Angélica Basthi
Quilombolas e ONGs pedem intervenção da ONU no caso Marambaia
A Campanha Marambaia Livre, composta por 18 organizações e movimentos sociais, encaminhou denúncia às Nações Unidas sobre as graves violações de direitos humanos que vêm ocorrendo contra os quilombolas da Ilha da Marambaia, em Itacuruçá (RJ). Desde a década de 1970, quando a Marinha do Brasil assumiu a administração da Ilha, os remanescentes de quilombos estão impedidos de construir, reparar ou ampliar suas casas e ainda realizar pescas em nome da segurança nacional.
O informe relata as sistemáticas violações ao direito à titulação da terra, à moradia adequada e ameaça de despejos forçados aos moradores remanescentes de quilombolas da Ilha. O documento foi encaminhado ao Representante do Alto Secretariado de Direitos Humanos de Deslocamentos Internos, Walter Kälin, e ao Relator Especial sobre Formas Contemporâneas de Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Formas Relacionadas de Intolerância , Doudou Diene.
A denúncia está sendo enviada às Nações Unidas dois meses após o Tribunal Regional Federal do Rio de Janeiro (TRJ) acatar o pedido de suspensão de segurança solicitado pela União. O recurso jurídico – criado em 1969 em plena ditadura militar e ao qual somente o governo tem acesso – foi acatado pelo TRJ suspendendo os efeitos da interpretação do juiz da Vara Federal de Angra dos Reis, Raffaele Felice Pirro, favorável à conclusão dos procedimentos – no prazo de um ano – para a titulação das terras dos quilombolas da Ilha da Marambaia.
O informe faz um breve histórico sobre a presença dos remanescentes de quilombos na Ilha, cujas comunidades foram organizadas entre os anos 1532 e 1888, período
Desde então, os quilombolas ocupavam a Ilha pacificamente, até a chegada da Marinha, em 1971. Os militares restringiram visitas de familiares e vetaram as atividades de agricultura e pesca. No entanto, enquanto proibia a comunidade de realizar suas atividades, a Marinha do Brasil construía estradas, depósitos de lixo, pista de pouso e manobra. Tais atividades vêm afetando sistematicamente os sítios arqueológicos da região, cemitério, incluindo a área residencial.
Batalha jurídica
A batalha judicial começou em 1997, quando os militares passaram a recorrer a ações judiciais contra os moradores, qualificando-os de invasores. Até 1999, muitas famílias foram expulsas e suas casas demolidas.
Em 2002, o Ministério Público Federal contestou as ações da Marinha entrando com uma Ação Civil Pública contra a União e a Fundação Cultural Palmares. No mesmo ano, a Fundação Palmares assinou contrato com a organização civil e ecumênica Koinonia para elaborar relatório técnico de identificação e demarcação dos limites dos territórios quilombolas. Em
Há pouco mais de um ano, uma comissão federal apresentou uma proposta de delimitação da área que reduzia drasticamente as terras pertencentes à comunidade e não atendia as necessidades básicas dos moradores. A proposta não foi aceita. Recentemente, a Marinha intimou sete moradores a depor (entre eles, o casal Renata Mariano e Lázaro Santana), porque, amparados por uma decisão judicial, construíram casas ou retornaram à Ilha. Uma clara tentativa de criminalização dessas ações. Hoje a Ilha da Marambaia integra 14 praias e abriga 600 pessoas distribuídas em 90 casas.
Além da ONU, a denúncia também está sendo encaminhada para diversas autoridades brasileiras, entre elas a Casa Civil, Secretaria Especial de Direitos Humanos, a Secretaria de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) e o Incra.
Lista das entidades e representantes das associações quilombolas que integram a Campanha Marambaia Livre!
- Associação de Remanescentes de Quilombo da Ilha da Marambaia (ARQIMAR)
- Associação de Comunidades Quilombolas do Estado do Rio de Janeiro (ACQUILERJ)
- Coordenação Nacional das Comunidades de Quilombos (CONAQ)
- KOINONIA Presença Ecumênica e Serviço
- Projeto de Direitos Econômicos Sociais e Culturais da FASE (DESC/FASE)
- Centro de Articulação de Populações Marginalizadas (CEAP)
- CRIOLA
- Centro de Assessoria Jurídica Popular Mariana Criola
- Centro Pelo Direito à Moradia Contra Despejos (COHRE)
- Grupo de Defesa Ambiental e Social de Itacuruçá (GDASI)
- Instituto de Estudos Socioeconômicos (INESC)
- Rede Nacional de Advogados Populares (RENAP)
- Justiça Global
- Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (CONIC)
- Comissão Pró-Índio de São Paulo
- Associação Brasileira de Antropologia (ABA)
- Grupo Tortura Nunca Mais
- HUMANITAS – Organização para Direitos Humanos e Cidadania
Angélica Basthi, jornalista da Justiça Global.