Demolição do terreiro Ilê Axé Oyá Onira’D revela violações à liberdade religiosa e alerta para urgência de reparação

No dia 9 de junho de 2025, o terreiro Ilê Axé Oyá Onira’D, localizado há oito anos no Parque Metropolitano de Pituaçu, em Salvador (BA), foi demolido por uma ação coordenada pelo Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos da Bahia (Inema), com apoio de secretarias estaduais e da Polícia Militar. A comunidade religiosa denuncia que a demolição ocorreu sem aviso prévio e de forma desrespeitosa, com objetos sagrados sendo retirados do local e jogados ao chão, muitos deles danificados, sem a realização dos rituais necessários à sua retirada.

A ação, justificada pelo Inema sob o argumento de que o local estava em uma Área de Proteção Permanente (APP), gerou ampla mobilização de lideranças religiosas, entidades de direitos humanos e do Ministério Público da Bahia (MPBA). O órgão emitiu recomendação exigindo a interrupção das intervenções e um prazo de 15 dias para que os ritos litúrgicos fossem cumpridos de forma adequada, sem novas violações à liberdade religiosa.

Ogan Elias Conceição, coordenador do Conselho Inter-religioso da Bahia (CONIRB), que acompanha o caso desde o início, reforça a gravidade da ação. Segundo ele, a demolição representa uma série de violações constitucionais e reforça o racismo religioso e ambiental. “O que aconteceu ali não respeitou, em primeiro lugar, a religiosidade, não respeitou a comunidade, não respeitou o direito do cidadão. A integridade, a moral e o respeito foram violados”, afirma.

Elias também destaca que a comunidade do Ilê Axé Oyá Onira’D é composta por pessoas de diversos grupos sociais vulneráveis, incluindo juventudes, população LGBTQIAPN+, pessoas com deficiência e mulheres negras. “A partir daí, imagine o grau e a extensão da violação de direitos que ali aconteceu”, pontua.

Apesar das inúmeras tentativas anteriores de diálogo entre a comunidade religiosa e os órgãos do governo estadual, Elias relata que não houve encaminhamentos formais para garantir um processo de remoção seguro e respeitoso. “Não se tratava de simplesmente retirar móveis de uma casa. O que está em jogo são assentamentos sagrados, objetos litúrgicos que exigem ritos específicos para serem movidos. Não é só pegar, guardar e ir embora. Não é assim que funciona com religiosidade de matriz africana”.

O coordenador do CONIRB alerta que o prazo determinado pelo MPBA segue sendo insuficiente e que a reparação ainda está distante de se concretizar. “Estamos buscando ampliar esse prazo e garantir proteção jurídica. Fomos visitar um terreno que pode acolher a reconstrução do terreiro, mas ainda dependemos da formalização do compromisso do Estado. A violação aconteceu, o crime aconteceu, e a reparação precisa chegar rápido”, afirma.

KOINONIA Presença Ecumênica e Serviço, por meio de sua participação no Conselho Inter-religioso da Bahia, tem acompanhado o caso e se soma às vozes que exigem justiça, reparação e políticas públicas de proteção aos terreiros como patrimônio cultural, espiritual e territorial. Para a instituição, o episódio escancara mais uma vez o quanto os direitos das comunidades de matriz africana seguem sendo sistematicamente desrespeitados e invisibilizados pelo Estado.

A luta pelo reconhecimento do terreiro Ilê Axé Oyá Onira’D é um símbolo da luta maior por liberdade religiosa, justiça social e pelo direito das comunidades tradicionais de existir em plenitude, com dignidade e respeito.

Texto de Natasha Arsenio, jornalista de KOINONIA.

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