Editorial aborda questão quilombola em Alcântara
ALCÂNTARA E OS QUILOMBOLAS
Paulo Melo Sousa (Assessoria de Comunicação da
CONAQ)
Muito se tem falado, nos últimos anos, sobre os quilombolas, mas o que significa de fato essa palavra que identifica um significativo grupo social e que desponta no dicionário político-social da nação? Os quilombolas são os descendentes dos antigos escravos que, fugindo do jugo dos senhores de engenho, embrenharam-se no mato em busca de liberdade, ou receberam terras tanto da igreja quanto de proprietários rurais para trabalharem e sobreviverem após a abolição da escravatura, criando em diversos pontos do território brasileiro os chamados quilombos. Esses ajuntamentos mantiveram-se atravessando séculos, abrigando uma cultura que se alicerça no conhecimento tradicional dessas populações.
A Constituição de 1988 garantiu, pelo menos na letra, a posse da terra a essas comunidades, ao afirmar no artigo 68 do ADCT – Ato das Disposições Constitucionais Transitórias que “aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando sua terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos”. O atual governo criou a SEPPIR – Secretaria Especial de Políticas Públicas e Igualdade Racial, da Presidência da República para tratar, dentre outras atribuições, da questão dos quilombolas. Existem os chamados quilombos urbanos, localizados nas cidades, e os quilombos rurais, onde as políticas públicas ainda estão longe de ser implantadas, relegando tais comunidades ao descaso, e privando-as de direitos elementares de cidadania. Ali acontecem problemas crônicos ligados à educação, saúde, saneamento básico, desemprego e aos serviços elementares, tais como iluminação e posto telefônico. A CONAQ – Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas articula associações, federações e coordenações em 22 Estados do país nos quais já foram detectadas e reconhecidas comunidades quilombolas, e vem denunciando ao longo dos anos a situação de abandono em tais locais, bem como a violação dos direitos constitucionais dessas pessoas.
Várias situações de conflito têm se verificado pelo país afora. No momento, na ilha de Marambaia, no Rio de Janeiro, a Marinha tenta expulsar os quilombolas do seu território. No Espírito Santo, a multinacional Aracruz Celulose, que invadiu área dos quilombolas, acionou a polícia, que prendeu 80 pessoas, espancando dois deles há cerca de três semanas atrás. Dentro desse contexto, um dos focos de maior tensão social verificado se localiza no Maranhão, originado pela implantação do CLA – Centro de Lançamento de Alcântara. O governo brasileiro deslocou comunidades inteiras, todas elas quilombolas, e ainda hoje não indenizou muitos dos moradores. No momento, existe a pretensão de expansão do CLA, com prejuízo para outras comunidades, dentre as quais as de Mamuna e Baracatatiua. Os quilombolas vivem da roça, da caça, da pesca e da extração de pedras, coleta de coco babaçu e fabricação de carvão, dentre outros modos de sobrevivência. Precisam do território para a sua sobrevivência. A implantação do CLA forçou o êxodo rural, famílias inteiras se dirigiram à sede do município e se amontoam numa invasão, o bairro do Buraco Fundo, onde já existem gangs de marginais e prostituição infantil. A expansão pretendida virá aumentar a tensão social em Alcântara, e os direitos dos quilombolas, mais uma vez, autoritariamente atropelados.
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