Quilombo do Açude preserva manifestações culturais
Quilombo do Açude e o candombe
A comunidade quilombola do Açude / Jaboticatuba – MG pratica o candombe, uma das mais belas expressões de matriz africana em Minas Gerais.
O Projeto Quilombos Gerais está fazendo diversas visitas em comunidades quilombolas de Minas Gerais para a documentação e o registro de suas expressões culturais e de sua realidade sócio-econômica.
A comunidade do Açude localiza-se no município de Jaboticatuba, a dois quilômetros do distrito de Cardeal Mota, no entorno do Parque Nacional Serra do Cipó foi visitada pelo Projeto Quilombos Gerais em setembro. Existem onze famílias no povoado, contabilizando aproximadamente sessenta pessoas, que vivem de trabalhos urbanos e rurais.
Segundo Dona Maria das Mercês uma das lideranças da comunidade, seu avô era escravo e chegou naquela região há mais ou menos 125 anos, lutando contra fazendeiros para permanecerem no local que possui hoje, mais ou menos onze mil metros quadrados. No entorno da comunidade existe uma fazenda denominada de Cipó Velho, onde existe uma senzala e documentos de compra de escravos no Rio de Janeiro na segunda metade do século XIX. Possivelmente a comunidade se formou com a alforria dos escravos desta fazenda.
Todas as casas possuem hortas para o consumo e criação de galinhas. No Açude não existem escolas e nem posto de saúde. A água utilizada por moradores é de um poço artesiano. Existe em toda a comunidade energia elétrica nas residências.
Segundo o morador Flávio, o turismo e a ocupação no entorno de maneira não sustentável, é um grande problema e está causando um impacto social na comunidade.
Segundo a moradora Flor, já houve conflitos de terras, mas atualmente todas as famílias possuem o título legal de posse da terra.
O candombe é a principal expressão cultural do Açude. Sendo os instrumentos (caixas de percussão, denominados de Tambu) confeccionados por antigos moradores no final do século XIX e início do século XX. Segundo André Braga, o candombe é uma manifestação afro-brasileira caracterizada por uma entoação de cantigas com tambores feitos por mãos escravas, num ritual de louvor à Nossa Senhora da Aparecida, Nossa Senhora do Rosário e outras entidades religiosas. O ritual surgiu nos últimos anos da escravidão, quando os escravos já haviam assimilado vários aspectos da cultura colonial e incorporados elementos da religião católica.
Para dona Maria das Mercês, a tradição que já atravessou gerações é uma forma de pedir proteção aos “velhos” – pessoas da família que já faleceram – através de Nossa Senhora do Rosário. “O candombe só traz energia positiva para as pessoas, nós queremos transmitir coisas boas”, acrescenta dona Mêrces ao dizer que a Comunidade fica satisfeita em receber visitantes que se interessam em conhecer um pouco mais sobre a cultura do seu povo.
Comemorado sempre no segundo sábado do mês de setembro, o Candombe é uma verdadeira atração turística para a região. Centenas de pessoas do mundo inteiro vão até a Comunidade do Açude para prestigiar a vibração da festa que ganha o terreiro ao som do batuque dos tambores – para eles, tambus.
A tradição, antigamente reprimida pelos senhores, hoje é motivo de orgulho para a família de dona Mêrces, que espera que o Candombe continue sendo respeitado pelas pessoas como uma forma de manifestação de fé e esperança.
As orações, tantas vezes repetidas, são uma forma de agradecer à Nossa Senhora do Rosário, mãe do candombe, por todas as bênçãos concedidas àquela comunidade.
Os batuques dos tambus – instrumentos de madeira produzidos pela própria Comunidade – transmitem a fé e a alegria daquele povo.
No ritual sagrado também não faltam canções com versos em português e muita cachaça que, segundo dona Maria das Mercês, é uma forma de descontrair quem vai prestigiar o candombe. Antigamente, quando Mercês era criança, o candombe era entoado na língua Banto.
O candombe é praticado também na comunidade quilombola do Mato do Tição, no município de Jaboticatuba; em Lagoa Santa e em Matozinhos.
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