Dirigente da FAO elogia ação de combate à fome
Senegalês conhece projeto de hortas e cozinhas comunitárias em terreiros
Por Cleidiana Ramos
A comunidade do terreiro Mansu Bandu Kuekuê Inkinasaba Filho, localizado em Cajazeiras 11, viveu ontem um dia de festa. O local sediou a XV Plenária Alimentar e Nutricional da População Negra do Estado da Bahia, com a presença de Jacques Diouf, diretor da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO-ONU).
A casa faz parte do projeto Rede Kôdya, uma reunião de comunidades de herança afro-brasileira no combate à fome, liderada pela Associação Cultural de Preservação do Patrimônio Banto (Acbantu), e vai sediar uma das cozinhas comunitárias que ampliam o programa.
A primeira visita oficial do diretor da FAO a Salvador teve como objetivo principal conhecer as iniciativas que fazem parte do Fome Zero, programa elogiado por Diouf.
“Eu estou muito emocionado por conhecer de perto o trabalho de comunidades afrodescendentes que trabalham com o programa Fome Zero. A FAO opera em todos os países do mundo, de forma diferente, mas com a mesma concepção de garantir que todas as pessoas tenham direito ao alimento.
Isso é feito com iniciativas que garantam o seu desenvolvimento social por meio do seu trabalho”, acrescentou Diouf, que é senegalês e está à frente da FAO há 12 anos.
Participaram também do encontro o coordenador do Departamento de Quilombos da Acbantu, Valmir dos Santos; o secretário nacional de Segurança Alimentar e Nutricional do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), Onaur Ruano; o representante da Embrapa, Pedro Gama; o representante da FAO-ONU no Brasil, José Tubino; o secretário municipal da Reparação, Gilmar Santiago, o deputado estadual Álvaro Gomes (PCdoB-BA); e a superintendente da Conab na Bahia e Sergipe, Rose Pondé.
SOLIDARIEDADE – A Rede Kôdya, criada pela Acbantu há três anos, reúne 750 comunidades afrodescendentes, incluindo terreiros e quilombos. O projeto, que tem como parceiros o governo federal, por meio do programa Fome Zero e a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), já permitiu a doação de, aproximadamente, um milhão de quilos de alimentos.
Os terreiros e quilombos são responsáveis pelo cadastramento e distribuição dos alimentos, iniciativas que já beneficiaram um número aproximado de 120 mil pessoas, segundo dados da Conab e da Acbantu.
A extensão do projeto por meio de uma parceria com o MDS inclui a instalação de três cozinhas comunitárias, uma no terreiro que sediou a plenária de ontem e as outras duas em Cachoeira e São Francisco do Conde. A produção das cozinhas vai ser comercializada.
O projeto das hortas é voltado para o abastecimento das cozinhas, mas também para a distribuição dos produtos de uma forma mais organizada. “A distribuição por meio da rede é uma forma de assegurar uma melhor comunicação entre as comunidades atendidas.
Hoje, as comunidades dos quilombos sabem que estão produzindo para os terreiros. Por outro lado, o governo tem adquirido esta produção de forma institucional, o que reforça a agricultura familiar e contribui muito para o resgate da auto-estima das comunidades envolvidas”, acrescenta Rose Pondé, superintendente regional da Conab na Bahia e Sergipe.
Em Salvador, as hortas ficarão localizadas no Parque São Bartolomeu e no terreiro Mansu Dandalungua Kokuazenza. A outra será implantada em Cachoeira. As iniciativas têm também as parcerias das prefeituras locais.
Emocionado, o presidente da Acbantu, Taata Raimundo Komannanjy, pediu ao representante da ONU, Jacques Diouf, que leve adiante a experiência que tem sido realizada na Bahia. “Diga ao mundo que o povo da diáspora negra aqui na Bahia está vivo e que continua lutando para sair do esquecimento do mundo. Diga também que temos a fome de saber bem mais da nossa mãe África”, completou.
A anfitriã do encontro, mameto de inquice – título da mais alta sacerdotisa de um terreiro de nação angola – Hildecília Cabral, a mãe Lia, já distribui alimentos para a comunidade por meio da Rede Kôdya e agora se prepara para colocar em funcionamento a cozinha comunitária.
“É uma honra muito grande ter a oportunidade de sediar esse projeto, mesmo porque, nós, de candomblé, já temos a tradição de atender à comunidade em torno do nosso terreiro, e essa experiência da rede veio para reforçar nosso trabalho social”, relata Mãe Lia.
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