunião, cabe garantir a participação no encontro do assegurador do Programa Quilombola, o servidor Marco Antônio Villas Boas Aguiar, e dos responsáveis técnicos e jurídicos que elaboraram o respectivo Laudo de Reconhecimento, para subsidiar os responsáveis pela reunião, esclarecendo os mesmos a respeito do assunto, inclusive, a Aracruz Celulose S.A..
Na comunicação institucional do governo federal é informado ainda que na terça-feira (26) haverá uma reunião idêntica no município e Comarca de Conceição da Barra com a comunidade Linharinho, sendo que o deslocamento far-se-á ao término da reunião do dia 25/09/2006, ou seja, aquela que se realizará no prédio do Ministério da Fazenda, nesta Capital. O documento é datado de 19 deste mês.
Linharinho faz parte do território quilombola de Sapê do Norte, constituído por Conceição da Barra e São Mateus, como comprovaram pesquisas científicas realizadas sob a coordenação de especialistas da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).
O território, contudo, foi tomado dos quilombolas, à força ou comprado a preços vis após falsas promessas de emprego e boa vida aos negros, principalmente pela Aracruz Celulose S.A. A empresa foi criada e ocupou o território dos descendentes dos escravos negros há quatro décadas, durante a ditadura militar.
A Aracruz Celulose e os outros ocupantes foram citados no edital publicado pelo Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra), no Diário Oficial da União. O edital dá ciência das conclusões da pesquisa que conclui que a área é dos descendentes dos escravos negros. A empresa contestou o laudo.
Das empresas que ocuparam os territórios quilombolas, a mais voraz e agressiva foi a Aracruz Celulose, com seus plantios de eucalipto. Também ocupam as áreas dos negros a Destilaria Itaúnas S/A (Disa) e a Alcon (usina de álcool de propriedade de Nerzy Dalla Bernardina), com plantios de cana-de-açúcar.
Igualmente ocupam territórios quilombolas a Suzano e a Bahia Sul, com plantios de eucalipto, e a Agropecuária Aliança Ltda (APAL), entre outros grandes grupos ou pessoas físicas com poderio político e econômico.
A Aracruz Celulose é citada como detentora de títulos incidentes no referido território, juntamente com os outros oito ocupantes. Há, ainda, ocupantes de mera posse, igualmente citados. Além dos que conseguiram títulos do território quilombola, a área ainda tem 41 famílias de remanescente de quilombo, que conseguiram resistir à ocupação das terras pela Aracruz Celulose e outros.
Diz o Incra que os estudos sócioeconômicos, culturais, antropológicos, fundiários, cartográficos e ambientais fazem parte do Relatório Técnico de Identificação que consta no processo. O relatório e o parecer da Comissão constituída para realizar esses estudos definem que as terras identificadas no referido processo administrativo, com área de 9.542,57 hectares, são consideradas como território da Comunidade Quilombola de Linharinho.
O trabalho de identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes de quilombos é obrigatório e deve ser realizado por determinação do artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias; do Decreto n. 4887 de 20/11/2003; e da Instrução Normativa n. 16/2004. O cumprimento da legislação cabe ao Incra.
Descendentes de escravos têm direito a 50 mil hectares no ES
As pesquisas realizadas sob a coordenação da Ufes apontam que os negros foram forçados a abandonar suas terras. Em Sapê do Norte existiam centenas de comunidades na década de 70, e hoje restam 37. Ainda na década de 70, pelo menos 12 mil famílias de quilombolas habitavam o norte do Estado: atualmente resistem entre os eucaliptais, canaviais e pastos, cerca de 1,2 mil famílias. Em todo o Espírito Santo existem 100 comunidades quilombolas.
Além de confirmar a partir de fatos históricos e antropológicos que Linharinho é território quilombola, as pesquisas apontam como igualmente quilombola a área de São Jorge (13 mil hectares do território), onde resistem em minúsculas propriedades apenas 80 famílias.
