PA – Quilombolas vivem isolados da modernidade
MAURO NETO
Às margens do rio Arapapuzinho, no município de Abaetetuba (a 80 quilômetros de Belém), a comunidade de São Sebastião se destaca. Com apenas 42 famílias, o lugar é uma das poucas áreas quilombolas que consengue manter-se fiel às características seculares mesmo em tempos de globalização. Lá o tempo parece que não passou. A organização social ainda é a mesma de quando foi criado o quilombo, há mais de 150 anos. Uma das poucas influências externas que a comunidade tem é a presença de um templo católico dedicado ao santo que dá nome ao lugar. Isso não impede que logo adiante os habitantes se reúnam em um terreiro de umbanda para cultuar entidades afros.
No meio da floresta – imperceptível para os olhos de qualquer forasteiro que chegue ao lugar – está a base de subsistência do quilombo. São pequenos roçados de mandioca, cana-de-açúcar e arroz. Apesar de morarem na beira do rio, os quilombolas de São Sebastião, por incrível que pareça, não dominam a técnica da pesca. “Aqui nós temos peixe, mas não pescamos.
Vivemos basicamente do roçado. Se tivesse algum projeto, quem sabe poderíamos viver de piscicultura, mas a gente não tem nem um barco, imagina projeto”, afirma Venâncio Diogo de Carvalho, de 75 anos, o mais antigo habitante do quilombo.
Seu Venâncio, espécie de conselheiro da comunidade, nasceu embaixo de um pé de castanheira e no mesmo local foi batizado, quando há 30 anos se converteu ao catolicismo. “Nossos filhos e netos continuam nascendo pelas mãos de nossas mulheres, das nossas parteiras. Dificilmente nos deslocamos para a cidade. Somente as crianças saem mais, porque precisam estudar”, diz ele. As crianças de São Sebastião freqüentam uma escola municipal há pouco mais de 20 minutos de barco do local.
O quilombo do Arapapuzinho começou a ser formado há 150 anos, quando escravos fugitivos dos engenhos que produziam cachaça na região chegaram ao local. Seu Venâncio conta que o quilombo ficou desconhecido por mais de 50 anos. “Somente em 1902 é que a comunidade foi encontrada. Naquele época eles viviam basicamente da caça”, ressalta.
Como a caça já não é mais tão abundante, a roça é a base da sobrevivência: “A farinha e a cana-de-açúcar são nossa vida. A nossa tradição. Sem elas a comunidade deixaria de existir”, afirma Egídio dos Santos Gomes, de 22 anos. Egídio faz parte da nova geração de quilombolas de São Sebastião. “Essa comunidade ainda vai resistir muito”, garante o jovem.