SP – Contexto geral de Caçandoca
QUILOMBO DA CAÇANDOCA
O dia treze de maio foi um diferente para os Quilombolas de Ubatuba, a justiça da cidade lhes concedeu um documento, só que diferentemente do 13 de maio de 1888, quando os Escravos receberam a Lei Áurea, os quilombolas receberam a informação sobre um documento expedido pelo Juiz da Primeira Vara de Justiça de Ubatuba – SP, que permite a Reintegração de Posse para a Imobiliária Continental, em um processo que se arrasta desde os idos de 1976, quando a referida imobiliária apresentou-se como dona das terras do Quilombo (nos idos dos anos 70, houve uma ação coordenada de invasões contra Quilombos, onde grileiros expulsaram os moradores de suas terras), iniciou-se aí o calvário daqueles que sempre viveram naquelas terras, pertencentes desde o século XVIII a Elídio Antunes, um senhor de escravos, que plantava naquelas terras café e banana, além de produzir farinha.
Elídio teve muitos filhos, que acabaram por gerar filhos com escravas da fazenda, formando assim a geração dos quilombolas que hoje lutam por seus direitos, sendo que um deles, o Sr. Antonio dos Santos, é o atual Presidente da Associação dos Remanescentes do Quilombo da Caçandoca na atualidade.
A Imobiliária Continental comportando-se como dona das terras do Quilombo, entrou nas terras, queimou as casas dos Quilombolas, além de sua casa da farinha, um dos marcos da tradição daquele povo, soltou gado e cabritos nas terras, impedindo assim que o povo Quilombola plante até mesmos os produtos necessários para sua subsistência, além de muitas vezes ocorrer a morte de animais na beira do rio que serve ao Quilombo, empesteando a água e causando doenças. A escola do Quilombo está
fechada, obrigando as crianças andarem cerca de 4 quilometros até o ponto onde pegam condução para chegar em outra escola; toda e qualquer melhoria é negada ao povo do Quilombo, que é tachado de “invasor” e “população flutuante”, e, com esta justificativa, necessidades básicas como água e luz não são satisfeitas, jogando o povo do Quilombo no mais perfeito sistema de exclusão, além do sistema de Saúde (consta que funciona no Quilombo o PSF (Programa de Saúde da Família), porém, o agente de saúde aparece no Quilombo a cada 2 (dois) meses. No caso de qualquer pessoa do Quilombo ficar doente, não haverá socorro, já que ambulâncias não entram
lá devido as condições precárias da estrada que dá acesso ao Quilombo.
Os Quilombolas vêm resistindo de forma heróica a este projeto de “Destruição da Comunidade”, contando com pouca ajuda, já que até mesmo órgãos como prefeitura municipal e polícia ambiental participam do jogo de desmantelamento do Quilombo, sendo que a primeira não toma o mínimo conhecimento das necessidades do povo Quilombola.
Após a constituição de 88, a comunidade se organizou e formou a Associação dos Remanescentes do Quilombo da Caçandoca, para participar do processo de reconhecimento e titulação de suas terras, tarefa esta realizada pelo ITESP – Instituto de Terras do Estado de São Paulo, conjuntamente com a Secretaria de Justiça e Cidadania do Estado de São.
O ITESP organizou a pesquisa da história dos Quilombolas e apresentou o Laudo Antropológico do Quilombo, permitindo assim, que o mesmo fosse reconhecido, porém, para os donos da Continental isso não significa nada e hoje, novamente, vemos os Negros do Quilombo à mercê de serem jogados na rua da amargura e assistindo a terra que foi de seus ancestrais servir para a especulação imobiliária, afinal, são “apenas” 890 hectares de terra à beira de uma praia, um lugar paradisíaco, sendo que os 240 hectares que a Continental “diz possuir” dentro do Quilombo, servirão para erguer um belo e majestoso condomínio, onde com certeza, os quilombolas poderão servir como empregados.
Para maiores informações:
* Quilombo da Caçandoca – Bárbara – 8123.2755 (cel) Ubatuba
* Laudo Antropológico – ITESP Taubaté – Lincoln: 3629.2444
* ARCQC – Associação dos Remanescentes da Comunidade do Quilombo da Caçandoca
Presidente – Antonio dos Santos
Estrada Benedita Luiza dos Santos, 1474 – Caçandoca
Fone para contato: 3848-2664 c/ Sra. Antonio ou Gabriela
* Solange Barbosa – Tremembé – (12) 9116-0837
São apenas 44 famílias que neste momento lutam pelo direito a terra de seus
ancestrais e, coincidemente, no filme AMISTAD de Steven Spilberg (1998), 44 negros africanos lutam para voltar à África e viver novamente em liberdade e uma frase é marcante: São apenas 44 negros, o que isso significa num universo de milhares de negros e para milhões de brancos? Nada!!!!
