Márcia Evangelista
III ENCONTRO ESTADUAL DAS COMUNIDADES QUILOMBOLAS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
Por Ana Gualberto
Historiadora e Assessora de KOINONIA
O III Encontro Estadual das Comunidades Quilombolas do Estado do Rio de Janeiro aconteceu entre os dias 19 e 21 de maio de 2011, em Armação de Búzios, reunindo aproximadamente 130 pessoas, entre quilombolas, representantes dos governos, sociedade civil organizada e pesquisadores.
O encontro teve uma pauta extensa, pois o II encontro foi realizado em 2009 e a conjuntura envolvendo as comunidades quilombolas torna-se a cada dia mais complexa, necessitando de disseminação de informações e debates para acompanhar este contexto. Destacam-se na pauta a preparação para o encontro nacional quilombola, que ocorrerá em agosto de 2011, no estado do Rio de Janeiro e a nova gestão da Superintendência de Promoção da Igualdade Racial do Rio de Janeiro (SUPPIR-RJ), órgão estadual que tem competência para propor e monitorar ações do governo do estado junto as comunidades quilombolas e as ações da SEPPIR.
Foi apresentada a nova diretoria da Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombos do estado do Rio de Janeiro – ACQUILERJ, eleita em março deste ano, composta por:
– Presidente: Luis Sacopã
– Vice Presidente: Ivone Bernardo
– Primeiro Secretário: Lucilene
– Segundo Secretário: Juanice Ribeiro
– Diretor de Finanças: Adriano de Lima
– Segundo Diretor de Finanças: Josué Ribeiro
– Diretor Cultural: Roberto do Santos
– Diretor para Assuntos Fundiários: Bertolino Lima
Conselho fiscal
Ronaldo dos Santos
Jacqueline Alves
Helder dos Santos
O assunto principal apontado pelas comunidades continua sendo a morosidade no andamento dos processos de regularização territorial. O atraso nas publicações dos RTIDs, a não conclusão dos processos das comunidades quilombolas de Preto Forro, São José da Serra e Santana, o atraso no inicio dos trabalhos nas áreas com os processos já abertos junto ao INCRA e os conflitos locais enfrentados foram debatidos em plenário. A questão territorial continua sendo a base das reivindicações do movimento quilombola. Segundo a SUPPIR, o governador do estado, Sérgio Cabral, se comprometeu a regularizar os territórios quilombolas existentes nas terras pertencentes ao estado do Rio de Janeiro.
A representante da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial – SEPPIR, Ivonete Carvalho, apresentou o Programa Brasil Quilombola no contexto nacional e destacou ações a serem realizadas no estado do Rio de Janeiro a partir deste ano.
Questões como a situação das comunidades com o novo Código Florestal, o processo de discussão sobre a implementação da educação diferenciada nas áreas de Quilombo, a afirmação da identidade cultural, também tiveram espaço nas falas durante o encontro.
Um dos pontos altos do encontro foi o trabalho em grupos, que gerou propostas que serão levadas para o Encontro Nacional de Comunidades Quilombolas.
Propostas para Encontro Nacional de Comunidades Quilombolas
Educação e Cultura Quilombola:
1 – Construção de um currículo diferenciado que contemple atividades culturais, políticas e sociais rompendo a dicotomia clássica da educação tradicional entre a chamada educação formal e informal (extra muros da escola);
2 – Ampliação da rede de educação básica da educação infantil ao ensino médio nos Territórios Quilombolas;
3 – Fortalecimento das articulações entre as ações do MIC e MEC, dentro das comunidades, políticas públicas de educação e cultura numa interlocução permanente;
4 – Transformação do Programa Cultura Viva em política pública;
5 – Registro das ações Griot. Preservação e memória – registro da oralidade e formação de um acervo;
6 – Fortalecimento das ações de formação continuada para os professores que atuam em áreas remanescentes e constituição de uma licenciatura especifica para educadores;
7 – Inclusão destas ações no Brasil Quilombola e que as comunidades tenham como acessá-lo;
8 – Valorização da herança linguística africana na formação da língua brasileira, a exemplo da utilização do Dicionário de Língua Banto no acervo das escolas quilombolas e no PNLD
9 – Inclusão curricular das línguas de matriz africana nas escolas dos Territórios Quilombolas
10 – Afirmação que a cultura quilombola não seja vista como folclore, e sim como história.
