Por Alexia Vieira
Quando voltava para casa após pegar os filhos na escola, no fim da tarde de 14 de agosto, Liana Cavalcante Costa, 32, foi agredida fisicamente pela vizinha. A mulher foi chamada de “macumbeira” e escutou gírias LGBTfóbicas proferidas pela suspeita. Morando na Barra do Ceará desde dezembro de 2018, Liana é uma das responsáveis pela Casa das Negas, espaço sociocultural que funciona na sua residência voltado para pessoas negras, LGBTs e mulheres. De acordo com ela, a vizinha teria se incomodado com orações umbandistas que a moradora fazia com a família na noite anterior. Durante a agressão, a suspeita arrancou o turbante que Liana usava na cabeça.
“Eles tentam provocar na gente um clima de ameaça, de medo. A gente tá tentando se recuperar, driblar essa sensação, não se amedrontar e não parar as atividades da Casa”, disse a vítima ao O POVO Online. Ela explica que antes do ocorrido tudo estava “na santa paz”. Quando se mudaram, conversaram com a mãe da vizinha para comunicar que as vezes utilizavam instrumentos de percussão nas atividades musicais do espaço. Com o aval da idosa, que pediu apenas para não tocarem em horários inoportunos, Liana e o esposo, Hesse Santana, ficaram tranquilos para manter a Casa das Negas no local.
Enquanto faziam as orações na noite anterior às agressões, Liana garante que não foram utilizados instrumentos. A vizinha também escutava música religiosa, segundo ela, em uma caixa de som. “ [A agressão] Foi bem de repente. Ela diz que ouviu um tambor sendo tocado meia noite, sendo que esse tambor não existiu. E se existisse, o que ela tem que fazer é ligar para polícia se estiver incomodada. Ela não fez isso porque não havia batucada”, relata.
Para a vítima, o discurso da vizinha mostra a intolerância religiosa. Liana é umbandista e juremeira (credo indígena que cultua a árvore Jurema), mas explica que a Casa das Negas não é um local religioso. Além de ser chamada de “macumbeira”, a suspeita gritava na rua que era “do bem”, enquanto dizia que Liana era “do mal”. Os vizinhos também jogaram água suja e café em sua família. A ação foi gravada pelas vítimas. Ela relata que os dois filhos estão assustados com a situação e a família se sente acuada na própria rua onde mora. “É uma posição bem clara. É um discurso que é enraizado num preconceito e essa agressão foi motivada por esse preconceito. Não é uma simples briga de vizinhos”.
Liana chamou a polícia para registrar a agressão e foi até o 7º Distrito Policial fazer um Boletim de Ocorrência (B.O.). De acordo com a Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), o 33º Distrito Policial é responsável pelas investigações do caso. Na nota enviada à reportagem, a secretaria afirma que a PM não localizou a suspeita quando foi acionada.
FONTE: Jornal O Povo em 23/08/2019