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UM POUCO DE HISTÓRIA: Alforria

A palavra vem do árabe Al-hurruâ, e significa liberdade do cativeiro concedida ao escravo. Durante o século XVII, alforria passou a ser utilizada como sinônimo de “manumitir”, do latim manumittere, “libertar as mãos” dos escravos, ou seja, dar liberdade.

Existiam três formas legais de um escravo comprovar o seu estado de forro ou alforriado. A primeira era pela pia batismal, a segunda era pelo testamento do antigo senhor, que ao morrer concedia a alforria, e, finalmente, pela aquisição de uma carta ou “papel de liberdade”, assinada pelo senhor. Essa carta poderia ser registrada em cartório, em livro de notas, ou apenas ser usada como um documento particular.

A alforria também podia ser gratuita, comprada ou concedida sob condição. Para comprar a alforria muitos escravos assumiam maior carga de trabalho para juntar o equivalente a seu preço e pagar ao senhor. No entanto, mesmo tendo o escravo a quantia equivalente ao seu valor, o senhor não era obrigado a concedê-la. Afinal, por ser herança do direito romano e costume entre os portugueses, o ato de alforriar era considerado uma concessão senhorial. E, mesmo quando era gratuita, muitas vezes a efetiva liberdade só era admitida após a morte do testador e, portanto, sem garantias. Já nas alforrias na pia batismal, sempre de crianças, é mais difícil saber se havia ou não pagamento, mas presume-se que a maioria tenha sido gratuita. Isso porque a alta mortalidade infantil inibia parentes de crianças de gastar dinheiro com a liberdade de uma vida incerta e, por outro lado, fazia com que os senhores ficassem mais dispostos a concedê-la. Em alforrias registradas em cartório, havia um grande número de “coartações”, exigências a serem cumpridas para a obtenção da liberdade.

Alguns estudos mostram que poucos eram os escravos que tinham acesso à liberdade, sendo possível estimá-los entre 0,5% e 2% da população escrava. Sabe-se também que as alforrias por testamento libertaram mais escravos gratuitamente do que as realizadas com “cartas de liberdade”. Além disso, tradicionalmente, considerou-se que a maioria dos alforriados eram velhos enfermos, mas a historiografia atual mostra que as verdadeiras privilegiadas eram as mulheres. O preço delas era inferior ao dos homens e, por isso, muito mais fácil de ser pago. Tinham ainda maior possibilidade de estabelecer laços afetivos com seus senhores, pois atuavam como domésticas, amas-de-leite ou amantes. Além disso, por ser a mulher responsável natural pela reprodução da escravidão, era comum que a sua família centrasse mais esforços em alforriá-la. Dessa forma, seus filhos já nasceriam livres.

Os estudiosos do período colonial também apontam que os escravos urbanos e os das zonas mineradoras eram mais contemplados pela alforria do que os das áreas rurais. Os escravos urbanos tinham maior qualificação profissional e trabalhavam “ao ganho”, ou seja, em serviços pagos na cidade. Assim, ainda que o “ganho” fosse entregue ao seu senhor, os escravos urbanos tinham, em comparação aos escravos rurais, maiores oportunidades de acumular recursos. No caso dos mineradores, havia uma legislação específica que lhes permitia comprar a liberdade mesmo contra a vontade do seu senhor. Caso achassem um diamante acima de 20 quilates, seu senhor era indenizado com 400 mil réis. Já o escravo que denunciasse a sonegação de diamantes ao senhor seria libertado e receberia um prêmio de 200 mil réis (Lei de 1734).

Em relação à vida e situação social de homens e mulheres que foram contemplados com a alforria, os historiadores, de modo geral, registram a pobreza como característica predominante. Um dos motivos seria que, por terem juntado durante anos o valor correspondente a sua liberdade, nada mais lhes restaria. Mas pesquisas recentes mostram que, na verdade, existiam forros endinheirados, principalmente mulheres. Muitos, aliás, se tornaram proprietários de bens e de outros escravos.

FONTE: Boletim Territórios Negros, v. 6, n. 26. nov./ dez. 2006

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