Francia Márquez é a vice-presidente da Colômbia

Foto: Reprodução da Internet

Por Ana Gualberto*

Dezenove de junho de 2022. Ontem vi o grande Obá dançar no Axé Abassá de Ogum, terreiro fundado por Mãe Gilda de Ogum, ancestral que teve sua morte marcada pela luta contra o ódio e intolerância religiosa em Salvador, Bahia. Hoje escrevo este texto emocionada por saber que Francia Márquez é a vice-presidente da Colômbia e governará junto com o ex-guerrilheiro Gustavo Petro.

Ok Ana, mas por que essa emoção toda?

Você já viu uma foto ou vídeo de Francia Márquez? Desafio você que me lê a olhá-la e não enxergar uma mulher negra conhecida sua. Ela sou eu, são minhas irmãs Elaine e Ana Paula, é minha mãe Lucia (in memoriam), é minha iyalorixá Jaciara Ribeiro, é Dona Moça, Marilene, Del, Ana Celsa, Vania Guerra, Selma Dealdina, Makota Celinha, Benilda Brito, Lindinalva de Paula, Suely Santos, Lis Santos, Lucia Vasconcelos … e todas as companheiras que me dão régua e compasso para ser quem sou.

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Mas vamos ao que contam sobre ela: advogada, ativista dos direitos humanos, com destaque a ações de proteção ao meio ambiente e das comunidades negras tradicionais, da qual ela faz parte. Nasceu em La Toma, região oeste da Colômbia, liderou um movimento de resistência à exploração de minérios na região, o que lhe rendeu um prêmio de reconhecimento a seu ativismo em 2018. Tem 40 anos, é mãe solo, trabalhou como doméstica para poder custear seus estudos. Tenho certeza que você está vendo muitas, muitas mulheres nesta descrição, porque é isso mesmo: ela é o espelho de muitas!

Aprendi a sonhar com um mundo em que eu possa ser quem sou, com todas as minhas identidades, por meio de minha mãe Lucia, que se encantou há 13 anos. Ela me ensinou: 1. O racismo é base de toda a desigualdade; 2. O sonho nos impulsiona a construir; 3. Se sonhamos juntos podemos ir mais longe; 4. Sempre vale a pena acreditar nas mudanças. E muitas outras coisas, mas hoje destaco estas.

A vida é tão boa que me deu outra mãe, minha iyalorixá e amiga Jaciara Ribeiro, que reafirma isso tudo, em sua vida, sua ação política e ancestral, e me diz que o sonho dela era criar o Ministério do Amor, onde ela seria a Ministra, na estrutura executiva brasileira. Por meio deste ministério realizaríamos ações efetivas de cuidado e amor, construiríamos pontes de afeto real… E olha: tenho certeza que as mazelas sociais mais profundas seriam curadas por este ministério.

Não tenho nenhuma dúvida que se a revolução real vier, ela virá das mãos de mulheres, e mulheres pretas, porque nosso projeto de mundo é inclusivo e baseado no afeto.

Sem colocar todo peso do mundo nas mãos da irmã Francia Márquez, pois a gente entende como o sistema cria mecanismos para nos frear, mas que a chegada dela sirva de espelho para a chegada de muitas outras. Que nós, mulheres negras, possamos nos ver nos espaços de poder e tomada de decisão. Que os aliadxs brancxs honrem a luta antirracista elegendo mulheres negras pra representar a todas as pessoas.

E voltando ao início, porque meu pensamento é circular mesmo: dancei, gritei e saudei o grande rei de Oyó que se recria no Brasil, Xangô. O grande politico que foi capaz de unificar reinos, fazer alianças, fazer efetivamente política. Que essa energia nos impulsione na construção de uma sociedade com mais equidade e afeto.

Salve Xangô! Salve a força transmutadora das Ayabas! Salve a ancestralidade das Américas!!!

Foto: Reprodução da Internet


*Diretora Executiva de KOINONIA
Egbom D’Oxun Ilê Axé Ofá Omi Layó
Coletivo Iya Akobiode
Rede de Mulheres Negras BA
Nzinga Coletivo de Mulheres Negras BH