São apenas 44 famílias de negros quilombolas lutando contra o poder econômico de uma Imobiliária que com certeza ganhará milhões de reais com aquela “terra de pretos”, o que eles valem? Nada!!!!
Se os Quilombolas da Caçandoca perderem o direito as suas terras, nós, milhões de negros afrobrasileiros, também estaremos perdendo a fé de que este Brasil foi realmente feito para todos os brasileiros.
A SITUAÇÃO NO QUILOMBO DA CAÇANDOCA NESTE MÊS DE MAIO
Os quilombolas foram visitados nos últimos dias por diversas autoridades:
Na quarta-feira, dia 18/05/05 esteve com o eles o Sr. Ivan – Membro da Seppir Brasília, que informou estar levando ao conhecimento daquela Secretaria a situação em que estavam envolvidos os Quilombolas e que seriam realizados por parte daquela secretaria todos os esforços para impedir a saída dos Quilombolas de sua terra. Neste mesmo dia, estiveram presentes no Quilombo o Sr. Domingos, Vice-Prefeito de Ubatuba, informando que a Reintegração de Posse poderia ocorrer a qualquer momento e
que seria necessário o povo do Quilombo se organizar para a resistência e colocando à disposição dos Quilombolas a chave da escola para o caso de necessitarem se alojar.
Na sexta-feira, dia 20/05/05 os Quilombolas receberam o Secretário de Justiça e Cidadania do Estado de São Paulo, Sr. Hédio da Silva Jr, que informou ao povo local, que mesmo tendo assumido a Secretaria de Justiça e Cidadania há apenas 4 dias, realizaria todos os esforços possíveis para impedir, através de negociações, a retirada dos Quilombolas de suas terras.
Acompanhando o Secretário estiveram presentes os funcionários do ITESP, o Sr. Amaral, Assessor do Deputado Estadual Simão Pedro, agentes da FUNASA, além do vice-prefeito de Ubatuba e alguns membros da Assessoria da Prefeitura Municipal de Ubatuba.
Ficou acertado neste encontro, duas vezes por mês técnicos da Secretaria de Justiça e do Itesp estarão realizando visitas ao Quilombo para ouvir a comunidade e apresentar relatórios sobre as negociações sobre as terras.
A fala mais comovente deste encontro coube a Dna. Marciana dos Santos, Quilombola de cerca de 70 anos, que disse aos presentes, em especial ao Secretário de Justiça, que “a retirada do povo da Caçandoca de suas terras desta vez, deverá ser acompanhada de “caixões” pois ela e outros quilombolas mais velhos, que viveram ali desde o nascimento com seus pais e avós, que percorreram as matas com latas de farinha na cabeça para vender em Ubatuba, somente sairão daquelas terras mortos, pois é melhor
morrer na terra que guarda o sangue e as lágrimas de seu povo, do que viver na cidade, onde suas tradições, sua cultura e seu modo de viver não são respeitados por ninguém”.
Hoje, 23 de maio de 2005, os Quilombolas da Caçandoca foram acordados com a grata notícia que amanhã 24/05, as 5 horas da manhã a Reintegração de Posse será realizada, beneficiando assim a Imobiliária Continental, acabando com a dignidade e talvez com a vida daquele povo. O Sr. Antonio informou que está negociando com a Prefeitura Municipal o apoio necessário para que o povo da Caçandoca tenha assegurado uma estrutura mínima para enfrentar este momento horrível. O Comando da PM em Taubaté está reunido para planejar a Reintegração. O pessoal do ITESP em
Taubaté também está reunido para dar o apoio necessário aos Quilombolas.
Já conseguimos informar a Assessoria do Dr. Hédio em SP, além de conversar com o Sr. Timóteo, Assessor do Deputado Luiz Eduardo Grenhalg, a Imprensa local também está a postos.
Neste momento, precisamos de toda ajuda possível, o povo do quilombo da Caçandoca, formado por homens, mulheres, crianças e idosos, gente comum que tem direito àquela terra, não pode ser despejado, eles não precisam assistir novamente a derrubada de suas casas.
O governo federal tem um compromisso com este povo, está inscrito na Constituição brasileira, em seu artigo 68, a terra é dos quilombolas e não pode haver lei maior e nem governo maior do que o governo federal.
Como o Brasil pode pleitear assento no conselho de segurança da onu se continua a permitir que grileiros matem quilombolas, que os expulsem de suas terras.
Como falar em soberania se deixa seus índios morrerem e se a tão falada “igualdade racial” não acontece, se os direitos humanos continuam a ser desrespeitados flagrantemente em nosso país. Permitir neste momento que o povo do quilombo da Caçandoca seja expulso de suas terras, é rasgar a Constituição de 88.
Solange Barbosa
(012) 3674.1790
(012) 3672.2417
(012) 9116.0837