Por Cosmiana Bispo
Olá, me chamo Cosmiana Bispo, mulher negra quilombola e mãe.
Estava aqui pensando e senti vontade de escrever essas pequenas palavras para fazer um desabafo e também um pedido de socorro, porque acima de tudo sou mãe.
Esse desabafo é diretamente para chamar a atenção do poder público, pois estamos em um ano político e é sempre nesse período que ouvimos várias promessas por parte de políticos, principalmente a respeito de educação, saúde e segurança.
E isso me faz pensar que estamos vivendo uma ilusão, pois realmente investir em educação, saúde e segurança é importante e necessário, ou seja, é a base de tudo.
Porém para se investir em educação, saúde e segurança na zona rural tem um ponto mais importante ainda para que tudo isso venha a funcionar de verdade. E esse ponto tão importante se chama estrada, pois na maioria das vezes a maior parte da população dos municípios está concentrada nas zonas rurais. E essa parte da população é quem faz a diferença em tudo, quer seja na economia, quer seja na urna na hora de votar, e são os mais esquecidos e pisoteados pelo poder público.
Nós, da zona rural, somos maltratados até na hora de votar, pois deixamos nossas casas, faça sol ou faça chuva. Às vezes nem o dinheiro para merendar temos. Enfrentamos uma fila danada e ainda não temos o direito a uma estrada de qualidade que venha garantir educação, saúde e segurança de verdade.
O aluno da zona rural que consegue vencer sem desistir pode chamá-lo de guerreiro, porque passou por muita humilhação, fome e ainda teve que empurrar carro nas estradas e, muitas vezes, seguir de pé, quando não chega na escola sujo, tanto de poeira quanto de lama e é zombado, viu? É vítima de Bulling. E quantas pessoas tem que sair no Banguê pra tentar chegar à cidade em busca de um médico e, às vezes, não tem como chegar lá com vida, por conta da falta de um transporte, por ter uma estrada de péssima qualidade.
Como mulher me sinto constrangida de chegar até o posto de saúde e fazer um preventivo, porque depois de andar 11km para chegar até lá, estou suja e suada. E quantas vezes nem ficha de atendimento encontramos, mas por quê? Porque a equipe do posto é pequena e a demanda é grande.
Ao falar de segurança não sei nem por onde começar, porque dizem “Ligue 190, 180”, é o canal para denunciar. Primeiro, que não telefonia nem internet, só para quem consegue pagar. Depois, se acontece algo e conseguir denunciar, como que a viatura consegue entrar se mais uma vez não tem estrada? Porque se for no dia de chuva, já era carro trafegar.
Então, assim, o meu desabafo é esse. Porque, para se investir em uma educação de qualidade, para realmente dizer assim: “eu vou investir em educação”, é preciso falar com sinceridade e com respeito com as pessoas, viu? Porque a estrada precisa ser feita. Precisa ser uma boa estrada para que tenha tráfego de carro com mais facilidade, para que o transporte possa ir e vir sem muita dificuldade. Para que essas crianças sejam deslocadas de lá para a escola, viu? Sem tanto sofrimento. Que tenha um transporte de qualidade para transportar essas crianças e que tenha uma estrada de qualidade também.
Que tenha promessas que não seja apenas promessas. Que realmente venha efetuar, fazer de verdade. Venha cumprir com aquilo. Porque nós, cidadãos e cidadãs, cumprimos com a nossa parte de ir lá na urna de quatro em quatro anos votar. Nós cumprimos com tanta dificuldade… Mas a gente vai, a gente não deixa de fazer isso.
Então porque os governantes, o poder público também não podem responder à altura? Não podem dar a resposta que a gente necessita? Nós, da zona rural, precisamos ser respeitados. Nós precisamos ser escutados. Nós precisamos de uma estrada de qualidade. Nós precisamos de segurança. Nós precisamos de ensino de qualidade e de transporte de qualidade para carregar os nossos filhos e nossos alunos, viu? Porque, como mãe, eu fico com medo de colocar os meus filhos em cima de um transporte escolar em uma estrada de péssima qualidade, viu?
E eu fico lá com o coração pequeno vendo a hora de eu receber uma notícia. Ainda no outro dia, porque com certeza não vai saber logo no mesmo dia, porque não vai ter quem dará a notícia. Porque não tem telefonia e a gente não vai saber. E aí a gente vai saber uma noticia trágica, que aconteceu alguma coisa, o carro tombou, caiu no córrego. Por que? Porque a estrada é de péssima qualidade, entendeu? O carro também não é de qualidade, e aí como é que ficam essas mães? Que choram comigo, pensam comigo e também pedem respeito aos nossos filhos, aos nossos alunos, aos nossos agricultores, às nossas comunidades rurais. Respeito e escuta, é isso, é isso.