Atividade integrou a programação paralela à Cúpula dos Povos, fortalecendo a articulação de comunidades de axé na defesa da justiça climática e da preservação dos territórios tradicionais.
No dia 15 de novembro, a Pedra de Xangô, em Salvador, recebeu o encontro Reforçando Laços: Terreiros pelo Clima, atividade realizada por KOINONIA no contexto da mobilização nacional da Cúpula dos Povos. Reunindo 56 participantes de diferentes casas de axé, o evento promoveu um espaço de escuta, reflexão e construção coletiva sobre os desafios ambientais enfrentados pelos terreiros e a urgência de ações conjuntas por justiça climática.
A programação foi conduzida pelos mediadores Ícaro Santos (Nzó Maza Mia Mikaia) e Candai Calmon (KOINONIA), que deram boas-vindas ao grupo. Em seguida, Yá Neci Neves da Silva (Torrum Gunan) guiou uma mística de abertura diante da Pedra de Xangô, entoando cantos das nações Ketu/Nagô, Angola e Jeje. O momento reforçou a força simbólica e espiritual do território, reconhecido como espaço sagrado ameaçado por violações ambientais e urbanísticas.
A participação da juventude foi um dos eixos centrais do encontro. Os jovens sacerdotes Mameto Ndenge Jéssica Barreto e Babá Pedro Mendes destacaram o papel estratégico das novas gerações na defesa dos territórios de axé e no enfrentamento ao racismo ambiental. Para ele, proteger o meio ambiente é uma dimensão inseparável da luta pelo direito à existência das tradições de matriz africana. Segundo ele, os impactos do racismo ambiental são sentidos cotidianamente nos terreiros, seja pela redução de áreas verdes, pela dificuldade de acesso à água ou pela escassez de folhas sagradas. “O papel das novas gerações é continuar o legado dos ancestrais, mas também abrir novos caminhos. Questionar, denunciar, comunicar, educar e agir. Trazemos coragem e velocidade para uma luta que é antiga, mas que hoje é urgente. A juventude de axé não só segue o axé, ela leva o axé para o futuro”, concluiu o Babá.
Na mesma perspectiva, Mameto Ndenge Jéssica Barreto reforçou que falar de justiça climática nos terreiros não é tratar de um tema recente, mas retomar uma missão ancestral. Para ela, o desequilíbrio climático representa uma agressão direta às forças que sustentam a fé e os modos de vida do povo de axé. Ela destacou o papel da juventude como guardiã desse espaço sagrado. “Se a natureza é templo, então a juventude é guardiã. E ser guardião não é escolha, é chamado!”, afirmou.
O Ogan Leonel Monteiro da Associação Afro Ameríndia (AFA) também contribuí com denúncias sobre ameaças às áreas verdes na região de Mussurunga e no entorno da própria Pedra de Xangô. O grupo reforçou a necessidade de vigilância e acionamento das autoridades quando houver violações socioambientais.
A diretora executiva de KOINONIA, Iyá Ana Gualberto, apresentou reflexões sobre terreiros, clima e ações emergenciais. Sua fala destacou como cuidado ambiental, preservação do território, separação de resíduos, manutenção das águas e mobilização política são dimensões interligadas da prática cotidiana de cada casa de axé.
A partir desse debate, participantes se dividiram em grupos para discutir o tema “Nosso terreiro, nosso território: o que enfrentamos, o que fazemos e o que precisamos?”. As sínteses revelaram desafios comuns, entre eles especulação imobiliária, violência religiosa, invasões de áreas sagradas, falta de saneamento básico e fragilidade no acesso a informações sobre políticas públicas. Entre as propostas coletadas, destacam-se a criação de uma rede de terreiros, a estruturação de novas formas de defesa territorial, mobilização juvenil e iniciativas de cuidado ambiental como limpeza de lagoas e retirada de lixo.
O encontro terminou com a partilha dos grupos e o sentimento de que fortalecer vínculos entre casas, nações e gerações é fundamental para enfrentar as ameaças que recaem sobre os territórios de axé. A edição do encontro Reforçando Laços reafirmou o compromisso de KOINONIA em apoiar processos de formação, articulação e defesa dos direitos das comunidades religiosas de matriz africana, ampliando o diálogo entre clima, território e justiça social.

