Em junho de 2015, a menina Kaylane Coelho levou uma pedrada quando saía de um culto de candomblé no seu bairro, Vila da Penha. Na época, Kaylane tinha apenas 11 anos e viu sua vida mudar completamente. Ela e sua avó Kathia Marinho, que é mãe de santo, viraram porta-vozes da luta contra a intolerância religiosa no Rio e no Brasil a fora.
O curta-metragem ‘Respeito’ acompanha o dia a dia de Kaylane, sua relação com os amigos na escola, com a espiritualidade e com a família. Enquanto ensaia um discurso para receber um prêmio em homenagem às crianças de axé, ela reflete sobre o ocorrido e mostra que sua rotina é de uma adolescente como outra qualquer.
No lançamento do curta-metragem no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ a coluna Juventude de Fé esteve presente e entrevistou os protagonistas dessa história.
Káthia Marinho, avó da menina Kaylane, argumentou que o processo educativo é fundamental para combater o preconceito e a intolerância religiosa. “O filme vai conscientizar os adultos. Temos um problema muito grande nas escolas. O professor evangélico professa a fé dele na sala de aula. A gente quer passar esse filme nas escolas, para mostrar que a imagem do diabo não pertence a nossa religião, não é nosso, eu não o conheço, ele não me representa. Quando alguém vê a Kaylane, vê ela como o diabo, é a macumbeira. Passar isso para as crianças vai ser muito legal para que elas começarem a entender que na realidade a gente trata de energias, e elas nunca podem ser ruins”.
A produção do filme nos permite ver nas cenas o cotidiano de uma adolescente de 14 anos. Ela na escola, com os amigos etc.. A diretora e roteirista de “Respeito”, Ana Pacheco, soube do caso pelas redes sociais e na primeira oportunidade pensou que a história da kaylane era necessária ser contada. Ana pontua que a “A perspectiva foi sempre de contar essa história pra outras crianças, o filme é didático, será passado em uma rede internacional, foi feito dessa forma para que qualquer criança que não sabe o que é o Brasil, o Candomblé, possa entender que aconteceu uma coisa muito impressionante com uma menina como eles. A raiz do preconceito vem de você não conhecer, você cria uma imagem, a partir da mídia, de algum orientador. Qual a razão que alguém tem em jogar uma pedra nela? Por que jogar uma pedra? O que ela fez para merecer que alguém jogue uma pedra nela?Quando você chega perto e vai saber quem é Kaylane, vai ver que ela é só uma menina”
Kaylane apontou para nós alguns dos sentimentos que evidencia a permanecia da sua luta contra o ódio e a intolerância. Ela nos fala sobre a sua experiência em ser a protagonista dessa história e o que acredita que esse filme possa impactar.
“Eu fiquei com muita vergonha, na época eu era muito estranha, fiquei com muita vergonha de me ver ali, mas foi por uma causa boa, valeu a pena gravar o curta. Mostrei para as pessoas que isso era importante e que isso não podia cair no esquecimento.
O que me lembra a todo tempo que boto a mão na minha cabeça, é a pedrada, que tu sente, tá elevado aqui, eu passo a mão na minha cabeça e dá para sentir, eu não vou esquecer, vou levar para minha vida toda.
O pessoal do meu axé está feliz, todo mundo do meu barracão passou no filme sendo eles mesmos! O preconceito não vence quando todo mundo se junta, o que é o preconceito no meio de tanta felicidade e tanto amor junto? Acho que não é nada né? Acho que isso é uma mensagem que o amor vence!” conclui Kaylane
O filme estará em um circuito escolar. Em breve passará por universidades, rodas de conversas e debates para deixar em destaque a urgência de uma nova cultura das relações afetivas. A Intolerância Religiosa é crime e só uma rede unificada de pessoas de bem, conseguirá entoar um canto de união e paz entre as mais variadas religiosidades.
*Walmyr Junior é morador de Marcílio Dias, no conjunto de favelas da Maré, é professor, membro do MNU e do Coletivo Enegrecer. Atuou como Conselheiro Nacional de Juventude (Conjuve). Integra a Pastoral Universitária da PUC-Rio. Representou a sociedade civil no encontro com o Papa Francisco no Theatro Municipal, durante a JMJ.
FONTE: Jornal do Brasil em 13/09/2017