Por Rosa Peralta
Assessora de Relações Institucionais de KOINONIA
Entre os dias 5 e 6 de abril, lideranças das comunidades quilombolas envolvidas no projeto Comércio com Identidade* se reuniram na sede de KOINONIA, no Rio de Janeiro. O encontro contou também com a presença de Bia Nunes, presidenta da Associação de Comunidades Quilombolas do Rio de Janeiro (Acquilerj).
Foi um momento em que algumas lideranças puderam se apresentar e outras se reencontrar. Vieram de diversos municípios e regiões do estado, como Araruama, Cabo Frio, Magé, Quatis, Rio Claro e Mangaratiba (ver lista das comunidades ao final desta matéria) de onde trouxeram uma pequena amostra de sua identidade quilombola, seja por meio de produções agrícolas, plantas medicinais, publicações sobre suas comunidades, entre outros objetos.
O objetivo do encontro era apresentar o projeto, que prevê o fortalecimento das economias locais por meio da valorização da identidade cultural das comunidades negras tradicionais no Rio de Janeiro e na Bahia. São comunidades que resistiram historicamente ao racismo e à degradação de seus territórios negros. Todas inseridas no bioma Mata Atlântica, essas comunidades mantiveram e desenvolveram práticas produtivas que conciliaram a sua reprodução social e a preservação ambiental.
Os relatos feito ao longo do encontro demonstram os inúmeros obstáculos e desafios comuns que enfrentam, principalmente em relação a transporte, educação, saúde e incentivos públicos à produção local.
Por outro lado, as lideranças elencaram as riquezas e potencialidades das comunidades que permitiram que elas tenham conseguido até hoje permanecer em seus territórios e defender seus modos de vida e o meio ambiente.
Um dos pontos altos do encontro foi quando Vera Regina dos Santos, da comunidade de Prodígio, em Araruama, foi depositando no centro da sala uma grande variedade de plantas alimentícias e medicinais que ela cultiva em seu quintal. “Na verdade, eu não trouxe tudo o que temos. Não dava para trazer, mas estou aberta a receber vocês lá na minha terra pra mostrar”, disse, orgulhosa. Vera também trouxe um pilão usado por sua tataravó para moer plantas medicinais, um objeto com mais de 200 anos que incorpora a história do quilombo Prodígio.
Projeto construído em colaboração com as comunidades
As atividades do projeto foram pensadas para envolver não apenas os aspectos da produção, mas também para identificar e encontrar soluções para o escoamento do que é produzido pelas comunidades considerando as especificidades de cada contexto e região.
Após a apresentação das metas e estratégias do projeto, as comunidades puderam tirar dúvidas e compartilhar sua visão sobre a iniciativa.
“Achei muito positivo que o projeto foi feito de uma forma que permite se adaptar à realidade de cada comunidade”, declarou Benedito Leite, do quilombo Alto da Serra, situado em Lídice, distrito de Rio Claro. Benedito também lembrou da atuação de longa data de KOINONIA na comunidade, que começou em um momento de conflito e ameaça em 2005.
Jaqueline Alves, do quilombo da Marambaia, em Mangaratiba, também enfatizou a relação de confiança: “KOINONIA nos apoiou de várias maneiras, sendo que algo muito importante foi abrir possibilidades de a comunidade ter outras parcerias, que contribuíram para a nossa titulação. Ficamos contentes de ter mais esta oportunidade.”
Benedito Leite, quilombo Alto da Serra, Rio Claro (RJ), e Jaqueline Alves, quilombo Ilha da Marambaia, Mangaratiba (RJ)
Segundo Ana Gualberto, Diretora-Executiva de KOINONIA: “O sucesso do projeto vai depender deste tipo de diálogo direto e da colaboração estreita com as comunidades. Também é importante ressaltar que a valorização da identidade quilombola terá um efeito tanto na agregação de valor dos produtos quanto no combate ao racismo da nossa sociedade”.
Próximos passos
Nas próximas semana de abril, a equipe do projeto começará a visitar as comunidades para realizar diagnósticos e coletar outras informações preliminares junto a lideranças locais. Desde março, está sendo conduzida uma pesquisa acerca das políticas públicas em nível federal, estadual e municipal que são pertinentes para as comunidades quilombolas. Assim, durante as idas a campo, será possível identificar também quais políticas públicas são efetivamente acessadas por cada quilombo e discutir estratégias de ampliar esse leque para a melhoria da qualidade de vida das famílias quilombolas.
Lista das comunidades do estado do Rio de Janeiro presentes no encontro
- Alto da Serra do Mar – Rio Claro
- Boa Esperança – Areal
- Fazenda Espírito Santo – Cabo Frio
- Maria Conga – Magé
- Santa Rita do Bracuí – Angra dos Reis
- Ilha da Marambaia – Mangaratiba
- Santa Justina – Mangaratiba
- Santana – Quatis
- Prodígio – Araruama
Infelizmente, a comunidade de Caveira Botafogo, de Cabo Frio, não pôde enviar representante.
*O projeto Comércio com Identidade é financiado com recursos advindos do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado entre o Grupo Carrefour, o Ministério Público Federal e organizações da sociedade civil para a implementação de projetos de combate ao racismo. Saiba mais em: https://www.grupocarrefourbrasil.com.br/nao-vamos-esquecer/.