Em São Domingos/Córrego de Santana, restam apenas 113 famílias em pequenas propriedades, mas o território quilombola é de 12.596 hectares; e ainda em Sapê do Norte, em São Cristovão/Serraria, o território quilombola é de 8.500 hectares. Lá resistem em suas pequenas áreas 52 famílias de descendentes de escravos.
O projeto Territórios Quilombolas no Espírito Santo também pesquisou e confirmou ser território quilombola 500 hectares de São Pedro, em Ibiraçu, onde vivem 24 famílias. E, 1.500 hectares em Monte Alegre, em Cachoeiro de Itapemirim, onde vivem 102 famílias negras. Nestes dois municípios há grandes fazendeiros ocupando as áreas dos negros.
A primeira pesquisa sobre os territórios quilombolas no Espírito Santo foi realizada por profissionais contratados pela Fundação Palmares. Confirmou que o Córrego Angelim, em Sapê do Norte, é quilombola. Os descendentes de escravos têm direito a 12.945 hectares, que terão de ser titulados. Apenas 20 famílias conseguiram resistir ao cerco das grandes empresas nesta área
< O Observatório Quilombola publica todas as informações que recebe, sem descartar ou privilegiar nenhuma fonte, e as reproduz na íntegra, não se responsabilizando pelo seu conteúdo.
Ubervalter Coimbra
Representantes da Presidência da República, do Senado Federal, da Câmara dos Deputados, dos Ministérios da Defesa, da Justiça, do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) discutirão com a Aracruz Celulose S.A. a titulação de Linharinho, em Conceição da Barra, norte do Estado, como território quilombola. Só no dia seguinte, o grupo do governo se reunirá com os quilombolas.
A informação sobre a reunião do grupo do governo federal foi divulgada pelo coordenador do Fórum Estadual de Entidades Negras, Isaías Santana.
Um dos ofícios sobre o assunto é da Presidência da República por seu Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e datado do dia 18 deste mês. Dá ciência que nos dias 25 a 27 de setembro próximos, representantes dos membros do Conselho de Defesa Nacional (CDN) e integrantes deste Gabinete, na condição de Secretaria – Executiva do CDN, estarão na cidade de Vitória e Conceição da Barra – ES, visando a realizar estudo de campo sobre a delimitação do território da Comunidade Linharinho, haja vista a necessidade de opinar no referido caso, em razão do disposto no artigo 8º do Decreto nº 4.8887/2003.
Em um outro documento a que Isaías Santana teve acesso é informado que o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República comunicava que o grupo do governo federal se reunirá na próxima segunda-feira (25), às 14h, no prédio no auditório do Ministério da Fazenda com a Aracruz Celulose, em razão da necessidade institucional de se manifestar a respeito do Laudo Técnico de Reconhecimento da Comunidade de Linharinho.
À Superintendência do Instituto Nacional de Reforma Agrária (Incra) no Espírito Santo, que está convocada para a reunião, cabe garantir a participação no encontro do assegurador do Programa Quilombola, o servidor Marco Antônio Villas Boas Aguiar, e dos responsáveis técnicos e jurídicos que elaboraram o respectivo Laudo de Reconhecimento, para subsidiar os responsáveis pela reunião, esclarecendo os mesmos a respeito do assunto, inclusive, a Aracruz Celulose S.A..
Na comunicação institucional do governo federal é informado ainda que na terça-feira (26) haverá uma reunião idêntica no município e Comarca de Conceição da Barra com a comunidade Linharinho, sendo que o deslocamento far-se-á ao término da reunião do dia 25/09/2006, ou seja, aquela que se realizará no prédio do Ministério da Fazenda, nesta Capital. O documento é datado de 19 deste mês.
Linharinho faz parte do território quilombola de Sapê do Norte, constituído por Conceição da Barra e São Mateus, como comprovaram pesquisas científicas realizadas sob a coordenação de especialistas da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).
O território, contudo, foi tomado dos quilombolas, à força ou comprado a preços vis após falsas promessas de emprego e boa vida aos negros, principalmente pela Aracruz Celulose S.A. A empresa foi criada e ocupou o território dos descendentes dos escravos negros há quatro décadas, durante a ditadura militar.
