Nos dias 18 e 19 de outubro, vinte quilombolas de oito comunidades do Estado do Rio de Janeiro participaram, no escritório de KOINONIA, de uma oficina de Comunicação voltada ao fortalecimento das estratégias de incidência e à defesa do direito à comunicação como um direito humano fundamental. As comunidades presentes integram os projetos Quilombolas: agentes de ação pelo clima e Comércio com Identidade, ambos realizados por KOINONIA em parceria com a ACQUILERJ.
A atividade foi conduzida por Ivana Dorali, jornalista, pedagoga e educomunicadora, mestranda em Comunicação Digital e Cultura de Dados pela FGV e coordenadora de Comunicação da Mandata da Deputada Dani Balbi. Ivana lançou mão de sua ampla experiência na formação de jovens e coletivos em comunicação popular, comunitária e ativista, contando com o apoio dos gêmeos Romulo Amorim e Rudson Amorim, do Observatório de Favelas.
Comunicação: um direito fundamental
No primeiro dia, o conteúdo foi mais expositivo, abordando as diferentes formas de comunicação – comercial, popular, de causa e ativista – e os desafios contemporâneos ligados à desinformação e às fake news. As pessoas quilombolas participantes refletiram sobre como a comunicação pode ser usada como ferramenta política e de transformação social, especialmente em contextos de luta por direitos. Também foram discutidas estratégias de segurança digital e cuidados na divulgação de conteúdos sensíveis, como denúncias e mobilizações.
“A comunicação pode ser um instrumento poderoso de denúncia de violações, mas é preciso ter certos cuidados para não expor demais uma pessoa ou comunidade. Segurança em primeiro lugar!”, pontuou Ivana, alertando para os potenciais riscos a que as comunidades estão sujeitas, principalmente quando os direitos são violados por grupos ou agentes poderosos.
Para Renato Kinupa, da comunidade de Bongaba, que também pertence à diretoria da ACQUILERJ e é um dos agentes quilombolas pelo clima, a oficina teve um caráter estratégico. “Tivemos um rico debate sobre a função social da comunicação, os limites da liberdade de expressão, conceitos constitucionais e a crítica necessária ao monopólio midiático e sua manipulação”.
Outro ponto de destaque foi o debate sobre como aprimorar a divulgação de produtos e iniciativas econômicas das comunidades quilombolas, fortalecendo o vínculo entre comunicação e geração de renda nos territórios, mas sem que isso signifique esquecer da luta.
Como relatou Crislane Rodrigues Rosa, uma jovem estilista da comunidade de Boa Esperança, em Areal, que esbanja talento com suas roupas inspiradas na ancestralidade quilombola. Para ela, as roupas e os desfiles que organiza têm um poder mobilizador. “Eu vejo a moda como uma forma de resistência também. Muitas vezes a gente denuncia o descaso dos governos, mas nem sempre a comunidade é escutada. As roupas e os desfiles acabam sendo uma maneira de comunicar, que muitas vezes gera mais adesão à nossa causa, inclusive entre as pessoas da própria comunidade. Com o sucesso dos eventos, todo mundo fica mais unido, o que é fundamental para seguir na luta”, observa.
Agentes pelo clima em ação
O segundo dia foi dedicado ao “Mão na Massa”, momento prático em que quilombolas puderam exercitar o aprendizado com a produção de vídeos, textos e imagens, utilizando celulares e ferramentas gratuitas. Após o compartilhamento de técnicas para ampliar o alcance das mensagens, o grupo foi dividido em cinco equipes, cada uma responsável por criar um conteúdo próprio, com base em temas e vivências dos territórios. No final, foram produzidos cinco conteúdos diferentes, mas todos tendo como mote principal a valorização das comunidades quilombolas enquanto guardiãs de saberes ancestrais e da natureza. 
Um dos grupos foi formado pelas lideranças quilombolas que participam do projeto Quilombolas: agentes de ação pelo clima. Com a assessoria direta de Rudson Amorim, o grupo conseguiu elaborar a primeira postagem da campanha rumo à I Cúpula das Vozes Quilombolas pelo Clima: Rio de Janeiro, que acontecerá na Fundição Progresso no dia 15 de novembro. O evento reunirá comunidades, sociedade civil e agentes públicos para falar da importância de colocar a pauta quilombola na centralidade da agenda climática no Rio de Janeiro, mas também na esfera nacional e internacional.
“Os ensinamentos foram de muita importância. Ouvir as explicações sobre como usar os aplicativos, como fazer os vídeos, montar um vídeo, fazer os cortes certos para cada postagem, tudo valeu super a pena. E já estou colocando alguns aprendizados em prática”, declarou Regina Soares, liderança da comunidade Fazenda Espírito Santo, de Cabo Frio, que participa tanto do projeto Comércio com Identidade quanto do Quilombolas: agentes de ação pelo clima.
Educação popular: trilhando futuros
Ao final da oficina, o sentimento coletivo foi de entusiasmo e gratidão. As pessoas participantes destacaram a importância de compreender a comunicação como instrumento de resistência, visibilidade e emancipação. Para o grupo facilitador, a formação cumpriu o papel de fortalecer o protagonismo quilombola na produção de narrativas próprias, conectando saberes tradicionais e tecnologias contemporâneas.
Uma das falas que reflete esse sentimento foi de Iane Lima, da Ilha da Marambaia. Ela disse que estava hesitante em seguir uma carreira na comunicação popular, mas que, depois da oficina, ela já não tinha mais dúvidas.
“Para nós, essa oficina foi muito mais do que um momento de aprendizado, foi um espaço de troca, escuta e fortalecimento das nossas vozes. Saímos de lá mais conscientes do poder da comunicação popular e mais preparados para defender nossas identidades e os direitos dos nossos territórios”, concluiu Iane, que também é uma liderança que participa dos dois projetos de KOINONIA em curso no Rio de Janeiro.
