Segredos da Boa Aparência: desvenda preconceito contra mulheres negras

Carolina Maciel

Lançamento do livro acontece na quinta-feira, dia 15 de setembro, às 18h, na Livraria da Travessa do centro.
 
Muito antes do “politicamente correto”, a sociedade brasileira já havia criado termos próprios para nomear aquilo que não precisava (ou deveria) ser dito. Assim, até a década de 1980, anúncios de emprego publicados em jornais com frequência exigiam “boa aparência”, sobretudo para empregos femininos. Por trás desse requisito escondia-se um conjunto de (pre) conceitos que definiram trajetórias profissionais e pessoais de mulheres negras nas grandes cidades brasileiras em grande parte do século 20.
 
No livro “Segredos da boa aparência – da ‘cor’ à ‘boa aparência’ no mundo do trabalho carioca (1930-1950)”, a professora Caetana Damasceno realiza a primeira missão da Antropologia que é estranhar o familiar e questiona: o que é, afinal, “boa aparência”? Em que momento bom e belo passaram a ser sinônimos e por que, no mercado de trabalho, isso significou ser branco, ou o mais próximo possível disso?
 
Para tanto, a pesquisadora retorna ao Rio de Janeiro no período entre as décadas de 1930 e 1950, não por acaso: escolhe a então capital de um Brasil que se pretendia moderno e urbano, reinaugurado pela Revolução de 30, em que o mercado de trabalho precisava de mão de obra como nunca antes.  É esta sociedade, que aspira à europeização, recém-saída da escravidão, que elabora a exigência da “boa aparência”.
 
A partir de uma experiência de pesquisa quantitativa sociológica sobre mercado de trabalho, levada a cabo durante o doutoramento no Museu Nacional, da UFRJ, Caetana Damasceno explora um conjunto de entrevistas feitas com trabalhadores e trabalhadoras alocados em  diferentes lugares deste “mercado”, para, em seguida, pesquisar anúncios de emprego em jornais do Rio de Janeiro. A análise detalhada de tais anúncios permitiu à autora detectar o lento deslizamento das categorias de cor, ainda explicitamente usadas nos anos de 1930, para a polissêmica expressão “boa aparência”, empregada nos anos seguintes.
 
Além disso, Damasceno fez uso também das narrativas autobiográficas de duas escritoras negras, ex-empregadas domésticas, Carolina Maria de Jesus e Francisca Souza da Silva, “configurando, no detalhe, como se deslocaram no mundo do trabalho rural para o urbano, por quais espaços sociais transitaram e como o fizeram”.
 
Em “Segredos da boa aparência” a autora aborda de maneira multidisciplinar aspectos diversos da discriminação racial e de gênero no mundo do trabalho. Apropria-se  da Antropologia,  da História e da Literatura e das ferramentas que essas oferecem para a compreensão de questões delicadas e multifacetadas por natureza. Nas palavras do prefaciador Prof. José Sérgio Leite Lopes: “por fornecer o desvendamento do universo sutil dos dramas de mulheres negras, este é um livro  indispensável para a compreensão das relações raciais no Brasil”.
 
Sobre a autora
Caetana Damasceno formou-se em História pela Universidade de São Paulo em 1970. Mestra e Doutora pelo Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social do Museu Nacional pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Coordenou o projeto “Gênero e Raça no Mercado de Trabalho do Rio de Janeiro” do Centro de Estudos Afro-Asiáticos da Universidade Candido Mendes. Durante o ano acadêmico  de 1998-1999, lecionou na Universidade DePaul , em Chicago, como bolsista da Comissão Fulgright. Atualmente é Professora Associada da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro/UFRuralRJ e vice-coordenadora do Programa de Pós-Graduação em História da UFRuralRJ.

 

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