A Aracruz Celulose e os outros ocupantes foram citados no edital publicado pelo Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra), no Diário Oficial da União. O edital dá ciência das conclusões da pesquisa que conclui que a área é dos descendentes dos escravos negros. A empresa contestou o laudo.
Das empresas que ocuparam os territórios quilombolas, a mais voraz e agressiva foi a Aracruz Celulose, com seus plantios de eucalipto. Também ocupam as áreas dos negros a Destilaria Itaúnas S/A (Disa) e a Alcon (usina de álcool de propriedade de Nerzy Dalla Bernardina), com plantios de cana-de-açúcar.
Igualmente ocupam territórios quilombolas a Suzano e a Bahia Sul, com plantios de eucalipto, e a Agropecuária Aliança Ltda (APAL), entre outros grandes grupos ou pessoas físicas com poderio político e econômico.
A Aracruz Celulose é citada como detentora de títulos incidentes no referido território, juntamente com os outros oito ocupantes. Há, ainda, ocupantes de mera posse, igualmente citados. Além dos que conseguiram títulos do território quilombola, a área ainda tem 41 famílias de remanescente de quilombo, que conseguiram resistir à ocupação das terras pela Aracruz Celulose e outros.
Diz o Incra que os estudos sócioeconômicos, culturais, antropológicos, fundiários, cartográficos e ambientais fazem parte do Relatório Técnico de Identificação que consta no processo. O relatório e o parecer da Comissão constituída para realizar esses estudos definem que as terras identificadas no referido processo administrativo, com área de 9.542,57 hectares, são consideradas como território da Comunidade Quilombola de Linharinho.
O trabalho de identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes de quilombos é obrigatório e deve ser realizado por determinação do artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias; do Decreto n. 4887 de 20/11/2003; e da Instrução Normativa n. 16/2004. O cumprimento da legislação cabe ao Incra.
Descendentes de escravos têm direito a 50 mil hectares no ES
As pesquisas realizadas sob a coordenação da Ufes apontam que os negros foram forçados a abandonar suas terras. Em Sapê do Norte existiam centenas de comunidades na década de 70, e hoje restam 37. Ainda na década de 70, pelo menos 12 mil famílias de quilombolas habitavam o norte do Estado: atualmente resistem entre os eucaliptais, canaviais e pastos, cerca de 1,2 mil famílias. Em todo o Espírito Santo existem 100 comunidades quilombolas.
Além de confirmar a partir de fatos históricos e antropológicos que Linharinho é território quilombola, as pesquisas apontam como igualmente quilombola a área de São Jorge (13 mil hectares do território), onde resistem em minúsculas propriedades apenas 80 famílias.
Em São Domingos/Córrego de Santana, restam apenas 113 famílias em pequenas propriedades, mas o território quilombola é de 12.596 hectares; e ainda em Sapê do Norte, em São Cristovão/Serraria, o território quilombola é de 8.500 hectares. Lá resistem em suas pequenas áreas 52 famílias de descendentes de escravos.
O projeto Territórios Quilombolas no Espírito Santo também pesquisou e confirmou ser território quilombola 500 hectares de São Pedro, em Ibiraçu, onde vivem 24 famílias. E, 1.500 hectares em Monte Alegre, em Cachoeiro de Itapemirim, onde vivem 102 famílias negras. Nestes dois municípios há grandes fazendeiros ocupando as áreas dos negros.
A primeira pesquisa sobre os territórios quilombolas no Espírito Santo foi realizada por profissionais contratados pela Fundação Palmares. Confirmou que o Córrego Angelim, em Sapê do Norte, é quilombola. Os descendentes de escravos têm direito a 12.945 hectares, que terão de ser titulados. Apenas 20 famílias conseguiram resistir ao cerco das grandes empresas nesta área
< O Observatório Quilombola publica todas as informações que recebe, sem descartar ou privilegiar nenhuma fonte, e as reproduz na íntegra, não se responsabilizando pelo seu conteúdo.