Saúde e religião:
1 – Implantação de módulos de saúde em todas as comunidades, com profissionais capacitados em saúde quilombola, mesmo nas que não têm registro;
2 – Garantir reconhecimento das parteiras pelo poder público e que as crianças que nascem nesta situação tenham acesso aos atendimentos públicos;
3 – Garantir a divulgação de informações sobre saúde especifica (a exemplo da anemia falciforme);
4 – Garantir um atendimento mais fácil aos quilombolas; que não sejam centralizados nas capitais;
5 – Garantir e assegurar a participação dos quilombolas em encontros interreligiosos, através dos governos;
6 – Garantir o direito de liberdade religiosa às Religiões de Matriz Africana dentro das comunidades;
7 – Tornar visível as datas comemorativas dos cultos de Matriz Africana
Território:
1 – Realização de mobilização em Brasília em defesa do decreto 4887, atacado pela aADIN, e titulação imediata das áreas quilombolas;
2 – Força tarefa de todos os órgãos envolvidos no processo de titulação para agilizar os processos de regularização (INCRA, Ouvidoria Agrária, SEPPIR, MPF, Defensoria Pública da União, SUPPIR Instancias locais, Policia Federal – em caso de conflitos, ITERJ, SPU, IBAMA, INEA, ICMBIO);
3 – Que o INCRA conclua os processos eminentes de cair este ano (Preto Forro, São José da Serra de 2009 e Santana de 2010);
4 – Fortalecer o INCRA para a execução das políticas de forma que os processos tenham andamento;
5 – Fazer representação junto ao MPF (Ministério Publico Federal), a Corte Interamericana, relatoria pelo direito a moradia da ONU (organização das Nações Unidas), Plataforma Dhesca (Direitos Humanos, Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais), entre outros espaços de incidência publica;
6 – Que as ações decorrentes da Copa de 2014 e Olimpíadas de 2016, não violem os direitos das Comunidades Quilombolas e que ainda contemplem as comunidades com projetos de desenvolvimento local sustentável;
7 – Gravame (demarcação) dos territórios das Comunidades Quilombolas no plano diretor dos respectivos municípios como territórios étnicos.
Trabalho, renda e sustentabilidade
1 – Seminário de capacitação e formação sobre crédito familiar – com o MDA (Ministério de Desenvolvimento Agrário), EMATER (Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural), municípios, Conselhos de Desenvolvimento Rural Sustentável e Cooperativas de Crédito para os Quilombolas;
2 – Formação de técnicos de ATER (Assistência Técnica e Extensão Rural) para atuar junto às comunidades tradicionais;
3 – Capacitação de quilombolas, utilizando as áreas quilombolas no processo de formação, para atuar como técnicos nas comunidades;
4 – Garantir o acesso ao processo de aposentadoria especial para quilombolas junto ao INSS (PEP e Curso Disseminadores da Previdência Social), garantindo a disseminação das informações para as lideranças;
5 – Capacitar técnicos do INSS para atender os quilombolas;
6 – Criar mecanismos para facilitar a emissão de DAPs para os quilombolas;
7 – Garantir que as declarações emitidas pelas associações quilombolas sejam validas como comprovação junto ao INSS e outros órgãos;
8 – Distribuição de cartilhas com informações e leis referentes ao crédito familiar;
9 – Garantir acesso ao PNAE (Programa Nacional de Alimentação Escolar);
10 – Reivindicar junto ao MDA chamadas públicas para assessoria técnicas específica para as Comunidades Quilombolas;
11 – Garantir que as organizações Quilombolas ganhem as chamadas públicas;
12 – Disseminar a Lei de ATER;
13 – Implementação de unidades da FAETEC com ação afirmativa para as Comunidades Quilombolas.
14 – Assessoria Jurídica específica para as Comunidades Quilombolas;
15 – Construção de parcerias para o desenvolvimento sustentável e solidário com universidades, SEPPIR, SUPIR, outros órgãos;
16 – Assegurar o acesso ao PRONAF para as Comunidades Quilombolas;
17 – Criação do PRONAF Quilombola;
18 – Garantir prioridade no uso dos maquinários nas Comunidades Quilombolas e facilitar o escoamento da produção com suporte de transporte;
Como o estado do Rio de Janeiro será o anfitrião do Encontro Nacional, foi discutida a ampliação da participação da delegação carioca, respeitando o número de delegados definido nacionalmente pelo número de comunidades existentes nos estados. Desta forma espera-se que o Rio de Janeiro seja representado por 11 delegados, 23 convidados e a Diretoria da AQUILERJ – composta de 8 pessoas, na condição de convidados-, totalizando até 42 Quilombolas cariocas presentes.
O encontro serviu, além de momento de formação e informação para todos os presentes, de espaço de confraternização e divertimento. Foram realizadas três apresentações culturais que empolgaram os presentes. A comunidade Botafogo, do município de Cabo Frio, trouxe o Grupo Quilombo Unidos em Ação, que apresentou um lindo coral com composições próprias exaltando a identidade Quilombola e a busca por uma sociedade justa e igualitária.