Frente à COP 17 Durban e Rio+20: NÃO aos mecanismos de mercado como solução para o enfrentamento da crise ambiental e climática

Carolina Maciel

 Apesar dos sucessivos fracassos em relação às soluções de mercado propostas nos últimos quase 20 anos das negociações da UNFCCC, alguns governos, entre eles o Brasil, continuam insistindo em promover os mecanismos de mercado dentro do marco regulatório de clima para solução da crise climática, bem como rumo a economia verde proposta para ser discutida na Rio+20, em junho do próximo ano.

Desde a sua criação em 1992, o objetivo da Convenção de Clima é a de reduzir as emissões de gases de efeito estufa de modo que não se implique em risco aos sistemas naturais do planeta Terra, de acordo com o texto da UNFCCC visa “a estabilização das concentrações de gases de efeito estufa na atmosfera num nível que impeça uma interferência antrópica perigosa no sistema climático”. Este objetivo não conseguiu nem de perto ser atendido, ao contrário, o único instrumento jurídico vinculante, o Protocolo de Kyoto, que definiu o corte ínfimo de apenas 5,2% das emissões dos países do Norte (em relação aos níveis de 1990) para um período até 2012, corre o risco de não ter seu segundo período aprovado.
 
Foi demonstrado desde a criação de Kyoto que o foco do mesmo, ao invés de ser o de atender ao objetivo da Convenção, foi de institucionalizar o mercado de carbono no âmbito das Nações Unidas e no interior dos países signatários. Fica cada vez mais evidente que a criação do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo – dentro dos mecanismos de flexibilidade presentes em Kyoto – e sua implementação nos países em desenvolvimento vem aumentando os impactos locais negativos onde os projetos são instalados, ampliando situações de injustiça ambiental e de violações dos direitos humanos e não contribuem efetivamente para a redução de emissões.
 
Assim, os grandes beneficiários da crise climática e das políticas aprovadas no âmbito multilateral são as grandes corporações e o sistema financeiro internacional, que vem se renovando por meio dos instrumentos criados pela Convenção, como no caso do Banco Mundial que ganhou novo fôlego nos últimos anos com o tema climático e, mais atualmente, ao ser escolhido como tesoureiro do Fundo Verde de Clima da UNFCCC, mesmo com a oposição de vários países e da sociedade civil internacional.
 
Atualmente, após a criação do mecanismo de REDD+ na COP 16, no acordo de Cancun, o mercado de carbono se consolida como principal aposta para propostas em curso de financiamento para REDD+. As organizações e movimentos sociais que compõem o Grupo Carta de Belém e que lutam pela justiça ambiental e climática rechaçam o REDD+ como mecanismo de mercado de carbono que sirva também para compensar as emissões de gases dos países desenvolvidos. Estas organizações entendem que o mercado de carbono e o mecanismo de REDD+ são falsas soluções à crise climática e vão contra a necessidade dos países do Norte de assumirem suas responsabilidades e dívidas históricas com os países e povos do Sul e de reduzirem suas emissões, bem como transferem o foco das discussões da queima de combustíveis fósseis, verdadeiras responsáveis pelas mudanças climáticas atuais, para as florestas.
 
Enquanto o Brasil pretende se mostrar para o mundo como um grande exemplo de transição para a economia verde, no âmbito doméstico veem-se processos que demonstram exatamente o contrário do discurso apresentado. Por um lado, vemos o desmonte da legislação ambiental nacional, com a flexibilização do Código Florestal, com o PL 195/2011 sobre REDD+ e o PL 792/2007 de contratos de pagamentos por serviços ambientais, propostas que ultrapassam o modelo de incentivos promovidos por políticas públicas para a comercialização da biodiversidade e dos bens comuns, bem como fortalecendo o mercado de carbono a nível nacional por meio da criação de títulos representativos de estoques de carbono (Certificado de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal – CREDD) ou de florestas e da biodiversidade (Cota de Reserva Ambiental, contida na atual proposta do Código Florestal).
 
Por outro, está em curso um processo de carbonização da economia, com o aumento das emissões decorrentes do setor energético em função da ampliação da participação de termelétricas na matriz energética nacional e da exploração do pré-sal que triplicará a produção de petróleo e gás nos próximos dez anos. 
 
Além disso, o Grupo questiona como o Brasil irá cumprir suas metas voluntárias apresentadas em Copenhague, na COP 15, e aprovadas na Política Nacional de Mudanças Climáticas, com o aumento considerável do desmatamento da Amazônia e do Cerrado, fruto das medidas pré-aprovadas no novo Código Florestal.
 
Por estes e outros motivos o grupo Carta de Belém finaliza apontando que várias políticas e legislações estão sendo pensadas para serem finalizadas até a Rio+20, em junho do próximo ano, e isso sem um debate com a sociedade brasileira, ou grande parte dela, especialmente sem a participação das bases de organizações e movimentos sociais. A construção de um marco legal neste sentido poderá gerar um fato consumado e impossibilitar qualquer barganha nas negociações internacionais de clima e inviabilizar qualquer iniciativa futura de proteção da soberania nacional do Estado e de seus povos aos territórios, bem como de políticas que enfrentem de fato a crise climática por fora do mercado. 
 
Rejeitamos um regime de clima floresta-cêntrico!
 
Queremos a justiça ambiental e climática!
 
Defendemos a proteção das florestas e dos direitos dos povos que nela vivem!
 
Não ao REDD+!
 
Assinam:
 
ABA – Associação Brasileira de Agroecologia
 
Amigos da Terra Brasil
 
ANA Amazônia                             
 
AS-PTA
 
Articulação Pacari
 
CEAPAC – Centro de Apoio a Projetos de Ação Comunitária – PA
 
CEPEDES – Centro de Estudos e Pesquisas para o Desenvolvimento do Extremo Sul/BA
 
CIMI – Conselho Indigenista Missionário
 
FAOR – Fórum da Amazônia Oriental
 
FAMCOS – Federação das Associações de Moradores e Organizações Comunitárias de Santarém – PA
 
FASE
 
FECAP – Federação das Entidades comunitárias do Estado do Amapá – AM
 
Fetraf Brasil – Federação dos Trabalhadores/as da Agricultura Familiar
 
Fetraf Sul
 
 
Fórum Carajás
 
Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Social
 
Instituto Terramar
 
INESC – Instituto de Estudos Socioeconômicos
 
Instituto Mais Democracia
 
Jubileu Sul Brasil
 
Justiça nos Trilhos – MA
 
MACA – Movimento Anti-capitalista Amazônico
 
MMC – Movimento de Mulheres Camponesas
 
MMM- Marcha Mundial das Mulheres
 
MPA – Movimento dos Pequenos Agricultores
 
MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
 
Organização das Associações Comunitárias da Reserva Extrativista Tapajós-Arapiuns/ Tapajoara – PA
 
Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais
 
RBJA – Rede Brasileira de Justiça Ambiental
 
STTR Xapuri – AC
 
Terra de Direitos
 
Via Campesina Brasil
 
 
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