Uma carta à Campanha da Fraternidade Ecumênica -Diálogo: compromisso de amor. Cristo é a nossa paz!

Diante do caos pandêmico e político em solo brasileiro nos perguntamos: é possível outra realidade com paz, justiça e garantia de direitos humanos, sociais e ambientais? Honestamente, parece que não! A impressão que temos é que há um projeto de poder articulado com setores fundamentalistas religiosos negacionistas que preferem armas no lugar da vacina. Preferem agendas do agronegócio a práticas da economia solidária e da agricultura familiar e agroecológica. Preferem o privilégio dos homens brancos à resistência de mulheres indígenas, quilombolas e negras. Preferem uma visão de mundo europeizada-americanizada dicotomizada à imersão na integralidade corpo-natureza dos povos tradicionais e originários. Preferem os mitos gregos ao panteão africano. Preferem muros a pontes. Preferem julgar e condenar a acolher e abraçar.

Estamos em profundo cansaço! Está muito difícil esperançar! Como sugere Edson Gomes (cantor de reggae do recôncavo baiano), “a lua não é mais dos namorados – os velhos já não curtem mais as praças”. Uma nação dilacerada pela dor, pelo luto, pela ausência de teto, pão, trabalho e amor. Com efeito, experimentamos um tempo que exige de nós cada vez mais capacidade de resistir para recriar.

É importante ressaltar que nossas lágrimas no exercício da alteridade e da empatia também regam possibilidades de novas sementes. Reafirmamos nesta complexidade dos fenômenos religiosos a relevância das vozes produzidas por setores ecumênicos e progressistas. Vozes em defesa da vida em suas múltiplas maneiras de existir. Tradições religiosas que no escritório, no templo, no terreiro, no sindicato, na universidade, nas redes sociais e na ONG buscam uma espiritualidade diaconal, afetiva, libertadora, emancipatória e humana.

De fato, seja com a mochila nas costas e o tênis sujo de barro, essas mulheres e homens que compõem essas instituições buscam através de uma escuta sensível compreender e estabelecer estratégias de superação de violências que sangram corpos (principalmente) afro-indígenas de mulheres em nossa nação. Muitas incidências são produzidas em defesa da vida ameaçada, banalizada, objetificada e animalizada por políticos-religiosos ilusionistas da moralidade e missionários do terror.

Não iremos naturalizar a morte como se vidas fossem números. Não iremos nos calar e nem nos omitir diante da nuvem cinzenta que nos impede de ver o sol e um novo dia. Iremos de mãos dadas continuar o grande mutirão da beleza, da poesia e da humanização. Silêncio dos bons? Aqui não! Junto aos sinos, violões e atabaques escutamos e produzimos sons para a grande festa do abraço, pois, nela haverá uma grande mesa da diversidade onde iremos sorrir, beber, comer e brincar.

Enquanto esse dia não chega, nós nos fortalecemos com fé e cuidado mútuo. O rosto do divino é também rosto humano diverso, é terra, território e muitos povos. É cuidando de alguém e de nós mesmos que percebemos a face amorosa do mistério divino que nos acolhe no colo e sussurra em nossos ouvidos: estou com você! Não tenha medo! Finda a tempestade o sol nascerá. Com efeito, nossa gratidão às muitas mãos disponíveis para denunciar injustiças e anunciar através da fé e do compromisso, uma outra realidade. Animem-se mais uma vez, pois, como sugere Belchior: tenho sangrado demais – tenho chorado pra cachorro – ano passado eu morri, mas esse ano eu não morro.

Embora dizem que a CFE finaliza na Páscoa, para nós, do Movimento Ecumênico, no domingo da Ressurreição ela se fortalece, porque é pela Ressurreição que compreendemos que a violência não vence o amor incondicional de Deus pela Criação.

                  

                   Fórum Ecumênico ACT Brasil, 26 de março de 2021