O que mais se poderia dizer do Pepe Mujica, daquele que se tornou íntimo sem querer, universal por ser singular, querido em todas as faixas etárias por ser particular ao extremo?
Foi-se aquele de incrível capacidade de falar das estrelas vendo uma flor no canto, uma pedra bonita e rostos, mãos, gente de carne e osso e trabalho e vida, com seus amores, suas subjetividades.
O Pepe se sentia mais um, parecia um alguém de quem esperar igualdade, um aperto de mão, um olhar e escuta atenta, nunca a indiferença ou a invisibilidade.
Assim o dom do Mujica, Dom Pepe, senhor das palavras fáceis para multidões e um cultivador de afetos, esses que fazem a vida ter sentidos e nos torna capazes de entender profundamente o que nossas irmãs e irmãos andinos forjaram por séculos como visão de mundo, o “Bem Viver”.
Outras pessoas de nós sentimos essa presença que torna a materialidade infinitamente maior que o momento e o tempo infinito numa pausa para ouvir quem quer se expressar.
Se houvesse um verbo mujicar ou pepear não teria um verbete, pois essas passagens extraordinárias de seres pelo mundo não se põem como uma lógica ou uma decifração, são como bússolas, pois nasceram para ser símbolos de que o impossível por vezes acontece e de que a cegueira em momentos sombrios, turvos e ameaçadores pode mirar pelo avesso a ordem pseudonatural das coisas, ver brechas onde só vemos rachaduras.
Calculo como um senhor branco, de traços europeizados, pode encontrar-se no mundo das antevisões com o brilho reluzentemente negro de um Nêgo Bispo (Antônio Bispo dos Santos), na sua defesa dura e terna do contracolonialismo antirracista dos quilombos, do viver afrocentrado tal qual um bem viver indígena. Perdemos Bispo e agora o outro, o Pepe dos dons, e seguimos pessoas herdeiras de um e de outro – que certamente em nossas crenças mais profundas ficarão para a história que importa e como nossos novos ancestrais.
KOINONIA em sua identidade e nome segue querendo ser como eles um dia, um ponto de luz em meio às crises, humildemente um sinal de que ser Comunidade é possível e de que ser Comunhão é a única forma de sermos humanas
Rafael Soares de Oliveira
Secretário de Planejamento e Cooperação