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PE – Castanhinho – Arca das Letras

A iniciativa leva pequenas bibliotecas a comunidades rurais mais carentes do País.

Arca das Letras, do Ministério do Desenvolvimento Agrário, já foi instalada em mais de 500 localidades

Patrícia Villalba Enviada especial GARANHUNS

O passado de resistência, a cultura negra e a modernidade que só se vê de longe chegaram a Castanhinho na semana passada permeados nos 220 livros que compõem a Arca das Letras.

Castanhinho, nas cercanias de Garanhuns, é uma das 62 comunidades quilombolas de Pernambuco beneficiadas pelo projeto, do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA).

A iniciativa que leva pequenas bibliotecas a comunidades rurais mais carentes do País e é tocada por uma pasta que, teoricamente, não tem nada a ver com livros, mostra como o Brasil está mobilizado para democratizar o acesso aos livros neste Ano Ibero-Americano da Leitura. O Estado tem acompanhado o evento, promovido em 11 países e aqui chamado de Vivaleitura.

A entrega das 51 bibliotecas rurais, uma parceria do MDA com a Fundação Palmares e o Ministério da Cultura, aos quilombolas pernambucanos foi feita de uma vez só, na festa preparada pelos moradores de Castanhinho – onde se dançou o coco e o maculelê. Horas antes, cerca de cem representantes das comunidades passaram por um curso. Aprenderam como funciona uma biblioteca – a catalogação dos livros e o empréstimo, por exemplo – e saíram formados agentes de leitura. Os livros que chegam onde eu moro são sempre infantis, tem pouca coisa para os jovens , conta a estudante Maria Tatiane Gomes de Souza, de 15 anos, agora bibliotecária da comunidade de Feijão, próxima ao município de Serra Talhada. Agora, com os livros que ganhamos, todo mundo de lá vai poder ler.

Maria Tatiane conta com orgulho que Feijão é uma das mais organizadas comunidades quilombolas de Pernambuco. E esse conceito de organização, numa localidade como essa, significa em primeiro lugar a preservação dos valores e da cultura negra. Fundamos nosso Centro Cultural Palmares, temos grupo de dança 100% negra, o maculelê, grupos de leitura de poesias , enumera ela, aluna da 8.ª série do ensino fundamental.

Erika Maria Florêncio se ofereceu para ser agente de leitura da sua comunidade, o Sítio Serrote do Gado Bravo, próxima da cidade de São Bento do Una. Ali há muitos analfabetos, mas curiosamente um interessante enorme pelos livros. Tem muita gente que vai bater na minha casa pedindo ajuda para ler alguma coisa, as crianças pedem que eu leia um livro , conta ela, aluna do segundo ano do magistério, que sonha ser professora e falar inglês.

ATRÁS DO PÉ DE PITOMBA

As crianças do Serrote do Gado Bravo vão continuar batendo à porta de Erika. A Arca das Letras é um móvel compacto, cheio de cantinhos estratégicos. É fabricado por presidiários, um convênio com o Ministério da Justiça. Então, se a comunidade não dispõe de um local específico para guardar a biblioteca, o agente de leitura pode hospedá-la em casa.

Com arestas bem aparadas, o programa se espalha. Já foram instaladas 500 bibliotecas rurais, em 11 Estados. Temos um acervo básico, com um Almanaque Abril, que nos foi doado pela Editora Abril, e grandes autores, como Kakfa, Moacir Scliar, além de dicionários, atlas , explica Cleide Cristina Soares, coordenadora de Ação Cultural da Secretaria de Reordenamento Agrário do MDA. Mas antes de receber os livros, cada comunidade é consultada e indica o que quer receber. Pode ser um assunto de interesse ou até mesmo títulos específicos para compor o acervo , continua. É o momento em que a comunidade enxerga que suas características locais estão no acervo.

Impacientes, os irmãos Kelly Caroline, de 8 anos, Lavínia Andréia, de 7, e Expedito da Silva Mendes, de 3, não viam a hora de a falação das autoridades terminar para poder ver os livros de perto. Gosto dos de matemática , dizia a exclamativa Lavínia. Vou levar para a escola, quero mostrar para a professora. Onde fica a escola de Castanhinho? Ali atrás do pé de pitomba.

Resistência continua sendo a palavra de ordem entre os remanescentes dos negros escravos que fugiram de seus donos e formaram trincheiras – os quilombos – contra a escravidão a partir do século 16. Segundo o IBGE, há cerca de 2 milhões de pessoas vivendo em comunidades que descendem dos quilombos, espalhadas por quase todo o País. Agora, numa grande campanha, os moradores dessas localidades pleiteiam a posse das terras que ocupam há séculos. Um levantamento da Fundação Palmares indicou a existência de 1.098 comunidades quilombolas no Brasil. P.V.

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