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Proteção aos conhecimentos tradicionais em debate

Construção de sistema de proteção a conhecimento tradicional não avança na pauta da COP

Por Thaís Brianezi

Pinhais (PR) – Um dos dois principais grupos de trabalho da 8ª Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica (COP-8) discutiu hoje a proteção aos conhecimentos tradicionais. O debate foi encerrado e os participantes passaram para outro tema, sem que tenham avançado na construção do chamado sistema sui generis de proteção ao conhecimento tradicional – um desafio posto desde 1992, quando a Convenção sobre Diversidade Biológica foi criada.

Esse sistema sui generis (diferente, específico) deve dialogar com o regime internacional de acesso aos recursos genéticos e aos benefícios compartilhados (um dos focos principais da COP-8), mas não se confunde com ele. “O sistema sui generis é mais conceitual. Vai na linha de um código de ética, mesmo”, explicou o biólogo da organização não-governamental (ONGs) Instituto Socioambiental (ISA), Henry Novion.
“O sistema de propriedade intelectual foi criado para invenções artísticas individuais. Ele funciona na sociedade ocidental, regida por regras de direito civil”, avaliou Mathias. “Entre os povos indígenas, quilombolas e ribeirinhos, o conhecimento se constrói por uma rede de relações sociais de trocas de informações e materiais biológicos. Por isso, é preciso um outro sistema”, esclareceu o coordenador-adjunto do Programa de Política e Direito Sociambiental do ISA, Fernando Mathias.

Mathias explicou que o movimento indígena e algumas ONGs (entre elas o ISA) defendem uma abordagem “endógena” (de dentro para fora) na proteção desse conhecimento, em complemento a uma abordagem “defensiva” (preocupada apenas com a apropriação indevida desse saber). “Para proteger esse saber, é preciso assegurar a reprodução social dessas comunidades. Isso passa pelo direito à terra, pelo acesso aos recursos naturais, por sistemas de saúde e educação diferenciados e por alternativas econômicas de bases sustentáveis”.

Quando a Radiobrás perguntou ao cacique Iwraru Carajá (de Tocantins) como o conhecimento do povo dele podia ser protegido, a resposta seguiu a lógica defendida por Mathias. “Antigamente, no território havia só nossos antepassados. Hoje a gente mora na ilha do Bananal e ela foi invadida. Precisamos tirar essas pessoas de lá”.

“A visão que nós defendemos é que esse sistema sui generis deveria proibir o patenteamento de produtos e tecnologias que se apropriaram de conhecimentos tradicionais para serem desenvolvidos. Isso não interromperia as pesquisas, claro, mas o resultado dela seria disponível a todos, como são os softwares livres”, argumentou Mathias. “Infelizmente hoje a única discussão forte é a da repartição de benefícios. Ou seja, os governos já não contestam mais que o saber coletivo e ancestral vire mercadoria, desde que eles também ganhem com isso.”

Mathias reconheceu, porém, que as decisões sobre patenteamento de produtos ocorrem no âmbito da Organização Mundial de Comércio (OMC) e da Organização Mundial de Propriedade Intelectual (Ompi). “A tendência lá é permitir cada vez mais a apropriação privada de saberes coletivos. O objetivo de discutir proteção dos conhecimentos tradicionais no âmbito da CDB é justamente criar uma abertura nessa visão monetarista, influenciar mudanças nas regras de propriedade intelectual”.

A COP é o órgão deliberativo da CDB, que se reúne a cada dois anos. A oitava conferência, que acontece também em Pinhais, terminará no dia 31.

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