Por Pedro Zuazo
Um terreiro de candomblé foi invadido e depredado no fim da manhã desta quinta-feira, em Cordovil, na Zona Norte do Rio, de acordo com a Comissão de Combate à Intolerância Religiosa. O barracão fica na Rua Ministro Pinto da Luz, no acesso à Cidade Alta. Segundo relatos, a mãe de santo Didi D Yemanjá foi retirada à força do local e conduzida para fora da comunidade por traficantes armados.
— A mãe de santo foi escoltada até o ponto de ônibus na Av. Brasil, com os filhos. Ouviram os bandidos dizerem que ela estava “Botando esse negócio de religião, que ela sabe que não pode” — conta uma pessoa próxima à vítima, que prefere não ser identificada.
De acordo com moradores, após depredarem o espaço, bandidos ficaram rondando a região fortemente armados. Uma filha de santo, que não sabia do ocorrido, caminhava em direção ao barracão, quando foi avisada por vizinhos que deveria tomar cuidado. O clima é de medo entre os religiosos de matriz africana.
Apreensiva diante de uma possível represália, mãe Didi não havia decidido, até a publicação desta reportagem, se iria registrar a ocorrência na polícia. Ela relata que nos últimos meses os candomblecistas eram impedidos de circular com trajes brancos nas ruas da comunidade.
— Antes a gente podia sair com roupa de santo na rua. Hoje, já não pode mais ficar de saia ou roupa branca. Todos os (religiosos) conhecidos já tinham fechado suas casas. Infelizmente, somos mais uma vítima dessa intolerância. É triste, mas a gente não vai perder a fé. Estamos muito machucados, mas a fé ninguém vai conseguir tirar de nós. Podem quebrar o tijolo, quebrar o barro, quebrar o assentamento. Mas o orixá a gente carrega na cabeça, no coração — diz.
O babalaô Ivanir dos Santos, representante de movimentos contra a intolerância religiosa, lamenta o caso e critica a falta de ações concretas por parte das autoridades para combater crimes como esse.
— Essa estatística vem aumentando e nós não estamos vendo uma ação concreta e firme do estado para conter essa violência. Estamos preocupados com outras lideranças religiosas daquela região. Lamento muito. Qual é a medida efetiva que está sendo tomada para proteção dos nossos religiosos nessas áreas? — diz Ivanir.
No início do mês, o Centro Espírita Caboclo Pena Branca, localizado em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, foi depredado e teve alguns compartimentos incendiados. Depois do ataque, o sacerdote Sergio Malafaia D’Ogum ainda não conseguiu restabelecer as atividades no local.
O estado do Rio registrou um aumento de 56% no número de casos de intolerância religiosa em comparação aos quatros primeiros meses de 2017. De acordo com a Secretaria de Direitos Humanos e Políticas para Mulheres e Idosos (SEDHMI), houve 25 registros em 2018, contra 16 no mesmo período do ano passado. Ainda segundo a secretaria, do início de 2017 até o dia 20 de abril deste ano, foram contabilizados 112 casos.
Em nota, a SEDHMI afirma que colocou-se à disposição da Mãe Didi, oferecendo assistência jurídica e psicossocial à vítima. “A SEDHMI também está disponível para acompanhar a religiosa até a delegacia para o registrar o caso”, diz o órgão.
De acordo com a nota, por conta do aumento nos casos de intolerância religiosa, será realizado na próxima segunda-feira o I Fórum Itinerante de Defesa e Promoção da Liberdade Religiosa. O evento percorrerá todos os locais do Rio de Janeiro em que ocorreram casos desse tipo de crime, para apoiar e ouvir as vítimas.
FONTE: Jornal Extra em 31/05/2018